Jornal Estado de Minas

ENTREVISTA / PAULO RABELLO DE CASTRO

'Essa reforma tributária não é reforma', diz ex-presidente do IBGE e BNDES


A proposta de reforma tributária encapada pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a partir das propostas de emenda à Constituição – PEC 45, que tramita na Câmara, e PEC 110, que tramita no Senado –, podem aumentar a carga tributária para a população de baixa renda e correm o risco de implantar um sistema que, a título de simplificar, apresente lacunas que tornem o “manicômio tributário brasileiro ainda mais complexo. A avaliação é do economista Paulo Rabello de Castro, para quem “essa reforma tributária não é reforma, na realidade é mais uma arrumação”. O ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), vê o sistema tributário brasileiro como “a representação do nosso descaminho. Da ausência de diálogo verdadeiro no plano político entre representante e representado”.



Ex-presidente do Instituto Atlântico, entidade sem fins lucrativos, formuladora de políticas públicas, fundada em 1993, Rabello de Castro lembra que o sistema atual de tributação foi modificado, principalmente a partir do Plano Real, “como resposta torta para a dificuldade do Brasil, onde o ajuste político se faz com a ampliação constante da despesa do Estado sempre acima e num ritmo superior ao crescimento do PIB. Ou seja, o PIB é cada vez menos capaz de sustentar a máquina estatal”. Autor do livro “O mito do governo grátis”, ele apresenta a proposta de reforma tributária do Instituto Atlântico, que considera mais fácil de ser implantada do que a das PECs, que estabelecem período de transição, com a coexistência do imposto novo sobre o consumo com a tributação que será substituída. Para ele, a reforma tributária do governo não garantirá crescimento econômico, como defende a equipe econômica. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Estado de Minas.
 
 

A pergunta básica de todo o cidadão é por que desde antes do Plano Real se fala na necessidade de reforma tributária, mas que nunca foi feita. Por quê? Qual o problema do sistema tributário brasileiro?
O principal problema, disparado, é o excessivo peso dos tributos sobre o consumo, em relação à carga incidente sobre renda e propriedade. O Brasil está estagnado em relação ao mundo e muito mais em relação aos emergentes por um conjunto de problemas. E a questão política e institucional para mim é até mais grave do que esse manicômio tributário. Na lista de fatores econômicos, que têm aspectos institucionais envolvidos, é possível citar o sistema tributário como a representação do nosso descaminho. A representação maior dessa ausência de diálogo verdadeiro no plano político entre representante e representado.

Mas há ainda um emaranhado de impostos e regras.
Esse emaranhado de impostos surge como uma resposta torta para a dificuldade em enfrentar o que seria, numa síntese, a questão política brasileira, que é um estado, que, no dizer do jurista Yves Gandra,”um estado que não cabe no PIB”. Ou seja, desde antes do Plano Real, mas muito consistente, a partir dele, o ajuste político se faz com a ampliação constante do Estado e quando falo do Estado falo da despesa do Estado sempre acima e num ritmo superior ao crescimento do PIB. Ou seja, o PIB é cada vez menos capaz de sustentar a máquina estatal, porém, com um fator diabólico: a tributação. A tributação, através de especialistas competentes, consegue dar a volta no cidadão fazendo com que, apesar do déficit ainda crônico, que é o resultado negativo entre receita e despesa, a receita consiga validar a obesidade estatal. Ou seja, é como se o sistema tributário fosse ser o controlador de lipídios que você toma diariamente para consertar aquilo que a dieta faria. Então, é uma corrida doentia entre obesidade e medicamentos, que é a tributação. E como há competência nisso, são três esferas de governo e nisso o Brasil se distingue do resto do mundo porque aqui nos temos três entes tributantes, além de uma certa autonomia de autarquias como o INSS, portanto, temos, na realidade, três facas para cortar a mesma carne. Há uma competição e daí os puxadinhos tributários e o resultante manicômio, porque essa corrida da receita correndo atrás da despesa é a gênese do processo.





