Carreira típica de Estado, a diplomacia brasileira passa por uma mudança de rumo com o novo governo, que assumiu em janeiro. Mas, diferentemente do que aconteceu com os militares e as forças de segurança pública, o processo de “desideologização” no Itamaraty não se dará com expurgos de nomes ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A transição segue os ritos da própria diplomacia, com boa dose de “soft power” (poder suave) e reconhecimento de quem trabalhou profissionalmente nos últimos quatro anos para proteger a imagem das relações exteriores do país, abalada pela guinada antiglobalização – com boa dose de bravatas – promovida pelo então presidente Bolsonaro (PL) e seu chanceler, Ernesto Araújo.
A orientação dada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao ministro das Relações Exteriores, embaixador Mauro Vieira, é a mesma dirigida aos ministros da Defesa, José Múcio Monteiro, e da Justiça, Flávio Dino: “desbolsonarizar” os postos estratégicos. No Itamaraty, o processo tomou corpo com a nova lista de embaixadores enviada ao Senado Federal em substituição às indicações feitas pelo governo anterior.
O chanceler Mauro Vieira informou que fará uma visita ao presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Casa, Renan Calheiros, para retribuir a reunião (fora da agenda) que os dois tiveram, na noite de terça-feira da semana passada, no Palácio do Itamaraty. “Temos uma série grande de tratados e acordos internacionais que estão em exame na comissão e no Senado, em diferentes comissões, então foi isso, o que fizemos foi organizar essa pauta”, disse ele à reportagem.
Aliado do presidente Lula, Calheiros vai dar celeridade ao agendamento das sabatinas de embaixadores que já receberam o aceite dos respectivos governos estrangeiros. “Tem uma lista grande, de 15 nomes de embaixadores que irão ser submetidos (à sabatina), eu combinei com ele (Calheiros) de mandar nomes de diplomatas que já receberam o agrément (aceite)”, declarou o chanceler.
Blindagem
Por enquanto, poucos diplomatas – os mais identificados com a política externa isolacionista de Ernesto Araújo – encontrarão dificuldade para se reposicionar. O ministro Mauro Vieira está convencido de que o corpo diplomático, em sua maioria, ajudou o país a manter sua reputação nas relações externas e em fóruns multilaterais. Nessa avaliação, estão incluídos o ex-chanceler Carlos França e sua equipe.
França pleiteava indicação para uma embaixada de prestígio, como a de Buenos Aires, ou o comando de delegação junto a organismos multilaterais, como as Nações Unidas. Receberá um posto na representação diplomática do país no Canadá, o que não significa desprestígio. Responsável pelo cerimonial da Presidência da República antes de assumir o posto de chanceler, França comandará, pela primeira vez, uma representação no exterior.