Primeira mulher negra a ocupar a Mesa Diretora da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Marilene Alves de Souza, mais conhecida como Leninha (PT), é a nova vice-presidente do parlamento mineiro e carrega consigo o desafio de conciliar a gestão política da Casa com a oposição ao governo Romeu Zema (Novo).
Nesta entrevista ao Estado de Minas, ela garante que não vai ficar neutra. Mesmo considerando que o tom dessa nova gestão da Assembleia será de conciliação e moderação, a deputada destaca que vai continuar expressando sua opinião e posicionamento enquanto oposição a Zema.
Ela afirma não se sentir representada pelo atual governador do estado. Diz que não vê nas Minas Gerais de Romeu Zema um “modelo de desenvolvimento que tenha o ser humano como centro” das decisões.
Para Leninha, ser a primeira mulher negra a ocupar a vice-presidência da Assembleia de Minas em seus 133 anos é muito simbólico. “Significa que conseguimos romper muitas barreiras. Significa que queremos, precisamos e merecemos ter reconhecidos os nossos méritos na construção, na proposição e na consolidação de políticas públicas que garantam a nós mulheres condições de igualdade em todos os espaços da vida social”, diz.
Lidar com as divergências é práxis dos movimentos sociais. E não foi diferente na Assembleia. Construí o primeiro mandato com muita seriedade, presidi a Comissão de Direitos Humanos e liderei pela primeira vez a bancada feminina da Casa. Creio que tudo isso, mais a forma como me coloco tenha corroborado para a sustentação do meu nome na chapa com o Tadeuzinho, com quem, além de ser conterrânea, construí laços fortes de amizade e respeito.
Penso que a maior dificuldade foi caminharmos para a construção de uma chapa que, mesmo com suas divergências, tivesse como balizador a consolidação do papel do legislativo no dia a dia dos mineiros e mineiras.
As siglas partidárias, os posicionamentos ideológicos não podem, não devem, impedir que façamos o que é necessário e urgente para o bem-estar da população do nosso estado.
Cordialidade não é sinônimo de neutralidade. Serei na Mesa e no parlamento uma oposição responsável ao governo. Meu compromisso em defender o povo das Minas e dos Gerais é o meu balizador. A defesa da vida, dos direitos e garantias conquistados é inegociável em qualquer lugar ou posição que eu ocupo.
Temos, enquanto bancada, o compromisso que o próprio presidente instituiu: combate à fome, investir na educação básica e investir na saúde pública, reconhecendo as urgências desses três pontos.
"Cordialidade não é sinônimo de neutralidade. Serei na Mesa e no parlamento uma oposição responsável ao governo"
Portanto, enquanto bancada, essa é a nossa grande tarefa. Inserir nosso estado em todos os programas e políticas que permitam retirar a nossa gente da extrema miséria, vulnerabilidade e fome e ampliar os investimentos na educação e na saúde.
Primeiro vejo uma grande distopia nesse modelo de gestão. Retirar de forma deletéria do nosso solo, das nossas águas e da nossa sociobiodiversidade o que o temos de mais precioso implica em reduzir a possibilidade de futuro logo adiante. Sou autora de um projeto de lei que reconhece os direitos da natureza como uma prerrogativa para a instalação de empreendimentos como a mineração, silvicultura do eucalipto, entre outros.
O que nós propomos é que haja instrumentos norteadores para que não tenhamos que negociar, barganhar compensações, atenuantes depois dos desastres, como aconteceu em Mariana e Brumadinho. Além disso, vejo o estado muito distante, mínimo mesmo, na vida das pessoas, principalmente daquelas a quem ele precisa acudir. No campo e na cidade, não temos a presença forte e marcante do estado no sentido de fomentar e fortalecer aqueles que precisam da mão do estado.
Queremos, precisamos e merecemos ter reconhecidos os nossos méritos na construção, na proposição e na consolidação de políticas públicas que garantam a nós mulheres condições de igualdade em todos os espaços da vida social. Significa muito para mim, uma bióloga, professora, sindicalista, militante dos direitos humanos e da natureza.
Significa que a trajetória de lutas de uma vida inteira, não só minha, mas de tantas milhares de mulheres estado adentro e afora está representada neste assento. Quando me coloco neste lugar, essas mulheres todas dividem comigo essa tarefa que aceitei desempenhar.
A luta pela liberdade é componente do nosso DNA. Então, desse modo, penso que temos como missão contribuir para a proposição de projetos, ações mais efetivas, práticas e resolutivas para o dia a dia das pessoas. Isso para mim é um ponto de ordem.
A política precisa fazer sentido na vida das pessoas, do transporte público à ida no sacolão, a compra do remédio, tudo é política e tudo pede a presença de um estado que cuide das pessoas. A representação política também precisa ser pautada por esse viés. Colocarmos em discussão um novo modelo de desenvolvimento do estado é para mim essencial.
Não podemos continuar fadados à mineração predatória. Fortalecer as instituições e não sucumbir o estado à iniciativa privada. Minha luta enquanto vice-presidente da Assembleia é a defesa e a consolidação de um estado forte na melhoria da qualidade de vida da nossa gente.
Precisamos vencer o preconceito e a violência em todos os espaços da vida, inclusive, no parlamento e não estou só nessa luta. Precisamos de políticas públicas de proteção e, sobretudo, de apoio às mulheres, ao povo negro e à comunidade LGBTQIA.
Inclusive, penso que um primeiro e importante passo é parar de colocar esses grandes grupos como minorias. Não são. São sujeitos de direitos e deveres para os quais o estado ainda tem muito o que fazer.