Mas e a simplificação da cobrança que está sendo proposta?
Não nos iludamos, não haverá reforma tributária quer segmentada – essa não tem a menor condição de passar – quer ampla, que dê jeito na estagnação brasileira. E é por isso que não é a bala de prata de que fala a ministra Tebet. Nesse sentido, se não houver esforço conjugado, a partir de um reconhecimento de que o estado é obeso e que precisamos fazer dieta nesse ente estatal, que além de obeso é improdutivo, não há como sair da estagnação. A cada real que o setor privado recolhe ao ente público, seja municipal, estadual ou muito pior, se for Brasília, ele perde potência produtiva. Esse real que ficaria na sua mão, Marcílio, ou na mão de um empresário, teria alocações muito mais bem boladas e eficientes no plano econômico, do que tirar esse real do Marcílio ou do empresário e enviar para Belo Horizonte ou enviar para Brasília, para ele passear lá e eventualmente voltar para Lavras, para Tiradentes, para onde quer que a gente faça esse recolhimento. E quando ele volta a isso é uma percepção que fica próxima da realidade, ele está valendo 70, 60 centavos. Somos três níveis de governo – União, estados e municípios – enquanto noutros países os níveis de governo com competência para tributar são apenas um ou dois. Isso implica os níveis de baixo receberem “fundos de participação” nos tributos de cima. Os tributos perdem potência fiscal. E aumenta a dependência de cada nível de governo. Todos de pires na mão, esperando verbas partilhadas, em geral de Brasília, onde tudo é centralizado.

Do ponto de vista das empresas, o que isso representa? 
Temos contribuições agressivas sobre a receita bruta das empresas sem perguntar se elas estão vendendo bem ou não, se elas estão lucrando no processo produtivo ou não, ou ao menos perguntar se elas estão realizando a transação completa para então enfiar o sistema PIS/Cofins, que são contribuições que atingem a receita e que, portanto, vem em cascata com outros tributos, Como se costuma dizer no jargão tributário, ela vem calculando por dentro e a taxação já inclui o imposto. Recentemente, o STF, ainda que tardiamente, decidiu que o ICMS não constitui essa base impositiva, mas temos essas contribuições há quantas décadas, há quantas décadas essa esperteza está montada. Então, essa é uma das espertezas que caracteriza o sistema atual e agora até em boa hora essas propostas que estão aí estão falando em calcular a tributação como deve ser, por fora, ou seja, cada uma utilizando o custo aquisitivo dos produtos, livre da própria tributação. Mas isso, obviamente vai engordar a alíquota que será necessária para equilibrar, coisa que provavelmente eles calcularam mal. Os puxadinhos tributários criam um outro problema gravíssimo para a cidadania, que é a impossibilidade de qualquer contador orientar econômica e financeiramente os clientes sobre, de forma transparente, o estado de saúde do seu empreendimento, porque teria que conhecer as milhares de legislações que incidem sobre o ato de produzir. Os contadores se tornaram agentes fiscais da Receita sem serem contratados.

