Jornal Estado de Minas

INFRAESTRUTURA

O que Minas quer do Planalto


O governador Romeu Zema (Novo) e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) podem ter, nesta semana, o primeiro encontro para tratar de demandas prioritárias para Minas Gerais. Isso porque o governo federal marcou, para a próxima sexta-feira, reunião entre o petista e os 27 governadores, no Palácio do Planalto.



No início do mês, os chefes dos Executivos estaduais locais estiveram em Brasília para conversar com Lula, mas o encontro foi um ato simbólico de defesa da democracia em reação aos atos golpistas de 8 de janeiro.

Agora, embora o Palácio Tiradentes não tenha divulgado as demandas que Zema deve levar, a conversa pode ser norteada por temas que pautaram a primeira gestão do Novo em Minas, como a concessão da BR-381 à iniciativa privada e a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) federal.

O governo mineiro não confirma a presença de Zema no encontro e não informou as pautas que vai encampar durante o encontro, mas a avaliação interna é de que o governador deve participar.



Na semana passada, em entrevista à “Rádio Gaúcha”, Zema levantou a hipótese de “vista grossa” do governo federal diante da invasão das sedes do três Poderes e foi publicamente criticado pelos ministros Flávio Dino (PSB-MA), da Justiça, e Alexandre Silveira (PSD-MG), de Minas e Energia. Na sexta-feira (20), representantes dos nove estados do Nordeste se juntaram em João Pessoa (PB) para formular as reivindicações conjuntas que pretendem apresentar a Lula.

A ideia de fazer um fórum com os governadores vinha sendo cogitada por Lula desde antes do primeiro turno eleitoral. Durante a reunião emergencial sobre os atos golpistas, o presidente sinalizou que manteria de pé a proposta de ouvir dos governadores as três propostas prioritárias de cada estado. “Quero, no dia 27, fazer reunião com todos os governadores para a gente discutir os interesses do povo de cada estado. Não quero saber de que partido é o governador. A única coisa que me interessa é saber que ele foi eleito. E, se ele foi eleito, tenho que respeitá-lo, da mesma forma que quero que me respeitem, pois fui eleito”, disse.

Lula prometeu, ainda, fazer visitas aos estados e ter conversas individualizadas com os chefes dos Executivos estaduais. “Quero tratar todo mundo da forma mais democrática e respeitada que um político tem de tratar o outro”.

Em novembro, o secretário de Estado de Infraestrutura e Mobilidade, Fernando Marcato, levou ao gabinete de transição de Lula um documento com as necessidades urgentes do estado na área. O material aponta a concessão da BR-381, entre BH e Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, como de “fundamental importância”.



Na semana passada, o ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB-AL), afirmou que o plano de entregar a rodovia à iniciativa privada segue de pé, mas com alterações em relação aos planos divulgados pelo governo Bolsonaro. Agora, a ideia é privatizar o trecho sem atrelá-lo à BR-262. A avaliação é de que a presença da BR-381 em um amplo pacote de privatizações diminui a atratividade da via.

Renan Filho afirmou que o leilão da chamada “Rodovia da Morte” em virtude do alto número de acidentes deve ocorrer “em breve”. A viabilização da concessão, contudo, passa por aval do Tribunal de Contas da União (TCU). O edital é analisado pelo ex-governador Antonio Anastasia, agora ministro da corte. “Segundo informações, ele está na avaliação final para liberar a possibilidade de concessão da BR-381”, informou o ministro dos Transportes.

Paralelamente, o governo federal fala em retomar as obras de duplicação da BR-381. A entrega de nova pista em parte da rodovia compõe o plano de ação montado por Renan Filho para os primeiros 100 dias de gestão. A previsão é que as melhorias sejam finalizadas em abril. A entrada da BR-381 na lista de prioridades vai ao encontro de promessas de Lula. “Ganhando a eleição, vai ser questão de honra acabar com a estrada da morte e criar a estrada da vida”, assegurou, em outubro, durante entrevista ao EM e à TV Alterosa.





