Jornal Estado de Minas

Lula: Zelensky não apareceu para o encontro bilateral



Hiroshima, Japão - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse, ontem, que não se reuniu com Volodymyr Zelensky, porque o presidente ucraniano se atrasou para a reunião bilateral e depois não apareceu para o encontro com ele. “O fato é muito simples, tinha uma bilateral com a Ucrânia aqui neste salão. Nós esperamos e recebemos a informação de que eles tinham atrasado. Enquanto isso, eu recebi o presidente do Vietnã. Quando o presidente do Vietnã foi embora, a Ucrânia não apareceu. Certamente teve outro compromisso e não pôde vir aqui. Foi simplesmente isso o que aconteceu”, disse Lula.




 
O petista minimizou a ausência do encontro bilateral com Zelensky porque, segundo ele, os dois presidentes ouviram o discurso um do outro sobre o conflito entre a Ucrânia e a Rússia. “Eu ouvi atentamente o discurso do Zelensky no encontro. Ele certamente ouviu o meu discurso atentamente no encontro. E continuo com a mesma posição que eu estava antes”, afirmou Lula em entrevista coletiva após a participação na cúpula de líderes do G7, em Hiroshima.
 
No discurso que fez diante de Zelenski, Lula afirmou condenar a “violação da integridade territorial da Ucrânia” e repudiar “veementemente o uso da força como meio de resolver disputas”. Voltou a dizer que “os mecanismos multilaterais de prevenção e resolução de conflitos já não funcionam”, tema que já tinha abordado em discurso na véspera, e acrescentou que é preciso lembrar que as guerras hoje “vão muito além da Europa”, como no caso do Oriente Médio e do Haiti - uma alfinetada no protagonismo que o conflito entre Moscou e Kiev ganhou na agenda internacional.
 
Na entrevista coletiva de ontem, ele afirmou ainda que está disposto a ir à Ucrânia e à Rússia se reunir com os líderes dos países para tratar de solução para o conflito. Mas que pelo que ouviu do assessor para assuntos internacionais da Presidência, o ex-ministro das Relações Exteriores Celso Amorim, isso ainda não é possível. Ele  foi questionado sobre a tentativa de construir um plano de paz para a guerra. Lula afirmou que só é possível pensar em uma solução se Zelensky e Putin se mostrarem dispostos a conversar sobre o assunto.




 
 
Por volta das 19h de domingo no Japão (7h no Brasil), a equipe de Lula, que aguardava a chegada de Zelensky desde o início da tarde, informou aos jornalistas que o encontro entre os dois não aconteceria mais. Após a relutância inicial de Lula diante da solicitação feita por Zelensky, sua equipe disse ter oferecido mais de um horário para uma conversa na tarde do domingo. Daí a presença de jornalistas brasileiros - e de uma bandeira da Ucrânia na sala de reuniões do 22º andar do hotel Ana Crowne Plaza, onde Lula realizou a maior parte de suas reuniões bilaterais.
 
Questionado durante entrevista com a imprensa se estava desapontado por não ter encontrado o homólogo brasileiro, Zelensky alegou incompatibilidade de agendas. “Acho que isso o desapontou”. Disse ter encontrado “quase todo mundo, todos os dirigentes. Todos têm seus próprios horários, por isso não pudemos nos encontrar com o presidente brasileiro”, afirmou.
 
Na entrevista coletiva de ontem, Lula foi questionado sobre a declaração do presidente ucraniano de que Lula teria ficado “decepcionado” com a não realização da reunião bilateral. “Eu não fiquei decepcionado, eu fiquei chateado porque eu gostaria de encontrar com ele e discutir o assunto, por isso que eu marquei com ele aqui no hotel. Apenas isso. Veja, o Zelensky é maior de idade, ele sabe o que faz”, respondeu Lula.




 
Zelensky se encontrou apenas com o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi. O premiê afirmou que iria fazer “todo o possível” para buscar uma solução para a guerra - a Índia se tornou o maior comprador do petróleo russo após o início do conflito, minando os esforços da Otan, a aliança militar ocidental, para sufocar financeiramente o regime de Putin. Em encontro com Modi no sábado, Lula afirmou em suas redes sociais que Índia e Brasil estão “do lado da paz”.
 
Na coletiva, Lula foi questionado também sobre a tentativa de construir um plano de paz para a guerra. Ele ula afirmou que só é possível pensar em solução se Zelensky e Putin se mostrarem dispostos a conversar sobre o assunto. Lula disse ainda que não foi à cúpula do G7 para discutir a solução da guerra entre Ucrânia e Rússia e que não considera que o conflito deva ser discutido em outros grupos, como o G20. Segundo ele, o assunto deveria estar sendo discutido na Organização das Nações Unidas (ONU). Ele, inclusive, sugeriu a possibilidade de antecipação da Assembleia Geral da ONU, historicamente realizada em setembro, para julho em função da discussão sobre a guerra. O  presidente voltou a sugerir que pretende mobilizar países vistos como independentes no conflito para ajudar na mediação entre Zelensky e Putin.
 