A alíquota única não vai diminuir a complexidade?
A alíquota única de que tratam as PECs 45 e 110, de única não tem nada. Esse é um aspecto pouco visualizado. Porque na ânsia de estabelecer uma concordância de entes federados em uma proposta que realmente, no fim ela é um Frankenstein, ela edulcorou, tratando de fazer essa alíquota única, digamos que seja 25% (que não será), ser dividida em três parcelas, que serão a parcela federal, a estadual e a municipal, já que os três entes vão concorrer na exploração e é exploração mesmo, do imposto de consumo, sendo que está calculada participação de 14 pontos para os estados, 9 pontos em 25 para a União e 2 pontos para as municipalidades. Essa seria a partilha e já se sabe no nível estadual e no nível municipal, que os principais estados e os principais municípios não terão capacidade nas suas máquinas públicas com essas participações. Então, as PECs oficiais, vamos chamar assim, propõe que cada estado e município tenha liberdade de fazer o ajuste que seja necessário. Olha só, nesse momento, Lavras vai colocar 2,5% e o Zema, que está apertado, com déficit crônico, vai botar 14,7 e a União vai ficar com os 9 pontos. Portanto, tem oneração de 0,7 do Zema e 0,5 de Lavras, o que dá 1,2 de oneração, e portanto, a alíquota única de 25%, em Lavras já vai ser de 26,2% incidindo sobre todos os produtos consumidos lá. É óbvio que as unidades federadas mais poderosas vão ter mais condição de impor esse ônus do que eventualmente Lavras. Minas Gerais como um todo vai ter 0,7 a mais com 25,7%, salvo o que cada município vai colocar a mais. Então, vamos ter que consultar um almanaque, porque haverá 5.570, que é o número de municípios, e vou ter que consultar. Portanto, com toda simplicidade com que se vende a alíquota única, ela não existe. Não há possibilidade. Você imagina o grau de confusão que vai se instalar na hora em que esse sistema novo entrar em operação ao lado do sistema velho que vai continuar vivinho, o ISS, o ICMS, apenas com um conselhão, onde centenas de pessoas vão deliberar as condições que esse novo IBS vai se “harmonizar” com os demais tributos que vão continuar vivos durante longo período. É óbvio que em vez de reduzir esse problemão, que é o grande manicômio (tributário) que se instalou a partir dos anhos 1980, vamos agravar.





Como o senhor avalia a proposta do cashback tributário?
Aqui a esperteza tem nome, chama-se população de baixa renda, que é quem, relativamente, paga mais tributo, porque em vez de nos especializarmos em ter tributação sobre a renda e secundariamente sobre a propriedade, que são as chamadas tributações diretas, nos especializamos em nos enfiar na relação produtiva e do consumo, produtiva porque não citamos ainda o famigerado IPI, mas ele é de todos o imposto mais sem vergonha, porque aí nem pergunta se houve receita, basta que haja o ato da transformação industrial, o fato em si gerador do tributo é a industrialização. Ela tem que vir regressivamente, quer dizer, indo do mais forte em cima de quem menos pode e a mais recente manifestação nas propostas oficiais é pintar esse santo do pau oco de cashback, que é utilizar um termo de promoção comercial que de fato no supermercado no shopping ele é um cupom de desconto, para ser um arremedo de desconto, porque na realidade pretendesse elevar brutalmente a taxação, sobre a cesta de consumo da população mais pobre e depois identificá-la se possível dando a devolução que é o cashback. Uma vez instalada essa monstruosidade, ela vira um objeto feroz de manipulação política. Qualquer candidato a presidente ou a governador que ouse discutir, debater a moralidade do cashback vai ser alcunhado como sendo sujeito malvado que quer tirar benefício da população e que de fato ela vai estar ainda mais assediada de tributos

Mas vai se criar distorção, porque o imposto sobre o consumo, ao contrário de hoje, não será o mesmo para todos os cidadãos. A partir do cashback há essa distorção?
Todo mundo que não estiver no CAD Único já é considerado rico e vai ter a alíquota muito onerada. É uma proposta diabólica, pintada de pau oco, porque bota uma bondade escrita em inglês ainda por cima. Mas as pessoas vão gostar, na hora que eles receberem o dinheirinho que já terá sido tirado delas, porque o governo não vai dar dinheiro para ninguém, assim como não dá o auxílio sem tirar alguém. Não existe governo grátis. A gente quer dar um caráter racional, mas de racional não tem nada. É racional para quem tira proveito desse processo

