Nesta terça-feira (20/12), durante evento no Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, para apresentar um balanço da atual administração, Eto reconheceu as "tensões" que permearam a relação entre os Poderes de 2019 para cá e disse que a palavra de ordem, agora, é "pacificação".
Os aliados de Zema buscam ampliar as pontes de diálogo com o Legislativo para viabilizar a adesão de Minas ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). O ingresso no pacote de ajuste econômico é visto pela equipe econômica do governador como saída para renegociar a dívida de R$ 147 bilhões do estado junto à União.
Sem consenso na Assembleia, porém, o tema está travado e ainda não foi votado. Neste momento, a entrada na Recuperação Fiscal pode acontecer graças a uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF). Mesmo assim, a ideia do governo é convencer os deputados da necessidade do plano e, assim, garantir a autorização legislativa a operações como a venda da Companhia Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig).
A privatização da empresa, famosa pela exploração de jazidas de nióbio em Araxá, no Triângulo, tende a ser o "carro-chefe" das contrapartidas que Zema pretende apresentar à União como forma de conseguir refinanciar o débito bilionário.
"Nosso primeiro objetivo na Assembleia Legislativa é o de pacificação. Foram anos, notoriamente, de muita tensão, do ponto de vista político, na relação entre governo e Assembleia, muito por conta do aprendizado e do amadurecimento na relação, que é nova para ambos os lados. Agora, precisamos pacificar a relação com a Assembleia", afirmou Igor Eto, no Palácio da Liberdade.
Nos cálculos do governo estadual, sem a Recuperação Fiscal, Minas terá de desembolsar R$ 12 bilhões em 2023 por causa da dívida junto à União. Com o acordo, o gasto seria de R$ 4 bilhões. O estado tem até junho para definir os termos do refinanciamento.
A última liminar do STF permitindo a adesão ao plano fiscal à revelia do pensamento dos deputados estaduais foi dada na quarta-feira (14), pelo ministro Kassio Nunes Marques. Na sexta-feira (16), Zema expediu decreto autorizando a Secretaria de Estado de Fazenda a negociar, com o Tesouro Nacional, as bases do novo contrato de parcelamento.
Para o titular da Fazenda, Gustavo Barbosa, mesmo com o aval da Suprema Corte, a autorização legislativa traria segurança à Recuperação Fiscal. "É uma liminar. O estado continua necessitando aprovar as leis enviadas à Assembleia", explicou.
Na medida cautelar concedida ao governo mineiro, Nunes Marques falou em "inércia reiterada e persistente" da Assembleia por não colocar o assunto em votação. Em junho, quando assinou outra liminar, que autorizava o Palácio Tiradentes a seguir com os trâmites pela Recuperação Fiscal, o magistrado chegou a acusar o Legislativo mineiro de cometer "omissão".
Segundo Igor Eto, mesmo que o STF não houvesse recomendado a participação da Assembleia no processo, o desejo do governo é escutar os deputados. "É algo que vai influenciar a vida de todos nós nos próximos anos. Portanto, é mais do que legítimo e fundamental que os deputados estaduais tenham a oportunidade de discutir, à exaustão, todo o projeto de adesão ao Regime de Recuperação Fiscal".
Bases da venda da Codemig são debatidas
Segundo Gustavo Barbosa, os contornos da possível venda da Codemig ainda não estão fechados. O governo debate, por exemplo, o tamanho da fatia da empresa a ser colocada no mercado. Tudo, porém, depende de a União aceitar a entrada de Minas no plano de Recuperação Fiscal."É um ativo bastante relevante do estado, (que vale) algumas dezenas de bilhões de reais. (A venda) vai possibilitar uma redução do estoque de dívida do estado com a União - hoje, o valor que temos a pagar de dívida é muito alto - e (ajudar a quitar) os restos a pagar. O estado tem muitos restos a pagar, e isso é exigência de sustentabilidade do Regime de Recuperação Fiscal", explicou o secretário de Fazenda, ao justificar a inclusão da Codemig no projeto.
Além da desestatização da empresa, o Palácio Tiradentes trabalha para emplacar a Recuperação Fiscal sob outras bases, como a melhora da arrecadação estadual sem que haja aumento de impostos. O pacote, por si só, tem contrapartidas como o impedimento da realização de concursos públicos sem que haja vacância de cargos e a vedação à criação de novas despesas obrigatórias que precisem ser executadas por pelo menos dois anos.
No governo, a crença é de que mesmo a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não vai frear os planos de concretizar a adesão de Minas ao modelo de ajuste fiscal. Apesar das diferenças ideológicas, a avaliação é que o regime é uma política já instituída pela Secretaria do Tesouro.
"O estado depende disso para se viabilizar", ressaltou Zema, ao defender a renegociação do passivo.
Oposição vê 'relação de confronto' com Assembleia
Em que pese o discurso de "pacificação" adotado pelos aliados de Zema, a oposição ao governador na Assembleia tem visão diferente sobre a relação entre os poderes. Ontem, durante a cerimônia de diplomação dos eleitos em Minas Gerais, a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT) acusou o Executivo de construir uma "relação de confronto" com a Assembleia.Crítica da judicialização da Recuperação Fiscal, Beatriz defende que Zema espere a assunção de Lula ao cargo de presidente para o início de negociações sobre os problemas fiscais de Minas. Há, entre deputados e sindicatos, temores por prejuízos ao funcionalismo e aos serviços públicos.
"Precisamos trilhar um caminho de recuperação e desenvolvimento no estado que não passe pela população pagar a conta, porque Regime de Recuperação Fiscal é a população pagando a conta", protestou.
A deputada chegou a apresentar, à Assembleia, um Projeto de Resolução para anular os efeitos do decreto de Zema autorizando a adesão à Recuperação Fiscal. Acontece que a pauta de votações da Casa está travada, justamente pelo RRF. Isso porque a autorização ao refinanciamento tramita em regime de urgência e impede a análise de qualquer outra proposta em plenário. Sem consenso em torno do assunto, todas as outras análises desejadas pelos deputados ficam em suspenso.
Nos bastidores, há tentativas de negociação para retirar o regime de urgência e, assim, permitir que os parlamentares votem projetos ainda nesta legislatura. Neste momento, a obstrução provocada pela Recuperação Fiscal impede o aval, inclusive, ao texto-base do Orçamento do estado para 2023. As conversas podem prosseguir até o fim de dezembro.