Brasília – Distorcido pelos bolsonaristas como justificativa para defender uma intervenção militar no país, o artigo 142 da Constituição Federal, que trata do papel das Forças Armadas na sociedade, entrou na mira do governo federal.
Especialistas ouvidos pelo Correio Braziliense/Estado de Minas, defendem que a proposta é positiva, diante a crescente politização dos militares no país desde o governo de Jair Bolsonaro.
A expectativa é que nos próximos dias seja apresentada uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para excluir as chamadas operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) do dispositivo.
O projeto está nas mãos do deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP) e em fase final de preparação. Para a proposição começar a tramitar na Casa, são necessárias 171 assinaturas, ou seja, o apoio de cerca de um terço dos parlamentares.
Especialistas ouvidos pelo Correio Braziliense/Estado de Minas, defendem que a proposta é positiva, diante a crescente politização dos militares no país desde o governo de Jair Bolsonaro.
A expectativa é que nos próximos dias seja apresentada uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para excluir as chamadas operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) do dispositivo.
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A GLO é uma operação realizada por ordem do presidente da República e deve ser usada em situações graves de perturbação da ordem. Além de excluir o item, outro objetivo do texto é restringir a presença de militares em cargos políticos. Esse item, inclusive, já foi defendido publicamente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que demonstrou incômodo com a participação de oficiais na administração federal.
Na avaliação de Nauê Bernardo de Azevedo, advogado constitucionalista e cientista político, o projeto é bem-vindo para evitar qualquer equívoco a respeito da Constituição. “Tem que riscar essa linha, que é o que o governo do PT parece estar disposto a fazer. Pode ser uma forma muito razoável e interessante de a gente evitar que a política entre nas Forças Armadas e a submeta a essas suspeitas que temos visto ultimamente, que acabam colocando o país inteiro em descrédito”, destaca.
Outra expectativa é que o projeto também restrinja a participação de militares em funções políticas. Nesses casos, eles seriam encaminhados diretamente para a reserva, evitando, assim, o conflito de interesses. “Isso se mostra igualmente positivo. Os militares exercem funções de Estado, e, portanto, sua função não se coaduna com a ocupação de funções políticas junto aos governos de plantão”, defende o advogado Cristiano Vilela, especialista em direito público.
No entanto, para o advogado Denis Camargo Passerotti, especialista em direito administrativo, o projeto é precipitado. “ Se mostra desnecessária e desmedida. O que se tem, na verdade, é o claro intuito de atribuir ao chefe do Executivo a prerrogativa de acionar as Forças Armadas, esvaziar a GLO e proibir que seus membros efetivos participem da política e ocupem cargos públicos, tudo em resposta ao movimento de politização das Forças Armadas ocorrido no governo de Jair Bolsonaro”, argumenta.
O ministro da Defesa, José Múcio, deve se reunir na próxima semana com militares para discutir as propostas que serão apresentadas na Câmara dos Deputados para alterar o artigo 142 da Constituição. O objetivo é mediar o diálogo com os chefes do Exército, Marinha e Aeronáutica e evitar mais desgaste entre o Executivo e os militares — que formaram base aliada da gestão anterior. Uma proposta semelhante já havia sido estudada antes do feriado de 7 de setembro. No entanto, ganhou mais força após os atos de 8 de janeiro. “O que o projeto e as forças democráticas querem é tornar mais claro e referendar que não é possível convocar um poder para intervir. Tem que corrigir essa má leitura”, avalia o cientista político André César, da Hold Assessoria Legislativa. “O momento é este. Depois do 8 de janeiro, ficou mais urgente essa questão”, conclui.
Oficial do Exército critica a medida
O oficial do Exército da reserva Marcelo Pimentel, mestre em ciências militares pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, diz que a proibição da politização das Forças Armadas já é prevista por lei. “Antes de criar legislações, novas normas, ou reformar as existentes, reforçar uma Constituição exige um esforço político enorme, é necessário que se cobre o cumprimento das leis existentes. Existem diversos dispositivos na Lei 6.880/80, que é o estatuto dos militares, que estão sendo descumpridos pelos militares. E o comando das Forças não está exigindo que os militares cumpram essas normas”, argumenta.
Pimentel defende um amadurecimento das propostas antes de serem apresentadas. Para ele, a apresentação de uma PEC é uma medida radical e existem outros meios de impedir a politização das Forças Armadas. “Não precisa mudar a Constituição para isso, basta alterar essas normas infraconstitucionais e também a ação executiva do governo de não empregar as Forças Armadas em operações de Garantia da Lei e da Ordem”, disse. “Além disso, reformar essas normas infralegais é muito mais fácil do que uma PEC — que pode representar, inclusive, desgaste para o governo”, pondera.
Em 8 de janeiro, bolsonaristas extremistas invadiram e depredaram os prédios da Praça dos Três Poderes, por não aceitar a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Diante da situação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decretou intervenção federal para assumir a segurança do Distrito Federal. O governador Ibaneis Rocha (MDB) foi afastado do cargo e Anderson Torres, que respondia pela segurança pública da capital, foi preso.