O Ministério da Saúde descartou 999,7 mil canetas de insulina de ação rápida durante a gestão Jair Bolsonaro (PL).
Avaliados em quase R$ 15 milhões, os produtos usados para diabetes perderam a validade de setembro de 2020 a junho de 2021. Os lotes eram parte de uma compra de 4 milhões de tubetes, feita em 2018.
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Associações médicas e de pacientes chegaram a alertar o ministério, antes do fim da validade, que havia excesso de burocracia para ter acesso ao produto.
Para receber as doses de insulina análoga de ação rápida, o paciente precisava ser atendido por um endocrinologista. Esse médico teria de preencher um extenso relatório.
Presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes, o médico Levimar Araújo disse que o correto seria liberar a insulina ao paciente por meio de uma receita mais simples.
"Às vezes o médico precisa preencher um documento de seis folhas. Fiz medicina para examinar os pacientes, não para isso", afirmou.
Ele ainda aponta como barreira a exigência de pacientes renovarem a receita para pegar novos tubetes.
No começo de março, os ministros do TCU (Tribunal de Contas da União) abriram uma tomada de contas especial para avaliar responsabilidade sobre a má gestão de estoques da Saúde.
Um dos pontos destacados em auditoria do tribunal é a perda das insulinas.
"A causa dessa perda encontra-se associada às deficiências no planejamento da contratação", apontaram os técnicos do tribunal.
O lote foi o primeiro desse tipo de insulina comprado pela Saúde.
Para o tribunal, como não havia "informações precisas e confiáveis para definição do quantitativo, ou registros históricos de consumo", a compra deveria ter sido feita de forma parcelada, para evitar o fim da validade dos produtos.
O ministério ainda incinerou na gestão Bolsonaro outros tipos de insulina, além de bomba de infusão e agulhas usadas na caneta. Essas perdas, porém, foram em quantidades menores, avaliadas em R$ 13 mil.
Apenas a incineração das canetas de insulina vencidas custou R$ 64 mil.
Segundo o médico Levimar Araújo, a insulina de ação rápida ajuda a reduzir episódios de hipoglicemia.
Sem o produto, quem convive com a diabetes tem maior chance de cegueira, amputações, entre outras complicações da doença, afirma ainda Araujo.
Em nota, a Saúde disse que o cenário de perda de vacinas, medicamentos e outros insumos " reflete o descaso do governo anterior, que negou à equipe de transição informações sobre estoques e validade desses produtos."
A pasta afirma que trabalha para adequar estoques e melhorar a distribuição dos produtos.
Há ainda a busca de uma solução pactuada com os conselhos de secretários estaduais e municipais de saúde com o objetivo de evitar novos desperdícios.
Questionado durante a semana sobre as perdas, o ex-ministro Marcelo Queiroga (que comandou a pasta de março de 2021 a dezembro de 2022) afirmou que não tem dados sobre estoques e que essas informações ficam sob cuidado das áreas técnicas.
Já Luiz Henrique Mandetta, primeiro ministro da Saúde do governo Bolsonaro (de janeiro de 2019 a abril de 2020), disse que no período em que comandou a pasta houve esforço para adequar a gestão dos estoques, ao transferir os produtos de armazéns no Rio de Janeiro para uma central em Guarulhos, na Grande São Paulo.
O atual deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ), que também foi ministro da Saúde no governo Bolsonaro (de junho de 2020 a março de 2021), não se manifestou.
Estoques perdidos do SUS
Produtos descartados a partir de 2019
Vacinas para Covid-19: 39 milhões de doses/ R$ 2 bilhões
Outras vacinas: 7,4 milhões de frascos*/R$ 128 milhões
Caneta de insulina: 1 milhão de unidades/R$ 15 milhões
Terapias de doenças raras: ao menos 12 tipos/ R$ 13 milhões
Outros insumos: cerca de 96 milhões
Total perdido: cerca de R$ 2,2 bilhões