O governo fala em um período de transição para acomodação do imposto novo com o imposto velho. Não há risco de haver bitributação?
Claro. O país vai sofrer muito, porque vai aumentar o nível de litígio, que já é disparado o maior do mundo na área fiscal. A meu ver estamos muito próximos a uma situação insurrecional. Eu que nunca acreditei numa inssurreição popular, não com esses artifícios todos de manipulação, começo a perceber os primeiros elementos de uma futura insurreição, porque vai se tornar absolutamente inaceitável, intolerável e as pessoas vão para as ruas. Eu não acredito que a racionalidade vá prevalecer, porque o Congresso, instado a entregar essa bala de prata, ou de festim, para o governo federal, porque ele precisa dizer que realizou algo, assim como o anterior realizou a pior reforma da Previdência de todos os tempos, que ainda hoje se comemora no alto escalão da sociedade brasileira como providência quase divina e na realidade acabou de esculhambar o sistema do INSS. Cada governo quando entra, precisa fazer uma mágica. Há grande interesse em realizar ilusionismo nesse início de governo e o brasileiro depois pagará gravissimamente pelos buracos deixados por uma reforma mal concebida, porque ela não atende ao interesse básico que é o cidadão que está ali pagando. E essa reforma tributária não é reforma, na realidade, é mais uma arrumação. Quando as pessoas perceberem que o número de tributos aumentou em vez de diminuir nós temos o primeiro elemento básico para uma fagulha insurrecional para uma revolta popular.

Do ponto de vista da carga total, a proposta de reforma tem uma neutralidade, sai de 32% de carga tributária e fica perto de 30% com a proposta do Bernardo Appy, mas estamos muito acima dos EUA e abaixo da média da OCDE? Pretende-se manter uma carga constante?
Não há isso porque ao mexer numa parte importante que é a tributação do consumo, deixando outras partes, como variáveis de ajuste, a tendência é haver uma escalada nessas variáveis de ajuste. O governo e o ministro Haddad já deu sinais disso e disse que embora sem elevar a carga ele vai correr atrás de quem não tá pagando. Isso, em princípio seria legítimo, mas desde que ele estivesse saindo fora da tributação do consumo, onde ele será 9 em 25. Na nossa proposta do Instituto Atlântico, a gente prevê que no ponto zero, aonde a União estiver, ela deve sim buscar quem ainda não paga tributos sobre a renda exonerando a participação da União nessa infernal tributação do consumo. E é menos porque estados e municípios são coitadinhos, mas porque são muitos. Eu não posso deixar uma obrigação legal de muitos se reunirem para reduzir ou desonerar, mas tenho esse truque. A União invadiu a competência do consumo para se servir, então, deveria ter a obrigação de aumentar sim a tributação progressiva desde que diminuísse a tributação do consumo. Esse é o movimento política e moralmente correto. Porque o país que é hoje infernalmente tributador de consumo pode começar a ajustar, ainda que gradualmente, na direção pelo menos da OCDE, se não for na direção dos EUA, porque muito mais, nesse sentido, socialista do que nós, curiosamente. A grande base dele é a tributação da renda. Não é perfeito, mas ele é muito mais sério, muito mais progressivo do que o que fazemos aqui. A menos que alguém introduza esse destaque, não vai haver obrigação de ajuste da União para a carga tributária neutra.

O senhor é essa proposta do Atlântico?
É cumprir a lei, coisa que no Brasil não se cumprem certos dispositivos legais porque não interessa. Existe lá um conselho de Gestão Fiscal, determinado no Artigo 67 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que é a lei mais citada, está sobrevivendo ao fim do teto de gastos e é respeitada até pelo PT. Então, na lei, constitui-se o Conselho de Gestão Fiscal com a participação dos três níveis de governo, para estabelecer toda a conduta fiscal, seria o equivalente na área fiscal ao Conselho Monetária Nacional, que é o órgão máximo na área monetária. Cadê o conselho de gestão fiscal? Não existe. Nunca se conseguiu chegar ao fim da sua regulamentação no Congresso Nacional. Então, a proposta do Atlântico, que fez um substitutivo e o ex-senador Paulo Bauer (SC), conseguiu, inclusive com o voto da Simone Tebet, na votação do substitutivo de 64 a 0. Ou seja, houve um momento em que as pessoas pareciam determinadas a fazer esse conselho aparecer, no início de 2013 e 2014 e até hoje, tem 10 anos isso. E acabamos batendo na trave. O Conselho de Gestão Fiscal seria encarregado, por esse substitutivo, se incluía um dispositivo com um teto, não de gastos, mas um teto de tributação, um teto de carga. Com a crítica que poderia prevalecer que um teto de carga acaba virando o mínimo, porque ninguém opera muito abaixo do teto e se poderia trazer esse teto e eu falo realisticamente para 33%. Muita gente critica e diz que tinha que ser 28%, mas isso exigiria dietas que o paciente talvez não queira fazer. Então, realisticamente, cravar em 33% bem calculados pelo Conselho de Gestão Fiscal, que seria limite máximo. Existe uma explicação, eu não quero adentrar muito, mas é 33%, mas a nossa carga já não é 33%? Mas a gente tem déficit primário de cerca de quase 2% do PIB. Teríamos que fechar pelo menos esse déficit primário. Então, teríamos, hoje, 33% de carga e mais 2 de déficit, e estaríamos em 35%. Na realidade, se tivesse um país fiscalmente equilibrado e com a carga em 33%, ela teria que ser 33% sem déficit e aí seria um país bem mais azeitado para o crescimento. O que está lá na proposta do Instituto Atlântico é trazer da faixa, incluindo o déficit primário, de 35%, 36% gradualmente para um nível abaixo de 33%, sempre inferior de 33%, nunca acima. Aí, sim você começa a ter um esforço de dieta dos entes estatais.





