(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas PODCAST

Ana Pimentel: 'Precisamos tornar o SUS uma política do século 21'

Deputada federal eleita pelo PT, a médica sanitarista e professora defende a modernização da saúde pública e investimentos em ciência e pesquisa


28/12/2022 04:00 - atualizado 27/12/2022 23:12


Ex-secretária de Saúde da Prefeitura de Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, a médica sanitarista Ana Pimentel (PT) resolveu se candidatar a um cargo eletivo pela primeira vez neste ano. Escolhida por mais de 72 mil cidadãos para ocupar uma das 53 cadeiras do estado na Câmara dos Deputados, ela diz que vai levar na bagagem duas bandeiras prioritárias: a defesa do Sistema Único de Saúde (SUS) e a luta pela valorização da educação pública, em especial no ensino superior.

“Precisamos tornar o SUS uma política do século 21, conectada, que seja ainda mais transversalizada”, disse durante participação no podcast EM Entrevista, gravado em 16 de dezembro.

Na conversa, a petista advogou sobre a necessidade de conectar os programas de saúde às ações de outras áreas do campo social. “O Estado brasileiro divide a gestão pública em eixos: saúde, educação, assistência, esporte, agricultura, mas as políticas públicas devem ser pensadas dentro da trajetória de vida das pessoas. Nossas vidas não se fragmentam.”

Ao passo em que defende aumentar o investimento público na atenção primária em saúde, Ana Pimentel mostra simpatia à construção de parques tecnológicos no país para evitar a “fuga de cérebros”. “Há a necessidade de termos uma política de desenvolvimento estratégico, atraindo empresas para fixar os pesquisadores que formamos”, explicou.
foto da médica Ana Pimentel em sacada de prédio em belo horizonte com prédios ao fundo
Deputada federal eleita, Ana Pimentel é médica e professora universitária (foto: Redes Sociais/Reprodução)

O ex-ministro Arthur Chioro, do grupo de trabalho de Saúde da transição, afirmou recentemente que o “SUS precisa ser reconstruído”. A senhora concorda?
Concordo. A história do SUS é recente, vem do fim da década de 1980. Passamos, primeiro, por um momento de formalização, institucionalização e adensamento das políticas e dos serviços de saúde dentro do sistema. Esse processo aconteceu desde 2016; de lá pra cá, passamos por um processo de desinstitucionalização do SUS.

Ao longo dos últimos anos, o corte orçamentário no SUS foi decisivo nesse processo de desinstitucionalização. E há outra dimensão (da desinstitucionalização): o desenho das políticas. Isso aconteceu de maneira acentuada nos últimos anos e, durante a pandemia, tem um contorno ainda mais acentuado.

"Precisamos tornar o SUS uma política do século 21, conectada, que seja ainda mais transversalizada"


O que aconteceu no SUS nos últimos anos, de fato, nos coloca a tarefa de um processo de reinstitucionalização. Parte muito significativa disso aconteceu em função dos retrocessos, principalmente, do governo Bolsonaro, e encontrou outras questões conjunturais e sociais, que já eram desafios anteriores do SUS. Temos, hoje, uma sociedade muito mais conectada; a dimensão tecnológica era muito incipiente no SUS.

Precisamos tornar o SUS uma política do século 21, conectada, que seja ainda mais transversalizada. O SUS precisa ter a dimensão da vida. O Estado brasileiro divide a gestão pública em eixos: saúde, educação, assistência, esporte, agricultura, mas as políticas públicas devem ser pensadas dentro da trajetória de vida das pessoas. Nossas vidas não se fragmentam.

O que a senhora propõe, então, é fortalecer o diálogo entre as políticas de saúde e as outras áreas sociais, como a educação?
Exatamente. Temos de pensar políticas de saúde que contemplem a vida cotidiana das pessoas. Quando passamos a observar as políticas de saúde, educação e assistência dessa maneira, entendemos a necessidade de uma reformulação do Estado brasileiro, da forma como pensamos e organizamos as políticas. Isso é muito decisivo, pois precisamos transversalizar cada vez mais (as políticas públicas).

"O acesso aos métodos contraceptivos é fundamental na trajetória de saúde da mulher"


Temos de pensar a sustentabilidade e o meio ambiente conectados às nossas políticas públicas sociais. Falo, predominantemente, de saúde, assistência social e educação. Durante a COP 27, OMS e ONU apresentaram que, se não houver mudança nas condições de exploração da terra e do meio ambiente, a cada ano teremos mais 250 mil mortes. E mortes por doenças que já não acompanhávamos em grande parte do mundo, como diarreia e cólera.

Precisamos dar centralidade à defesa do meio ambiente. Se não nos pautarmos por outra dinâmica de relação com o meio ambiente, o processo de adoecimento e morte vai se acelerar ainda mais. Isso onera o SUS e acarreta uma sobrecarga que não vamos conseguir absorver.

A senhora já pensa na primeira proposta voltada à saúde pública que vai apresentar como integrante do Congresso?
O que quero, primeiro, é debater o modelo de atenção primária à saúde, a porta de entrada ao SUS. Estou falando dos postos de saúde, onde as pessoas acessam primeiro o sistema. Eles são fundamentais, pois articulam as políticas de prevenção às políticas de diagnóstico e tratamento.

O posto de saúde é importante para orientar sobre cuidado de vida, alimentação e necessidade de atividades físicas, mas também porque articula com outros dispositivos de assistência, como os Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e as escolas. (A atenção primária) é importante também para diagnóstico e tratamento, o mais precoce possível, das doenças crônicas e dos adoecimentos agudos.

