Por Luján Scarpinelli
"Janja", como é conhecida a socióloga Rosângela da Silva, de 56 anos, trocou o estilo casual de "jeans" e tênis que manteve durante a campanha com o líder de esquerda, de 77, por um mais elegante, com desenhos feitos a partir de matérias-primas regionais, como algodão ou fibras de seda, com simbolismos coloridos.
Entre eles, uma estrela vermelha, símbolo do Partido dos Trabalhadores de Lula, na sola da sandália de couro; a estampa de Maria Bonita, ícone feminista nordestina, em uma blusa de seda; bordados de cooperativa feminina em um blazer, ou uma saia sustentável feita de retalhos.
Suas escolhas estão alinhadas com o objetivo de ressignificar o papel de primeira-dama, cujo termo ela descarta como "patriarcal" e pediu para não ser usado.
Paralelamente, ela pretende "levar estilistas brasileiros aonde for", como ela mesma disse em janeiro em entrevista à revista Vogue.
A primeira de calça
Da marca brasileira Reptilia, ela usou modelos feitos com materiais reaproveitados, com tecidos de lojas antigas fechadas e outros feitos com casca de algodão.
"Ela traz a praticidade para o papel de primeira-dama, de uma pessoa muito mão na massa", analisa Heloisa Strobel, 36, fundadora da Reptilia, que ganhou destaque especial com uma saia vermelha usada por Janja na Argentina.
"Não é aquela primeira-dama que vai usar um vestido justinho abaixo do joelho e que mal vai conseguir andar", acrescenta.
Por outro lado, essa é uma vestimenta comum da esposa do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), Michelle, que costumava usar cores pastéis em contraste com os tons fortes de Janja.
As estilistas Helo Rocha e Camila Pedrosa chamaram a atenção ao vesti-la para o casamento e posse de Lula, no dia 1º de janeiro, em Brasília, cerimônia em que ela não usou vestido, quebrando os costumes das primeiras-damas brasileiras.
Na ocasião, Janja vestiu uma calça de seda tingida com castanha de caju e ruibarbo - que crescem no Brasil -, com bordados de palha de tradição indígena feitos por artesãs do nordeste.
"A calça é um símbolo da emancipação feminina. Em Brasília, até cerca de 20 anos atrás, as mulheres não podiam usá-la para entrar no Congresso ou no Supremo Tribunal Federal", explica Rocha.
A modernidade de Janja contrastou com o estilo clássico do marido Lula, que vestiu terno escuro e gravata.
Mais profundo
Na Misci, marca de destaque na São Paulo Fashion Week, a socióloga comprou blazers, saias e camisas, como a que homenageia a nordestina Maria Bonita.
"A moda materializa o momento sociopolítico. Janja pegou ferramentas da marca para falar através do que ela veste", diz Airon Martin, 31, criador da Misci.
"Lá fora, o Brasil é conhecido pelo carnaval. Mas o Brasil é mais profundo que isso. Também temos uma indústria de luxo muito poderosa, com sedas e algodões incríveis", defende Martin.
Janja "quer mostrar o que há de melhor na moda brasileira, diferente do óbvio representado por uma estampa de coqueiro ou a calçada de Copacabana", resume Heloisa Strobel.
No Brasil, a indústria têxtil e de confecções movimentou R$ 153 bilhões em 2022, segundo estimativas do setor.