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Estado de Minas FURO NO ORÇAMENTO

Cidades mineiras se armam contra prejuízo de R$ 375 mi em 2023; entenda

Mudança nas regras dos repasses do Fundo de Participação dos Municípios afeta 85 prefeituras do estado; gestores vão ao TCU e à Justiça Federal para contestar


05/01/2023 18:22 - atualizado 05/01/2023 19:01

Marcos Vinícius Bizarro, presidente da Associação Mineira de Municípios
Presidente da AMM, Marcos Vinícius Bizarro (foto) defende ida de cidades ao TCU e à Justiça Federal contra diminuição de fatias do FPM (foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press - 2/6/22)
Oitenta e cinco cidades mineiras podem amargar, juntas, rombo de R$ 375 milhões na arrecadação prevista para este ano. Na última semana de 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) diminuiu o tamanho das quotas entregues a essas prefeituras por meio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O mecanismo é utilizado pela União para repassar, às localidades, as fatias que lhes cabem da arrecadação de tributos federais, como o Imposto de Renda.

Os cortes fazem com que prefeitos receiem prejuízos em investimentos destinados a áreas como saúde e educação. Para tentar barrar os prejuízos, os Executivos municipais mineiros afetados pelos novos índices começaram a preparar, nesta terça-feira (5/1), uma série de contestações ao TCU. Paralelamente, ações na Justiça Federal também serão utilizadas na busca pela reversão do cenário. Os movimentos têm o aval da Associação Mineira de Municípios (AMM).

As quotas do FPM são norteadas pelos chamados coeficientes municipais. Em todo o Brasil, segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), cerca de 700 cidades vão ter os índices diminuídos e, por consequência, sofrerão cortes nos repasses. Para justificar a redução das cifras, o TCU se ampara na prévia do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados preliminares apontam diminuição da população das cidades - o que, para o TCE, justifica os cortes. Prefeitos mineiros ouvidos pelo Estado de Minas, porém, negam que o número de habitantes de suas cidades tenha caído.

Segundo a determinação do TCU, o coeficiente de Ubá, na Zona da Mata, vai cair 0,4 ponto. A retração significa perda de R$ 8,6 milhões do bolo orçamentário do Fundo dos Municípios. A prefeitura costuma utilizar o repasse federal para assegurar o dispositivo contido na Constituição Federal que obriga os municípios a utilizarem 25% de suas receitas na educação e outros 15% em projetos de saúde.

Se a Procuradoria-Geral da cidade não obtiver êxito na reclamação junto à corte de Contas, a saída para garantir as verbas para saúde e educação será utilizar recursos de tributos municipais, como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). O prefeito Edson Teixeira Filho (União Brasil), porém, diz que o orçamento local é apertado. Portanto, se fontes como o IPTU tiverem de ser realocadas, haverá uma espécie de efeito-cascata.

"Logicamente, não vamos deixar a educação e a saúde (desamparadas). Com isso, temos de diminuir (recursos) em investimentos, (como) calçamento e manutenção. Infelizmente, isso pode acontecer", explica, ao EM.

A estimativa feita em 2021 pelo IBGE para nortear o FPM do ano passado atribuía 117,9 mil habitantes a Ubá. A prévia do Censo, porém, calcula a presença de 98,7 mil habitantes na cidade. "É lógico que isso (a diminuição populacional) não aconteceu. Quem conhece a cidade, como eu conheço muito bem, sabe que não é assim", protesta o prefeito.

Confeccionado pela AMM, o modelo de representação a ser enviado pelas cidades mineiras ao TCU se ampara em uma lei sancionada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O texto vigora há quatro anos e diz que, enquanto um novo censo demográfico não estiver pronto, os coeficientes do FPM devem ser os mesmos utilizados para basear os repasses feitos em 2018. A legislação não consta no parecer da Corte de Contas.

Na visão de Marcos Vinícius Bizarro, presidente da AMM e prefeito de Coronel Fabriciano, no Vale do Aço, os dados que têm sido coletados pelos recenseadores do IBGE só podem valer a partir da versão de 2024 do FPM.

