Quando Tarcísio de Freitas (Republicanos) golpeou sem clemência o balcão da Bolsa de Valores, para celebrar o fim do leilão do trecho norte do Rodoanel, ensaiou por tabela marretar a má vontade contra ele nutrida por uma parcela do bolsonarismo mais aguerrido.
Mais gestos vieram na mesma semana. O Terra Brasil Notícias, um dos oráculos da comunicação bolsonarista, reproduziu a participação do governador de São Paulo nos 143 anos do Corpo de Bombeiros e destacou: "Tarcísio comanda cerimônia militar pessoalmente".
O chefe do Executivo paulista também sancionou um projeto de lei que tornou a Marcha para Jesus, maior evento no calendário evangélico do continente, patrimônio cultural imaterial do estado —ato prontamente exaltado por portais do segmento, como o Pleno News.
Os últimos dias foram lidos, por aliados e também desafetos, como um aceno do governador ao eleitorado mais fiel a Jair Bolsonaro (PL), grupo que o embalou até o Palácio dos Bandeirantes. A relação andava estremecida após Tarcísio emitir sinais que não caíram bem com parte dessa base.
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Disse Tarcísio ao manusear o martelo: "O pessoal está tímido ainda, mas vou mostrar como é que faz". Com pretensões presidenciais para 2026 no radar, ainda lhe resta mostrar como se faz para sinalizar para um eleitorado mais amplo sem desagradar a base que cimentou sua vitória no ano passado.
Tímida foi, até aqui, a reação em grupos digitais bolsonaristas a movimentos do governador que aliados interpretam como uma piscadela para a direita.
O Telegram se empolgou, mas com comedimento, com a empolgação de Tarcísio do leilão do Rodoanel, aponta monitoramento coordenado por Leonardo Nascimento, Letícia Cesarino e Paulo Fonseca com apoio do InternetLab.
As mensagens mais compartilhadas sobre o episódio nos principais canais a favor de Bolsonaro somam 20 menções. "Parece pouco, mas são grupos com centenas de inscritos", diz Nascimento, professor da Universidade Federal da Bahia.
Diz uma delas: "Bate Tarcísio, martelaaaaaaaaaaa!! Imagina toda a pressão que ele deve estar sofrendo e o duro que foi finalmente bater este martelo. Que Deus te abençoe e te dê muita força para fazer São Paulo decolar!!".
Um recado o parabenizando, postado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), impulsionou as referências positivas ao governador nesse ecossistema digital. Para Nascimento, Tarcísio parece estar "estrategicamente acenando para as pautas do bolsonarismo para tentar ocupar o lugar do ‘pai da horda’".
O vereador paulistano Fernando Holiday (Republicanos), que respaldou Tarcísio e Bolsonaro em 2022, não detectou em sua bolha direitista muitas demonstrações públicas de afeto ao entusiasmo do governador com a privatização de extensão do Rodoanel. "Eu só o vi postando e a esquerda criticando", diz, acrescentando um emoji de gargalhada.
Segundo Holiday, alguns devotos de Bolsonaro não gostam muito de qualquer sinal de entrosamento com a esquerda, mesmo que num nível republicano. Daí a implicância com Tarcísio. "Mas isso é só uma questão de amadurecimento da direita. Foi por falta de gestos como esses que acabamos sendo tachados de antidemocráticos."
A direita, segundo o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), ex-presidente da bancada evangélica, "está engatinhando no Brasil" e ainda "passará pelo amadurecimento natural da política".
"O governador foi militar e sempre foi liberal na economia, essa é a essência dele", afirma o parlamentar. "Quem é não precisa provar, é só praticar aquilo que ele acredita e defende."
Enquanto fileiras mais ideológicas do bolsonarismo resistem ao governador, chegando a lhe rotular como "traíra", nos bastidores do poder seu nome cresce entre as apostas para bater a esquerda na próxima eleição a presidente, sobretudo se questões judiciais tornarem Bolsonaro inelegível.
Para o apóstolo César Augusto, um dos evangélicos que marchou com o ex-presidente na fracassada campanha pela reeleição, lustra a biografia de Tarcísio com adjetivos como "ousado" e "corajoso".
Para o líder da igreja Fonte da Vida, o governador vai cada vez mais "ocupando espaço que está vago na direita e surfando numa onda onde não tem ninguém". Virou "uma opção no cenário nacional para combater a esquerda".
Em nota, o Bandeirantes diz que "todas as medidas e decisões adotadas pela atual gestão estão alinhadas com o plano de governo e são voltadas à promoção do diálogo e do desenvolvimento a fim de assegurar a dignidade a todos os paulistas".