O governo fala que essa proposta vai garantir crescimento econômico. Haverá condições para esse crescimento?
Pesquisadores da UFMG fizeram o trabalho, uma matriz enorme com milhares de equações, só que o que eles testaram não foi a PEC 45, está mais para a proposta do Instituto Atlântico, porque na PEC 45 o salto do velho para o novo ocorre com transição muito demorada e os dois sistemas funcionando junto e não atende à condição básica que eles na UFMG usaram, que é o que se chama na economia de estática comparativa. Pego um período zero, pego o período um, não tem transição, ela é uma coisa imediata e comparo um com zero, duas fotografias, não é filme. E o filme é feio no caso das PECs, porque tenho transição que aumenta a confusão, o número de litígios vai aumentar, as dúvidas, a bagunça geral e aí lá no final, já me perdi e um presidente vai dizer, esquece, vamos voltar lá para o sistema antigo. Temos desapontamento. O crescimento previsto pelos pesquisadores da UFMG não é a PEC 45, é a proposta do Atlântico, que diz: no dia 1º de janeiro, estou com o sistema novo. Aí, é possível fazer essa conta. O que os pesquisadores disseram é que a partir do ponto zero, com tudo novo, se chega a um crescimento anual de quase 1%, mas isso não é a PEC 45. O governo diz que vai desonerar os investimentos, e isso o Atlântico propõe também, mas só essa desoneração já carrega esse crescimento quase todo. Ou seja, no caso da PEC 45, é depois disso, mas não por causa disso. Mas para isso não precisa mexer nos impostos do consumo, basta desonerar os investimentos. O que é uma ideia ótima. O que eles provam não provem da PEC 45?

Fala-se num segundo momento em fazer uma alteração na tributação da renda. Com o período de transição entre o imposto velho e o imposto novo sobre o consumo vai haver condição para fazer uma alteração no imposto sobre a renda.
Muito dificilmente será uma reforma do Imposto de Renda, vai ser na realidade escalada tributária, mais uma, sobre a renda, porque a variável de ajuste nessa proposta e isso é outro elemento que está escondido. É que o governo federal garantiria a recuperação do valor real das receitas fiscais de cada município e de cada estado. O que significa o seguinte, em vez de ter um teto de gastos nós teríamos na realidade um piso de receita garantido. Isso é uma proposta que é impossível de passar, mas ela é a garantidora.

Mais isso estados e municípios querem.
Porque o Zema, que está batendo palma para a reforma.... Nós trabalhamos na proposta do Atlântico a garantia da arrecadação nominal, porque isso dá para bancar. Porque a gente sabe que muito dificilmente algum estado ou município não vai ter em dois ou três anos à frente a reprodução, nem em reais correntes. do que ele arrecadou três anos atrás, a não ser que tivesse outra pandemia. Mas em uma situação normal a gente daria o mínimo de conforto para não ser utilizado e o resto é o que der, porque os entes tributantes tem que correr atrás da tributação. Mas não, a proposta dessas PECs ela é aduladora de autoridades: vem cá que eu vou te dar garantia real. De onde vai sair essa garantia real, das duas uma ou vão ficar devendo, como nunca entregaram os créditos de exportação.