"Um censo baseado em resultados parciais de contagem populacional é inadmissível", protesta. "Para questionarmos o Censo, é preciso ser concluído o trabalho. Já a contestação ao TCU pode impedir perdas no FPM, uma vez que foi o Tribunal que vetou a lei que garantiria o repasse sem impactos", emenda.

Serviço hospitalar ameaçado em Manhuaçu

Em Manhuaçu, outra cidade da Zona da Mata mineira, a mudança nos termos do Fundo de Participação dos Municípios representa perda de R$ 4,3 milhões já neste ano. A prefeita Maria Imaculada Dutra Dornelas (sem partido) demonstra preocupação com a situação e diz que a diminuição dos valores afeta toda a programação orçamentária do poder Executivo local.

Entre os temores de Imaculada, está a possibilidade de precisar rever investimentos em saúde. "Hoje, ajudo o Hospital César Leite, com R$ 600 mil ao mês, para manter a urgência e a emergência. Não teria esse recurso para dar. Já causaria um impacto muito grande nos serviços do hospital".

Filantrópica, a casa de saúde é um dos principais espaços de acolhimento à população manhuaçuense. A estimativa de 2021 mostrou que, na cidade, viviam cerca de 92 mil pessoas. Agora, os responsáveis pelas preliminares do Censo falam em 88,7 mil. A fim de ajustar os cálculos a respeito da população, a prefeitura colocou equipes de saúde, acostumadas a visitar as casas dos moradores, à disposição do IBGE. A ideia, assim, é apressar a contagem e evitar distorções nos números finais.

"Estamos atrás do IBGE, dando o maior apoio a eles, para a gente encontrar essas pessoas. É uma diferença de 3 mil habitantes (entre 2021 e 2022). É muita coisa; (são) 966 moradias", pontua. A prefeita de Manhuaçu diz que a máquina pública se programava, ainda, para quitar direitos adquiridos de servidores. Agora, por causa do impasse em torno do FPM, adotou compasso de espera.

O ensino público também pode ser afetado "Temos um planejamento para a educação em 2023. Teremos de mudá-lo todo", receia.

Prefeitos mantêm esperança

Apesar dos lamentos, políticos mineiros creem que a ida ao TCU e as ações judiciais podem evitar os prejuízos. A ideia é que as prefeituras procurem a Justiça Federal a partir da próxima semana. Segundo a Confederação Nacional de Municípios, apenas a Bahia, com 99 cidades, tem mais municípios afetados pela mudança do FPM do que Minas Gerais. Até 25 de dezembro, 83,9% da população brasileira havia sido recenseada.

Para Paulo Ziulkoski, presidente da CNM, o índice não é suficiente para justificar as alterações no coeficiente. "Um dos motivos para a demanda municipalista é a discrepância que pode ocorrer, neste momento, ao alterar o coeficiente com base em estimativas de um Censo parcial, uma vez que a coleta não é proporcional em todo território nacional, sendo mais avançada em algumas localidades do que em outras".

Em meio às dúvidas causadas pelo parecer, prefeitos creem que o TCU e a Justiça podem rever a situação. Para Imaculada, de Manhuaçu, a lei expedida em 2019 é, justamente, a saída mais plausível. "Acho que o TCU vai levar (a contestação) em consideração. Vários municípios já entraram e ganharam", esperança.

"O município não pode ficar prejudicado. Não podemos ficar inertes, esperando que as coisas aconteçam. Temos de tomar as providências em nome da nossa população", alerta Edson Teixeira Filho, de Ubá.

O que diz o Tribunal de Contas?

Procurado pela reportagem, o Tribunal de Contas da União afirmou se amparar em nota técnica emitida pela Secretaria de Macroavaliação Governamental da entidade. "Segundo recomendação técnica do IBGE, os dados de população obtidos pelo Censo constituem a melhor informação sobre a população de estados e municípios do país para o ano de 2022, por apresentarem um grau de acuidade maior do que aquela que poderia ser obtida por meio de estimativas", lê-se em trecho do documento.

O TCU prometeu avaliar as contestações que as prefeituras pretendem enviar. "Esses questionamentos serão analisados somente em relação ao cálculo e não às estatísticas utilizadas, que são da competência do IBGE e, por definição legal, o TCU não possui qualquer ingerência", pontuou a assessoria de imprensa da corte.


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