Brasília – O governo federal pretende investigar os responsáveis pelo monitoramento de celulares feitos pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL).
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que considera grave a atuação da Abin. “Isso é muito grave. É mais uma questão a ser apurada das profundas irregularidades cometidas, não só por Bolsonaro, como por agentes do governo anterior”, disse o ministro ao jornal O Globo, que fez a denúncia contra a Abin.
“A própria Abin e outros órgãos, como o próprio Ministério da Justiça, certamente irão apurar essas situações e, se for comprovada uma irregularidade tão grave na vida íntima das pessoas, nos direitos individuais, na liberdade das pessoas, se isso for confirmado, os responsáveis têm que ser fortemente punidos”, completou Padilha.
O ministro da Casa Civil, Rui Costa, disse que a agência será reformulada. Ele informou que o objetivo do governo Lula é reformular a agência de inteligência, que deixou de ser subordinada ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI), órgão tradicionalmente comandado por militares, e passou para o guarda-chuva da Casa Civil.
“Assim que tivermos a nova direção da Abin, nós vamos reformular. Posso dizer que sob nova direção, toda a lei será respeitada no trabalho da Abin. Se algo foi feito no passado, no outro governo, que não tem conformidade com a lei, isso será levado a quem é responsável, à CGU (Controladoria Geral da União), aos órgãos de Justiça, para que as providências cabíveis, a responsabilização devida, seja feita”, afirmou.
“Esse episódio da Abin será encaminhado para os órgãos competentes e o que vai ser feito agora são as mudanças de pessoas, de métodos e de práticas para estarem alinhados com a legislação em vigor”, completou Costa. A Controladoria Geral da União confirmou que vai investigar o uso da ferramenta de monitoramento de cidadãos. O órgão vai apurar a responsabilidade dos servidores públicos no uso irregular do programa de monitoramento.
A Abin operou um sistema secreto de monitoramento da localização de pessoas em todo o país. Usava um sistema secreto de monitoramento, durante os três primeiros anos do governo anterior, por meio de uma ferramenta que permitia acompanhar os passos de até 10 mil proprietários de celulares a cada 12 meses, sem a permissão deles. A ferramenta, chamada "FirstMile", ofereceu à Abin a possibilidade de identificar a "localização da área aproximada de aparelhos que utilizam as redes 2G, 3G e 4G".
O programa foi desenvolvido pela empresa israelense Cognyte (ex-Verint) e permitia rastrear o trajeto de uma pessoa a partir de dados transferidos do celular para torres de telecomunicações instaladas em diferentes regiões. Para tanto, bastava digitar o número de um contato telefônico no programa e acompanhar num mapa a última localização conhecida do dono do aparelho. A Abin comprou o programa por R$ 5,7 milhões, com dispensa de licitação, no fim de 2018, no governo Temer e foi utilizada ao longo do governo Bolsonaro até meados de 2021.
A prática levou a questionamentos dentro da própria agência, porque ela não tem autorização legal para acessar dados privados. O caso provocou abertura de investigação interna.
Em nota, a agência admitiu que o contrato para uso do programa, de caráter sigiloso, começou em 26 de dezembro de 2018 e foi encerrado em 8 de maio de 2021. "Atualmente, a Agência está em processo de aperfeiçoamento e revisão de seus normativos internos, em consonância com o interesse público e o compromisso com o Estado democrático de direito", afirmou a agência.
Congresso cobrará acesso a documentos
Brasília – O vice-presidente da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso Nacional, Renan Calheiros (MDB-AL), informou que vai requisitar à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) todos os contratos e documentos produzidos a partir do “FirstMile”, ferramenta usada para monitorar a localização de até 10 mil celulares. Ele quer acesso aos documentos para entender qual foi a extensão do monitoramento feito pela agência. A partir dos relatórios de inteligências produzidos, poderá identificar quem foi monitorado. Com isso, pretende esclarecer se a ferramenta foi utilizada para perseguir desafetos do governo Bolsonaro. A comissão mista ainda não foi instalada oficialmente, já que depende da indicação dos deputados, que compõem metade do colegiado.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder do governo no Congresso Nacional, afirmou que vai tomar medidas para apurar o ocorrido. Em suas redes sociais, o parlamentar defendeu uma invesitgação do caso por meio da Comissão de Controle das Atividades de Inteligência (CCAI), responsável por fiscalizar as atividades da agência, e a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).