Antes mesmo de ser formalizado no cargo, o escolhido por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para atuar como interventor na segurança do DF, Ricardo Cappelli, queria um encerramento rápido do acampamento, com uso da força.
Número 2 do Ministério da Justiça, Capelli determinou ainda na noite de domingo (8) o envio do batalhão de choque da Polícia Militar do DF e militares do Corpo de Bombeiros para entrar no Setor Militar Urbano. O objetivo era desmobilizar o acampamento e prender os cerca de 2 mil apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que estavam no local.
Os policiais, no entanto, tiveram o acesso barrado por soldados do Exército, que fizeram um cordão de isolamento. Três blindados Guarani —o principal tanque fabricado em território brasileiro— foram deslocados para a entrada do setor militar, numa demonstração de força cujo objetivo era dissuadir a PM.
Com o impasse, o interventor Ricardo Cappelli se reuniu com autoridades do Comando Militar do Planalto por volta de 20h30 de domingo, na Catedral Rainha da Paz —que fica a poucos metros do local.
Os militares, porém, afirmaram que qualquer ação no acampamento teria de ser coordenada e com aval da Força, já que se trata de uma área do Exército. Uma ação durante a madrugada e sem planejamento prévio —defenderam os militares— poderia causar mortes e ser malsucedida.
A reunião durou cerca de uma hora e meia. Houve um entendimento de que a operação para o desmonte do acampamento poderia ser realizada ainda na manhã do dia seguinte, segunda-feira (9).
Após a primeira reunião, integrantes do governo Lula se encontraram com generais no Setor Militar Urbano para discutir a situação.
Participaram os ministros José Múcio Monteiro (Defesa), Rui Costa (Casa Civil) e Flávio Dino (Justiça), além do comandante do Exército, general Júlio César de Arruda, e o comandante Militar do Planalto, general Gustavo Dutra.
No encontro, Dino e Rui Costa chegaram a defender uma ação mais incisiva ainda durante a madrugada. Afinado ao interventor Cappelli, o ministro da Justiça tem posição diferente da de Múcio e, desde antes da posse, diz que uma retirada à força dos bolsonaristas era uma opção se os golpistas não deixassem a região militar.
Dentro do governo Lula, há avaliação majoritária de que os acampamentos deveriam ter sido desmobilizados antes. O diagnóstico é que a situação já era insustentável desde a noite de 12 de dezembro, quando bolsonaristas atearem fogo em carros e tentarem invadir a sede da Polícia Federal para soltar um indígena apoiador do ex-presidente preso.
Apesar das divergências, as autoridades decidiram montar um plano para a retirada dos bolsonaristas na manhã de segunda. O planejamento envolveu o envio de ônibus do transporte público de Brasília, para o traslado dos golpistas, o uso de ambulâncias e efetivo suficiente para cercar toda a Praça dos Cristais, onde o acampamento estava montado.
Durante as cerca de quatro horas de reuniões, policiais militares se espalharam pela proximidade do Setor Militar Urbano.
O acordo para a operação conjunta foi fechado por volta da meia-noite. Minutos depois, as viaturas da PM do DF deixaram o local, e os tanques de guerra, que impediam a entrada dos policiais, voltaram para os batalhões.
Flávio Dino comentou sobre as divergências que têm com o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, durante entrevista coletiva na segunda.
"A minha visão não é nesse sentido de martirização do ministro Múcio como sendo o grande vilão desse processo. Eu não compartilho dessa visão e tenho, ao contrário, solidariedade ao ministro Múcio, o que não significa concordância integral com as opiniões dele", disse.
"Obviamente, as pessoas são diferentes e montar uma equipe de governo é como qualquer instância da vida em que há diversidade e há pluralidade. Mas eu acho que não pode ser posta em dúvida a sinceridade, lealdade e correção do ministro Múcio."