O que a senhora propõe, então, é aumentar o investimento em atenção primária?
A primeira coisa que precisa ser revista é o modelo de financiamento. O governo Bolsonaro criou o Previne Brasil, que mudou o financiamento e retirou parte significativa do orçamento da atenção primária. A proposta é revogar o Previne Brasil. Vou me envolver nisso como parlamentar, pautando o debate junto ao governo.

"É muito factível potencializar regiões que já tenham universidades e instituições científicas, atraindo empresas"


Ao mesmo tempo, (é importante) mudar a Política Nacional de Atenção Básica, que, hoje, retira a obrigatoriedade dos agentes comunitários de saúde e desarticulou os Núcleos Ampliados de Saúde da Família (Nasfs). São as minhas duas primeiras tarefas. Vou fazer isso articulando com outros deputados que pensam da mesma maneira.

Que política pública de saúde aplicada pela senhora em Juiz de Fora pode ser adaptada à realidade nacional e apresentada como proposta parlamentar?
A política mais importante para mim era a universalização do acesso ao dispositivo intrauterino (DIU). O acesso aos métodos contraceptivos é fundamental na trajetória de saúde da mulher. A qualquer momento, a mulher pode retirar o DIU se quiser engravidar. É uma política estratégica, que garante um direito reprodutivo e sexual básico às mulheres.

É um debate que quero fazer nacionalmente. Hoje, as mulheres que querem acessar métodos contraceptivos conseguem, de maneira geral, a pílula e o método injetável. São adequados e com indicação, mas considero fundamental garantir à mulher escolher o método que considera mais adequado.

A senhora participou do grupo de trabalho que tratou da educação durante a transição. Que contribuições levou ao comitê?
Minha maior contribuição foi no eixo da educação superior. Sou professora universitária, fiz mestrado e doutorado e sou orientadora de pós-graduação. Há a necessidade de articular as políticas de ciência e tecnologia ao ensino superior – e é decisivo, para a saúde pública, um projeto de desenvolvimento econômico sustentado em ciência e tecnologia. Um dos aprendizados da pandemia foi a dependência tecnológica que tivemos, inclusive de insumos primários, como máscaras. Isso mostrou a necessidade de nosso desenvolvimento científico e tecnológico, gerando emprego e renda.

O país forma muito bem pesquisadores, cientistas e professores. Somos excelência nesse aspecto. Conseguimos fazer pesquisas e formar cientistas, mas não fixá-los no Brasil. É a fuga de cérebros. Há a necessidade de termos uma política de desenvolvimento estratégico, atraindo empresas para fixar os pesquisadores que formamos. A carreira dos cientistas e dos professores de educação superior é tão inflexível que só conseguimos progredir assumindo algum cargo de gestão. Precisamos dinamizar a carreira dos pesquisadores e dos professores.

De onde tirar recursos para, por exemplo, fomentar um programa de atração de empresas?
Vários países sustentaram o processo de retomada de desenvolvimento através do complexo médico-industrial. É articulação política e debate de impostos. Lula disse querer fazer um novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para atrair grandes obras em saúde e educação.

Temos de fazer parques tecnológicos. É investimento do Estado, mas de retorno significativo para o próprio Estado, com políticas públicas, e com emprego e renda à população. É muito factível potencializar regiões que já tenham universidades e instituições científicas, atraindo empresas a esses locais.

O PT mineiro teve bom desempenho nas disputas pela Assembleia Legislativa e pela Câmara dos Deputados, mas desde 2014, com Fernando Pimentel, a esquerda não consegue vencer disputas para cargos majoritários no estado. O que o campo precisa fazer para voltar ao governo de Minas?
O povo de Minas tem relação histórica com o PT. Acompanhamos um crescimento das bancadas. Para deputado federal, tivemos três deputados de novas gerações eleitos, sendo duas mulheres (Dandara e a própria Ana) e um jovem (Miguel Ângelo).

A bancada na Assembleia também cresceu e tem uma composição de mulheres, e mulheres negras, muito significativa, acenando o tipo de futuro que podemos construir. O PT tem grandes quadros à disposição. No próximo período, temos condições de apresentá-los para dialogar.

O PT tem duas mulheres comandando cidades grandes de Minas: Margarida Salomão, em Juiz de Fora, e Marília Campos, em Contagem. Nunca tivemos uma governadora. A senhora vislumbra a chance de uma delas encabeçar eventual chapa em 2026?
As duas representam o perfil que temos como necessidade para o próximo período, de fortalecer nossa intervenção partidária. São mulheres que têm feito gestões que apresentam políticas muito interessantes e inovadoras. Margarida Salomão fez uma composição paritária do secretariado: metade mulheres; metade homens. (Margarida) incorporou pessoas negras no primeiro escalão pela primeira vez na história da cidade.

Isso possibilita o debate de representatividade, que é importante. E, ao mesmo tempo, ao colocar mulheres, negros e pessoas LGBTQIA+, mudamos o conteúdo da política, pois incluímos temas que fazem parte da trajetória dessas pessoas. Para nós, mulheres, a sustentabilidade e o cuidado da vida são muito importantes. Então, as políticas de saúde, educação e assistência ganham centralidade em nossos governos.

O conteúdo que elas apresentam é o que vai possibilitar, à gente, estratégias de futuro. Quem será (o candidato) é um cenário em aberto. Há figuras políticas interessantíssimas, como Reginaldo Lopes, Rogério Correia, Padre João e Beatriz Cerqueira, uma grande referência. Temos nomes muito interessantes para o futuro e, ao mesmo tempo, conteúdos de políticas do Executivo que podem ser colocadas para o futuro de Minas.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)