O esquema de inserção de dados falsos no sistema do Ministério da Saúde para emissão de certificados de vacinação contra a COVID-19 ganha um novo capítulo. De acordo com uma reportagem do UOL, o ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) também teria feito registros falsos de vacinação em Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro, para as suas três filhas, no dia 15 de dezembro de 2022. Até o momento, apenas duas cidades estavam envolvidas no caso: Cabeceiras (GO) e Duque de Caxias (RJ).
De acordo com o secretário de saúde de Campos dos Goytacazes, Paulo Hirano, ele tomou conhecimento do suposto fraude ainda no ano passado e determinou que os dados não fossem registrados. Conforme informou ao UOL, a prefeitura da cidade não foi procurada pela Polícia Federal (PF), nem abriu apuração interna.
Conforme a reportagem, foram registrados sete doses de vacina nas três filhas de Cid.
O UOL identificou os registros de vacinas em Campos de Goytacazes na base de dados de vacinação do Ministério da Saúde.
Segundo os registros, as doses teriam sido aplicadas na Secretaria Municipal de Saúde de Campos dos Goytacazes, em datas muito anteriores ao dia do registro: 06/08/2021, 06/12/2021, 12/07/2022 e 06/12/2022.
Além disso, na hora de registrar os dados no sistema, houve alguns erros no procedimento. A filha do meio de Cid teria recebido duas vezes a primeira dose, em 06/12/2021 e 06/12/2022. Enquanto a filha mais velha teria recebido só a segunda dose e a dose de reforço, sem ter recebido a primeira dose.
Conforme a apuração, no dia seguinte do registro das doses aplicadas - 15 de dezembro de 2022 -, todas as setes doses foram deletadas dos sistemas do Ministério da Saúde. No entanto, o banco de dados de vacinação não apaga os dados totalmente, apenas inclui uma marcação para informar que aqueles registros devem ser desconsiderados.
Essa marcação que permitiu a Polícia Federal identificar os registros do ex-presidente Jair Bolsonaro e sua filha Laura que foram deletados.
Registros em Duque de Caxias
Já no dia 17 de dezembro, as filhas de Cid tiveram registro de vacinação cadastradas em Duque de Caxias - dados estes que não foram apagados. Quatro dias depois, duas delas embarcaram para os Estados Unidos.
Foi no dia 21 de dezembro que os dados falsos do ex-presidente Jair Bolsonaro e sua filha Laura foram incluídos em Duque de Caxias. Estes foram apagados no dia 28, dois dias antes de eles partirem para os Estados Unidos.
Mauro Cid é apontado como o responsável pela inserção de dados falsos nos sistemas do Ministério da Saúde. Nessa sexta-feira (19/5), em depoimento à PF, a mulher de Mauro Cid, Gabriela Cid, admitiu o uso dos cartões de vacina falsa, mas afirmou que a responsabilidade pela falsificação é de Mauro Cid.
Ela contou a corporação que Cid fraudou os cartões de imunização contra a COVID-19 para ele e familiares, além do ex-presidente Jair Bolsonaro e a filha. O objetivo era ingressar nos Estados Unidos com os documentos falsos.
Secretário de Campos sabia dos registros falsos, mas não sabia de quem era
Paulo Hirano disse ao UOL que houve tentativa de registrar as vacinas, mas houve "inconsistências nos lotes". Com isso, o caso foi levado ao seu gabinete.
Ele afirmou que determinou que os dados não fossem registrados, no entanto, os registros foram detectados pela reportagem. O secretário municipal de saúde nega conhecer a situação.
"Quando chegou ao nosso conhecimento no gabinete, mandamos suspender. [Eu disse:] não lança nada disso, tá inconsistente, então não lança. Não lembro qual era a inconsistência. Acho que foi com o lote [da vacina]", afirmou o secretário municipal de saúde de Campos dos Goytacazes, Paulo Hirano.
Outra inconsistência nos dados
De acordo com os registros, a filha mais nova de Cid teria recebido a dose pediátrica da Pfizer para COVID-19 com 4 anos, em dezembro de 2021. O imunizante da Pfizer para crianças nessa faixa etária foi autorizado pelo Ministério da Saúde em setembro de 2022.
Conforme o secretário de saúde, na época não se sabia de quem eram os cartões de vacinas. Apenas esse ano, diante da operação em Duque de Caxias, a secretaria da saúde teria consultado o caso novamente e verificado que se tratava da família Cid, conforme ele.
Procurado pela reportagem, o advogado de Cid, Bernardo Fenalon, disse que somente se manifestará nos autos em respeito ao Supremo Tribunal Federal.
Dados falsos de vacinação
O esquema de inserção de dados falsos no sistema do Ministério da Saúde para emissão de certificados de vacinação contra a COVID-19 foi revelado pela Operação Venire, que teve como desdobramento a prisão de Cid em 3 de maio, por meio de determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na última terça-feira (16/5), em depoimento à PF, Bolsonaro disse não saber do suposto esquema de fraude e afirmou que Cid era o único responsável pela gestão de seu aplicativo ConectSUS.
O ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou, também na quinta-feira, que “pede a Deus” que Cid “não tenha errado” e que não tem conversado com o ex-ajudante de ordens.