A Controladoria-Geral da União (CGU) aponta em relatório um prejuízo de ao menos R$ 4,2 milhões aos cofres públicos em contratos para compra de kit robótica do município de Canapi, em Alagoas, custeados com emenda parlamentar do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL).
O órgão do governo federal analisou dois contratos com recursos de emendas para compra de kit robótica, material de apoio aos alunos e professores e capacitação de docentes.
No total, foram R$ 7,4 milhões repassados para a empresa Megalic pela cidade de Canapi, sendo R$ 5,7 milhões em 2022 - dinheiro proveniente da chamada emenda de relator indicada por Lira. O uso da emenda de Lira foi revelado pelo jornal O Globo.
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O relatório da CGU é utilizado pela Polícia Federal na operação Hefesto, que mira desvios nos contratos firmados pela Megalic, cujo sócio é aliado do presidente da Câmara.
A Folha de S. Paulo revelou as suspeitas de irregularidades na compra de kit robótica durante o governo Jair Bolsonaro (PL) em abril de 2022, o que deu origem às investigações da PF.
A reportagem da Folha de S. Paulo esteve na cidade alagoana em 2022 e mostrou que nenhuma das 35 escolas tem laboratório de ciências, por exemplo, e mais da metade não tem acesso à internet.
Coordenadora da escola, Rosiane Maria Silva da Paz contou para a reportagem que o anúncio do projeto de robótica empolgou os professores, por se tratar de uma novidade. Mas havia muitas outras prioridades.
"Sobre a questão da água, ter na torneira facilitaria mais, além de ter mais salas e manter a internet. A pintura também seria importante, estou com fé em Deus que sairá a reforma", disse Rosiane à época.
Ela estudou na mesma escola. "Ainda precisa reformar o pátio porque é de terra e a gente não deixa os meninos correrem no terreno, que tem muita pedra."
A CGU lista ao menos quatro problemas nas contratações da Megalic e sugere irregularidades nos processos para aquisição dos kits de robótica.
Segundo os técnicos da Controladoria, o que possibilitou o sobrepreço foram "irregularidades/impropriedades na realização das pesquisas de mercado, para estimar o valor da contratação e definir o teto máximo a ser desembolsado".
Houve ainda, diz a CGU, falta de planejamento nas compras, o que resultou na aquisição de um só tipo de kit em quantidade maior do que a necessária. Somente essa falha teria causado prejuízo de R$ 537 mil.
A disputa vencida pela Megalic, afirma um relatório da PF com base na CGU, foi direcionada uma vez que haviam especificações no edital que restringiram a competitividade.
Em nota assinada pelo advogado Eugênio Aragão, a defesa da Megalic afirma haver "grave equívoco" nas suspeitas e que todos os contratos se deram a partir de parâmetros técnicos do Ministério da Educação e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, com processo licitatório e ampla competitividade.
A nota diz que o Tribunal de Contas da União não viu direcionamento nem preços incompatíveis e que a reportagem da Folha de S. Paulo que deu origem à investigação fez comparação indevida dos produtos da Megalic com kits de qualidade inferior.
A Megalic e seus sócios estão no centro do caso dos kit robótica investigado pela Polícia Federal de Alagoas.
Lira não é investigado e diz que era a Mesa Diretora da Câmara a responsável pelo encaminhamento das emendas de relator. "Portanto, é equivocada a informação de que essas emendas foram destinadas pelo deputado Arthur Lira", diz nota divulgada pelo parlamentar.
A empresas, os sócios e o principal auxiliar de Lira, Luciano Cavalcante, foram alvos da operação no dia 1º de junho.
A PF analisou as transações financeiras da Megalic e chegou a uma série de empresas sediadas em Brasília e apontadas como de fachada. As firmas têm como sócios Pedro Magno e Juliana Cristina e pessoas ligadas a eles. O casal foi monitorado pela PF ao longo de 2022 e ainda neste ano.
A partir dos acompanhamentos, a PF diz ter descoberto que o casal pode ser operador "de considerável e amplo esquema de lavagem de capitais em vários estados da Federação, ocultando e dissimulando bens, direitos e valores provenientes de práticas delitivas cometidas por diversos núcleos criminosos, com ou sem conexão entre si."
Entre novembro de 2022 e janeiro de 2023, a polícia acompanhou e filmou ao menos uma dezena de idas do casal a agências bancárias e entregas de valores na capital federal, em cidades próximas e em Maceió --na capital alagoana, a entrega foi em janeiro deste ano.
Nesse episódio de janeiro, o casal de operadores foi flagrado indo até a casa do assessor de Lira e sua esposa, Glaucia Cavalcante, dirigindo o veículo utilizado para entregas de valores.
A mesma picape monitorada em Maceió, de acordo com apuração da Folha de S.Paulo, foi utilizada por Lira e declarado ao Tribunal Superior Eleitoral na campanha de 2022, quando o deputado foi reeleito.