O Itamaraty anunciou nesta quinta-feira (5) que o Brasil retornará ao Pacto Global de Migrações da ONU, um acordo não vinculante estabelecido no final de 2018 mas abandonado pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ainda nos dias iniciais da gestão.
A medida, uma das primeiras anunciadas pelo ministério agora sob a chefia de Mauro Vieira, era demandada por especialistas em migração e pela comissão sobre migrantes e refugiados do Congresso.
Ainda que os países-membros do pacto não sejam obrigados a cumprir suas recomendações, o espaço promove debates sobre a melhoria de políticas migratórias. Ao debandar, o Brasil deixou de participar oficialmente de discussões sobre boas práticas para a área.
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À época, a saída do Brasil foi interpretada como mais uma demonstração de alinhamento da chancelaria brasileira, então comandada por Ernesto Araújo, com o governo de Donald Trump, nos EUA --o republicano, um defensor de discursos e políticas antimigração, não apoiou o pacto.
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Um ano e meio depois, já com Joe Biden na Casa Branca, e com o Itamaraty chefiado por Carlos França, chanceler de perfil menos estridente, o Brasil assinou, ao lado dos EUA e de outras 18 nações, a declaração de Los Angeles, fruto da Cúpula das Américas.
Visto com ceticismo e também não vinculante, o texto promete um trabalho conjunto para facilitar a migração segura e ordenada, bem como a promoção dos direitos humanos de migrantes e refugiados.
Ao lado do combate à crise climática, o tema é um dos principais a ser usados pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para retomar o protagonismo brasileiro na arena internacional quando o assunto são os direitos humanos, diz Carolina Claro, professora de direito internacional, migração e refúgio da Universidade de Brasília (UnB).
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Ela explica que, com a volta ao pacto, a diplomacia brasileira terá maior entrada para acordos de assentamento de refugiados com outros países, além de maior cooperação para a área de refúgio, cuja dimensão cresceu no Brasil ao longo da última década, em especial devido ao ingresso massivo de cidadãos do Haiti e da Venezuela.
"É importante, porém, que o Brasil aproveite esse momento de retomada da projeção internacional e promova, de uma vez por todas, uma política de Estado sobre migração e refúgio", ressalta. "O que temos até aqui são políticas de governo."
Com o anúncio do Itamaraty, acrescenta, o Brasil ainda se mostra disposto a uma maior cooperação com a OIM (Organização Internacional para Migrações), braço da ONU para o assunto. A organização parabenizou o governo pela decisão.
Em nota, disse que o retorno do Brasil ao compromisso global "representa um passo importante na continuidade de uma política acolhedora que beneficia 1,6 milhão de migrantes que escolheram o país para viver". O texto ainda cumprimenta o governo Lula, "escolhido em eleições participativas e pacíficas."
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Descrita por especialistas em refúgio como uma das áreas de direitos humanos "menos chamuscadas" durante o governo Bolsonaro, o setor de migração e refúgio foi marcado, em especial, pela continuidade da Operação Acolhida, voltada para migrantes venezuelanos.
O governo Lula herda, além do desafio de manter e melhorar a operação, uma extensa fila de pedidos de refúgio ainda sem análise e cobranças da sociedade civil para maior atenção e políticas específicas para migrantes que vêm de nações da África, como Angola e Nigéria, além de maior acolhimento a refugiados do Afeganistão e da Ucrânia.