Corre-se de ter o mesmo problema da Lei Kandir do ponto de vista da compensação dos tributos?
Claro, ela já está articulada para acontecer, quer dizer o pior aspecto da Lei Kandir, por que a Lei Kandir é boa.

Mas e do ponto de vista do ressarcimento dos estados exportadores? Não são nem dos estados, são das empresas que estão nos estados exportadores. Então, é uma catástrofe, mas é uma coisa que ficou para discutir depois. Ninguém fala nisso. Nós estamos acabando de fechar o arcabouço fiscal e a ministra do plano fala numa bala de prata tributária. Duvido que ela tenha feito a conta de quantos estados e municípios vai ter que socorrer Agora, pergunto, essa garantia real é só sobre a tributação nova enquanto a velha estiver sendo ainda vigente ou sobre toda tributação. Imagina a conta?

Mas essas propostas já vem sendo discutidas na Câmara dos Deputados e no Senado há mais tempo.
Não querendo dizer que os parlamentares tratam com relativa superficialidade os temas, eu diria que o foco deles é outro. O foco deles é saber e chegou numa composição. Isso é até plausível porque não existe Parlamento, não existe Assembleia sem composição. Só que nós temos que ter em cada proposta um ente propositor, que não temos de fato. Alguém que brigue e que seja o representante da proposta que saiu de uma base técnica consolidada. E não temos. Por isso é que pode qualquer coisa. E já estão se pronunciando a favor de exceções. Então, vários setores já começam a dizer, “não, para esse tributo eu gostaria de ter essa alíquota. O Instituto Atlântico, na proposta que fez, voltando ao tributo de consumo, uma proposta mais realista. Ninguém mexe em alíquota a não ser o Senado, que vai estabelecer se você está na alíquota 1, 2, 3. 4 e 5, sendo que a 3 é a predominante a alíquota padrão. As alíquotas seriam 8%, 18%, 29%, 36% e 46%. Mais ou menos qual a probabilidade de mudar muito de padrão; praticamente zero. Porque um dos aspectos operacionais de uma reforma que seja só simplificadora é que ela não vai tentar melhorar nenhum segmento a não ser por trazer todas essas alíquotas reduzidas ou majoradas para um pouco abaixo do que era antes. A gente consegue dar sempre um pouquinho de tributação a menos, quer para a cesta básica, quer para joias, quer para bebidas e todo mundo ganha um pouco, que é diferente da proposta que eu jogo bebidas, automóveis, joias para baixo, que nem é tanto porque não se pode dizer que 25%, 29% sejam alíquota baixa, continua sendo alta, mesmo para esses produtos suntuários, mas eu pego tudo que está abaixo de 25%, ou 29%, inclusive escolas, serviços e jogo para 25%, mas eu vou dar exceção. Quanto mais exceção eu fizer, mais estarei indo para a proposta do Atlântico. Então, seria mais prudente que eles já adotassem como proposta de cinco alíquotas fixas e imutáveis. Ninguém vai se sentir muito prejudicado.





Qual o risco de essa proposta de reforma tributária aumentar a informalidade, a evasão fiscal?
Não é uma ameaça é uma certeza. Porque você vai sem vantagem pra fiscalização, vai juntar todos os fatos tributários num único lançamento. Em vez de ter 18% de ICMS, mais 5% de ISS, mais a beirada do governo federal, tudo junto e você vai cobrar 30%. Já vejo, principalmente os prestadores de serviço preguntando: “Com nota ou sem nota?”. Isso já acontece hoje. Você pode minorar esse problema é que na nossa proposta a origem da transação fica com 4 pontos percentuais, nós quebramos esse conceito de que não pode ter tributação na origem. Qual a vantagem, o ISS hoje é 5 e os municípios vão ter que ceder um.