Alinhamento com a Ucrânia
 
Hiroshima, Japã o- A presença do líder ucraniano Volodymyr Zelensky na cúpula do G7 teve um custo para seus aliados do Ocidente. Ele desembarcou em Hiroshima em uma chegada televisionada ao mesmo tempo em que o G7 divulgava seu comunicado final anti-China, principal objetivo das potências durante o encontro. No texto, os países-membros do grupo questionaram a “coerção econômica” da China e a militarização do Mar do Sul da China, afirmando não haver “fundamento jurídico” para as “reivindicações marítimas expansivas” do gigante asiático. Os signatários se dispuseram, por outro lado, a buscar “relações construtivas e estáveis” com Pequim.




 
Em entrevista coletiva neste domingo, o presidente americano Joe Biden disse que os países do G7 concordaram em relação à necessidade de diversificar cadeias de suprimentos para não depender da China. “Não queremos nos separar da China, queremos reduzir os riscos e diversificar nosso”, disse ele. A relação entre os dois países passa por um momento de tensão desde que os EUA derrubaram um balão chinês no início do ano, desencadeando uma crise diplomática -clima que deve melhorar em breve, segundo Biden.
 
O líder americano reafirmou seu alinhamento a Zelensky após reunião entre os dois neste domingo e disse que o Ocidente “não vai vacilar” diante da ofensiva russa na Ucrânia. “Putin não vai interromper nossa determinação, como acreditava que podia fazer”, afirmou. Os EUA são um dos países que lideram o apoio a Kiev por meio de envio de armas à Ucrânia e sanções contra a Rússia, e encontros como o do G7 em Hiroshima são normalmente usados por Zelensky para pedir mais munições para o campo de batalha -o que não foi diferente desta vez. Neste domingo, o líder afirmou que estava confiante de que Kiev receberia caças F-16 do Ocidente para ajudar a repelir a invasão russa.
 
A repórteres, Biden disse ser “altamente improvável” que os aviões sejam usados em qualquer ofensiva ucraniana nas próximas semanas, e afirmou ter recebido uma “garantia absoluta” do presidente ucraniano de que não empregaria os caças para entrar em território russo -algo de que a Rússia vem acusando a Ucrânia. O anfitrião Japão, por fim, queria envolver o Sul Global no encontro, intenção que ficou nítida com a lista de convidados. O objetivo vai ao encontro de uma pauta histórica da diplomacia brasileira: a reforma de organizações multilaterais.




 
Nas sessões da cúpula em que participou como convidado, Lula cobrou reformas na composição de instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Conselho de Segurança das ONU. A demanda parece finalmente estar encontrando eco entre as potências mundiais, embora não exatamente por uma motivação altruísta. As democracias ricas do mundo olham com desconfiança para a forte presença da China nos países em desenvolvimento, enquanto veem sua influência encolher. As economias do G7 representaram 29,9% do PIB global em 2023, abaixo dos 50,7% em 1980, de acordo com o FMI.
 
Afirmações contundentes sobre o assunto, porém, ficaram restritas a países que já defendiam tal agenda, como a Alemanha e o próprio Japão. “Qualquer ordem internacional em funcionamento deve refletir o caráter multipolar do mundo”, afirmou o primeiro-ministro alemão Olaf Scholz, já em Berlim. “O mundo uni ou bipolar de ontem pode ter sido mais fácil de moldar -pelo menos para os poderosos”, acrescentou. “Mas não é mais o mundo em que vivemos.”
 
Fumio Kishida, primeiro-ministro do Japão, disse que o papel de seu país é preencher a lacuna entre o G7 e o Sul Global em áreas como energia e segurança alimentar. Além disso, Tóquio anunciou o programa Overseas Security Aid, que fornecerá equipamento militar a países em desenvolvimento. 




 
Vietnã pode fazer 
acordo com Mercosul
 
Hiroshima, Japão - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se encontrou com o primeiro-ministro do Vietnã, Pham Minh Chính, na tarde de ontem, horário local, em reunião durante a cúpula do G7, em Hiroshima, no Japão. Lula ressaltou no encontro a intenção do Brasil de aprofundar a relação entre os dois países. O primeiro-ministro afirmou que, para ampliar suas relações comerciais com o Brasil, pode sugerir um acordo entre o Vietnã e Mercosul, que seria o primeiro de seu país um país da América do Sul. O presidente brasileiro sugeriu que o acordo seja feito quando o país assumir a presidência temporária do bloco sul-americano.
 
Os líderes também discutiram a ideia de aumentar a cooperação na área de Ciência e Tecnologia. Pham Minh Chinh concordou com Lula sobre a necessidade de reformar o Conselho de Segurança da ONU para permitir maior representatividade das várias regiões do mundo.
 
Lula também se encontrou no Japão com outro líder importante de um país emergente, o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi. Brasil e Índia não são “países neutros” na guerra entre Rússia e Ucrânia, mas sim países interessados na manutenção da paz no mundo. A declaração foi feita por Modi durante o encontro bilateral com o brasileiro. Modi falou ainda sobre o interesse em trabalhar com o Brasil em busca de uma solução pacífica para o conflito. Após o encontro, Lula twittou: “Estamos do lado da paz”.
 
O comércio entre os dois países também foi assunto da reunião. “Países da maior relevância para o desenho de uma nova geopolítica global”, afirmou Lula. As relações diplomáticas Brasil-Índia começaram em 1948. A Índia é o quinto maior parceiro comercial do Brasil. Em 2021, o comércio entre os dois países chegou ao maior resultado da história: US$ 15,1 bilhões. Nesse mesmo ano, o Brasil exportou mais de US$ 6 bilhões para a Índia e importou US$ 8,8 bilhões em produtos indianos.