Jornal Estado de Minas

ENTREVISTA

Pedro Aihara: 'Política não tem espaço vazio'

O tenente do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG) Pedro Aihara (Patriota) entrou para a reserva da corporação na segunda-feira passada, quando foi diplomado deputado federal pelo Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG). Conforme o artigo 14 da Constituição Federal de 1988, um militar é elegível com algumas condições. “Se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade; II - se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade”, prevê o documento. Ex-porta voz da instituição, Aihara dedicou mais de uma década ao ofício e decidiu concorrer em uma eleição pela primeira vez neste ano, depois de ouvir conselhos e pedidos de muitas pessoas que queriam ver um rosto novo na política brasileira.





 

O novo representante de Minas Gerais na Câmara dos Deputados, ao lado de 52 colegas, ganhou popularidade durante a tragédia de Brumadinho e se tornou um dos rostos mais visíveis durante os trabalhos de buscas por vítimas do rompimento da barragem da Vale, que deixou 272 mortos. Nas urnas, Aihara foi o 29º mais votado do estado ao ser escolhido por 89.404 cidadãos. Além dele, que é o único novato eleito pelo Patriota, outros dois correligionários também ocuparão cadeiras no próximo mandato: Fred Costa, que recebeu 158.453 votos, e Dr. Frederico, que foi escolhido por 84.771 pessoas.
 
“Política não tem espaço vazio, se a gente não ocupar alguém vai. Então, pensando sobre isso e refletindo sobre a ocupação deste espaço de forma mais legítima que eu lancei essa candidatura”, declarou o deputado federal eleito no podcast EM Entrevista, gravado dia 16. Confira a entrevista abaixo.

Quais os motivos que levaram o senhor a entrar para a política? 
Acho que uma indignação genuína. Em mais de 10 anos de atuação no Corpo de Bombeiros e em mais de 14 anos de serviço público, eu sempre tive a oportunidade de ver muito de perto o que a falta de uma política pública bem implementada acaba fazendo na vida das pessoas. Atendendo essas tragédias das barragens, das chuvas, das mortes nas estradas e tantas outras questões. Aquilo ali começou a gerar um sentimento de indignação e sempre que eu pensava em política pensava que este não era um ambiente para me misturar porque infelizmente tem muita gente com objetivos escusos. Só que as pessoas começaram a fazer uma provocação muito autêntica: “Pedro, se não for você que vai ajudar a gente nesse processo, que vai ser a nossa voz lá, quem que vai ser?”. E política não tem espaço vazio, se a gente não ocupar alguém vai. Então, pensando sobre isso e refletindo sobre a ocupação deste espaço de forma mais legítima que eu lancei essa candidatura. 




 
 
Como está sendo a preparação para ocupar uma das cadeiras da Câmara dos Deputados?
A preparação está sendo bem intensa porque uma das bandeiras da minha campanha e que, felizmente, estou conseguindo cumprir é de propor uma representatividade mais técnica. O que a gente vê no Congresso hoje é que tem muito “achismo”, muito mito, mas é muito raro uma política baseada em dados, evidências, com embasamento técnico, acadêmico, científico, ouvindo a população também. Então estou investindo bastante na minha formação técnica e eu já venho de uma área que tem uma interface muito grande com a área pública. Me formei em direito, fiz mestrado, me especializei em gestão pública e ao longo da campanha fiz um curso de formação específico na parte de políticas públicas. E faço o mesmo com a formação do meu gabinete. Como a minha eleição não teve apoios políticos, eu cheguei sem dever favor ou cargo para ninguém. Então meu gabinete não tem afilhado, sobrinho ou indicação. São todas pessoas que estão sendo selecionadas com base nos currículos, na sua experiência e em toda expertise que eles podem contribuir.

O senhor não se manifestou sobre a disputa entre Lula e Bolsonaro. Qual será a sua postura com relação ao novo governo?
Não tenho político de estimação. Acho que nós estamos lá enquanto congressista para a gente poder discutir e votar naquilo que for melhor para a população dentro do interesse das pessoas e não por interesse puramente ideológico. Sobre o novo governo, depende da proposta. Eu tenho bandeiras muito claramente definidas, com relação à questão da educação, do meio ambiente, do serviço público, dos militares. Estando o governo alinhado com estas pautas, eu vou votar favoravelmente. Estando o governo não alinhado, eu vou votar de forma contrária. Sobretudo nesse momento, em que tudo está polarizado, um diálogo ético vai ser muito necessário. 
 
