O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem sido pressionado por deputados aliados a proibir exportações de armamentos ao governo do Peru. A justificativa é a crise política e social em que a nação andina está mergulhada desde o final do ano passado.
Parlamentares do PSOL buscam com isso impedir que artefatos letais e não letais de fabricação brasileira sejam usados pelas forças de segurança andinas para reprimir manifestantes --apoiadores do líder populista Pedro Castillo ocupam as ruas do país desde que ele foi destituído, em dezembro, após um golpe de Estado fracassado.
O tema foi discutido nesta semana entre congressistas e o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira. No encontro, o chanceler se comprometeu a levar o caso à Lula, além de fazer consultas internas e ao Ministério da Defesa. Antes da reunião, um ofício já havia sido encaminhado a Vieira para analisar o pedido.
Um dos argumentos usados pelos deputados do PSOL parte de um relatório preliminar da Anistia Internacional. De acordo com ele, o governo peruano cometeu diversas violações de direitos humanos na repressão aos atos, incluindo uso de armamento letal e emprego indiscriminado de armas não letais contra indígenas e trabalhadores rurais.
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STF forma maioria e mantém regras de Lula para restrição de acesso a armas Paes sobre Zambelli: 'Pistoleira que anda armada ameaçando os outros'Dino sobre chacina de Sinop: 'Resultado trágico da política armamentista'Lula prega PAC repaginado para conclusão de obras paradasMaioria dos deputados mineiros concentra seus votos em uma só região"Ainda que não haja impedimento legal, não parece compatível com a nova orientação da política externa brasileira, pautada no diálogo e no respeito aos direitos humanos, fornecer munição a ser usada contra movimentos sociais e o conjunto da população", diz a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) no ofício encaminhado ao Itamaraty.
Ela defende que Lula condene a repressão aos atos promovida pelo governo de Dina Boluarte mesmo que não proíba de vez a exportação de armamentos. "O Brasil pode ter um posicionamento político enérgico e defender que as armas produzidas no país não sejam usadas para matar civis", declara a deputada à Folha.
Integrantes do governo avaliam que é possível que o presidente adote uma manifestação nesse sentido.
Em resposta ao ofício, a Afepa (Assessoria Especial de Relações Federativas e com o Congresso Nacional) do Ministério das Relações Exteriores disse que a Política Nacional de Exportação e Importação de Produtos de Defesa atualiza a Liprode (Lista de Produtos de Defesa) e determina as responsabilidades do Ministério das Relações Exteriores e do Ministério da Defesa na aprovação da exportação de produtos de defesa.
A Liprode categoriza produtos de defesa em dois níveis. O primeiro dispensa a fase de procedimentos preliminares e requer apenas análise do Ministério da Defesa. Já o segundo nível inclui produtos que requerem a fase de procedimentos preliminares, e devem ser analisados tanto pela pasta da Defesa quanto pela das Relações Exteriores.
Armas e munições não letais ou de energia integram a primeira categoria e só requerem análise do Ministério da Defesa.
Em resposta a ofício enviado pelo PSOL, o Ministério da Defesa afirmou que não há restrições impostas ao Peru e, por isso, todos os requisitos estavam preenchidos para a exportação. Declarou ainda que não há restrição para a comercialização desses produtos.
"A ONU reconhece os produtos menos letais como sendo necessários ao cumprimento da missão de agentes responsáveis pela aplicação da lei, resguardados os direitos humanos, desde o seu 8º Congresso para Prevenção do Crime, ocorrido em 18 de dezembro de 1990", diz a pasta no documento.
Melchionna diz que contestará o posicionamento do Ministério da Defesa, uma vez que haveria uma contradição entre o argumento apresentado pela pasta e o plano nacional de importações e exportações. Segundo ela, a diretiva é muito clara quando afirma que as armas não devem violar direitos humanos, sejam elas letais ou não.
A empresa brasileira Condor, de armamentos não letais, confirmou que tem negociações com o governo do Peru. Ela informou que não pode dar informações sobre vendas governamentais no Brasil ou no exterior em razão de cláusulas de sigilo. Em nota, disse, porém, que "desde o início do emprego dos dispositivos não letais fornecidos pela Condor na atual crise do Peru, as forças de segurança locais passaram a ter alternativas ao uso das armas de fogo, o que não estava acontecendo anteriormente".
O Peru vive há anos uma espiral de crises políticas e sociais, intensificadas após a queda do presidente Pedro Castillo. Levantamento mais recente da Defensoria Pública do país contabiliza que, do início dos protestos contra a sua destituição até a sexta-feira, 66 pessoas haviam morrido durante os atos, 48 deles em enfrentamentos com as forças de segurança. Mais de 1.300 pessoas se feriram.
Na terça, Dina, primeira mulher a liderar o país, completou três conturbados meses no poder. Vice de Castillo, ela substituiu o ex-líder, hoje detido em prisão preventiva e formalmente investigado por corrupção e lavagem de dinheiro.