O dossiê entregue pelo secretário de Infraestrutura a interlocutores de Lula no fim do ano contemplou ainda outros pontos, como privatização do metrô de Belo Horizonte, cujo leilão já ocorreu, a venda das Centrais de Abastecimento de Minas Gerais S/A (CeasaMinas) e o apoio a aeroportos regionais do estado. A manutenção dos marcos legais das Ferrovias e do Saneamento também foi pedida.

DEMANDAS AO GOVERNO FEDERAL

O que Minas levou à equipe de transição e pode ser reforçado agora

Concessão da BR-381, trecho entre BH e Governador Valadares, à iniciativa privada

Privatização do metrô de Belo Horizonte

 Venda das Centrais de Abastecimento de Minas Gerais S/A (CeasaMinas)

Apoio a aeroportos regionais do estado

Manutenção dos marcos legais das Ferrovias e do Saneamento

O que mais pode demandar conversas com o governo Lula:  adesão ao Regime de Recuperação Fiscal para equacionar dívida do estado.

Solução para impasse da dívida

Em outra frente com a União, o governo Zema articula para concretizar a adesão de Minas Gerais ao Regime de Recuperação Fiscal. O programa é visto como saída para refinanciar a dívida do estado junto à União — em dezembro, o passivo girava em torno de R$ 147 bilhões.



Nos cálculos do governo estadual, sem a recuperação fiscal, Minas terá de desembolsar R$ 12 bilhões em 2023 por causa da dívida junto à União. Com o acordo, o gasto seria de R$ 4 bilhões. O estado tem até junho para definir os termos do refinanciamento. 

Como não há consenso na Assembleia Legislativa, o governo se ampara em liminares do Supremo Tribunal Federal (STF) para tirar o RRF do papel.

A recuperação fiscal foi instituída na gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB). No fim do ano passado, a crença no Palácio Tiradentes era de que mesmo a posse de Lula não frearia os planos de concretizar a adesão de Minas ao modelo de ajuste fiscal. Apesar das diferenças ideológicas, a avaliação é que o regime é uma política já posta em prática pela Secretaria do Tesouro. "O estado depende disso para se viabilizar”, pontuou Zema, há um mês.

Dos três maiores colégios eleitorais do país, apenas Minas Gerais não teve reunião particular do governador com o novo presidente. Na semana em que foram a Brasília reforçar a união dos estados em defesa da democracia, o governador paulista, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), se encontraram, separadamente, com Lula. Castro, aliás, tratou de um tema que, indiretamente, interessa a Zema. Isso porque ele sugeriu, ao petista, a revisão das regras que norteiam a participação da máquina pública fluminense no Regime de Recuperação Fiscal.




EMBATES

O encontro entre Lula e Zema deve ocorrer menos de duas semanas após o governador levantar a hipótese de “vista grossa” do governo sobre os atos radicais em Brasília. “Me parece que houve um erro da direita radical, que é minoria. Houve um erro também, talvez até proposital, do governo federal, que fez vista grossa para que o pior acontecesse e ele se fizesse, posteriormente, de vítima. É uma suposição. Mas as investigações vão apontar se foi isso”, afirmou.

A declaração gerou reações. O ministro da Justiça, Flávio Dino”. “Me espanta que o governador Zema tente vestir a roupa do Bolsonaro. Não cabe nele. É preciso que ele tenha algum amigo sincero que diga a ele... Primeiro porque Minas Gerais é a terra de Tiradentes, de Tancredo Neves, é a terra da democracia... Então não é possível que um governador de modo vil se alinhe à extrema direita para proteger terroristas ", devolveu. A acusação de Zema gerou, inclusive, uma ação no Superior Tribunal de Justiça (STJ), assinada pelo deputado federal Reginaldo Lopes, líder do PT na Câmara, e pelo petista paranaense Zeca Dirceu.