 

Como o senhor vê o setor de mineração no estado e também o tombamento da Serra do Curral?
O tombamento é necessário. Estamos falando de um patrimônio do estado, do nosso sentimento de pertencimento, da nossa identidade enquanto mineiro. Sobre a mineração como um todo, eu acho que a gente precisa revisar algumas questões sobre o licenciamento ambiental, minerário, o modelo que hoje está vigente não é, definitivamente, o melhor modelo em relação a questões como governança e compliance. Acho que o projeto pode, e deve ser, mais transparente para que a população como um todo consiga ser representada de uma forma mais incisiva. E principalmente a responsabilização penal das empresas. Quando a gente fala da tragédia de Brumadinho, que vai completar quatro anos agora, a gente fala de um processo que ainda está engatinhando e é um absurdo que nós tenhamos uma tragédia, um crime, um desastre do qual morreram 272 pessoas e até hoje a gente não tenha ninguém preso, ninguém responsabilizado. 





As pautas sociais costumam ser uma das prioridades do presidente eleito. Como o senhor vê esta questão como um todo e também os programas de transferência de renda?
Os programas assistenciais no Brasil são necessários. A gente tem uma desigualdade tremenda e por mais que às vezes a gente esteja dentro de determinadas bolhas que podem parecer que isso não é tão necessário a gente fala de um país que boa parte da sua população ainda enfrenta a fome. Isso é inaceitável. O grande problema das políticas assistenciais no Brasil não está relacionado à existência delas, mas sim à focalização destas políticas públicas. A gente perde muito dinheiro porque tem muita gente que não precisava ou não deveria estar recebendo e que recebem. Todos os estudos de análise apontam este como o problema mais grave. Precisamos identificar onde este recurso é necessário e aplicar lá. Sobre a PEC, ninguém está sendo contra, nem oposição, nem situação. A grande questão é o tamanho do rombo sem esta focalização. 
 

 
Como melhorar a educação no estado e no país?
A gente precisa identificar alguns problemas que não estão sendo discutidos hoje com a importância que eles merecem. A gente vive no Brasil uma outra pandemia, que não é a pandemia de COVID, mas sim da evasão escolar. A gente tem uma quantidade absurda de jovens fora das escolas. Já tínhamos isso antes, mas essa taxa aumentou com a pandemia e esse não é um problema que é só da educação porque quando a gente tem a saída destes jovens do sistema escolar a gente tem um problema atual e, principalmente, daqui alguns anos de ausência de mão de obra qualificada, problemas relacionadas ao subemprego. Então, se a gente não conseguir fazer programas estruturantes para trazer de novo essas crianças e adolescentes para dentro da escola, a gente vai viver problemas ainda maiores. Esta é a primeira questão, mas dentro disso, também precisamos reter o jovem na escola porque o jovem que está se formando hoje no ensino médio muitas vezes ele não consegue se manter ou completar o ciclo básico porque já quer trabalhar. Nós precisamos oferecer programas que podem ajudar, oferecendo oportunidades profissionalizantes e incentivos financeiros. Também não podemos esquecer dos profissionais, que historicamente são muito desvalorizados em termos de salários e incentivos. 

No setor da saúde temos projetos importantes como o pós-pandemia, piso nacional da enfermagem e hospitais inacabados. Como o senhor vê essas pautas?
O piso nacional da enfermagem eu sempre fui e continuarei sendo a favor porque quando falamos de um profissional enfermeiro a gente sabe que é profundamente desvalorizado, mesmo sendo os tocam realmente as unidades de saúde e hospitais, junto com outros profissionais, mas, sobretudo, são eles estão ali fazendo uma série de atividades. O piso que está sendo proposto é absolutamente razoável, pois estamos falando de um mínimo para um profissional que tem esse nível de formação e de atividade. Também existe um desequilíbrio salarial na comparação com os médicos, que passa por uma discussão desde o ingresso na faculdade, e isso também precisa ser discutido. Sobre o modelo de saúde, acho que a gestão do governador Romeu Zema (Novo) tem feito um bom trabalho até o momento, no sentido de retomar obras que estão paradas e de operacionalizar o gasto público de uma forma mais inteligente, atendendo mais a interesses da população do que interesses políticos. Ele pegou, por exemplo, aviões que eram para transporte de autoridades e reverteu para o nosso sistema de apoio a resgates. Então, o que nós precisamos é profissionalizar cada vez mais esta gestão da saúde.