Depois de entendimento sobre o texto da proposta que dá subsídio às empresas de ônibus da cidade, a Câmara Municipal e a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) voltaram a protagonizar embates justamente nesta sexta-feira (23/6), dia de votação do Projeto de Lei (PL) 538/2023, que trata do repasse de R$ 512 milhões às concessionárias. Com texto original do Executivo, a redação passou por diversas alterações até ser aprovada no Legislativo, em sessão marcada por pleitos paralelos que evidenciaram o desacerto entre os poderes na capital mineira. No centro da discussão está o bolso dos passageiros de ônibus de BH, que pode ter alívio com o retorno da tarifa a R$ 4,50.
O PL do subsídio foi aprovado por larga margem no plenário, mas emendas votadas em destaque marcaram o colapso da bancada governista na Câmara. Também na mesma sessão, os vereadores aprovaram um Projeto de Resolução que confere ao Legislativo poder de reduzir o valor da passagem de ônibus na capital sem depender da sanção do prefeito Fuad Noman (PSD), medida comemorada na casa.
A primeira pauta na manhã de sexta foi o PL 538/2023, que terminou aprovado em 2º turno. O projeto prevê o pagamento de R$ 512 milhões em subsídio às empresas de ônibus e apresenta contrapartidas ao repasse da verba como a redução da passagem para R$ 4,50 e exigências na qualidade do transporte.
O projeto foi aprovado por 37 vereadores ante 3 votos contrários, de Fernanda Pereira Altoé, Braulio Lara e Marcela Trópia, todos da bancada do Partido Novo. No 1º turno, o placar no plenário foi de 38 a 2. A proposta agora vai à Comissão de Legislação e Justiça (CLJ) da Câmara para a redação do texto final. Uma vez pronto, o documento é enviado à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) para sanção.
O texto original do PL é de autoria do prefeito Fuad Noman (PSD), que deve receber sua proposta bastante modificada na próxima semana. Mais de 50 emendas foram adicionadas ao projeto pelos vereadores durante a tramitação na Câmara e a versão final ainda deverá ser avaliada por uma equipe técnica da prefeitura antes da decisão por uma sanção total ou parcial da nova redação.
A própria redução da passagem a R$ 4,50, valor praticado antes do reajuste válido desde 23 de abril, não constava no texto original e foi incluída após acordo entre Câmara e prefeitura. Uma série de contrapartidas de qualidade do serviço oferecido no transporte também estão entre as emendas.
O PL do subsídio foi enviado à Câmara no início de abril e foi recebido com críticas por não exigir contrapartidas das empresas diante do pagamento de subsídio. O projeto ficou travado no Legislativo até o reajuste tarifário, quando o presidente da Câmara, Gabriel Azevedo (sem partido), e o prefeito Fuad Noman iniciaram uma série de reuniões para discutir alterações no texto e iniciar a tramitação no Legislativo.
No fim de maio, Fuad e Gabriel chegaram a um acordo sobre a relação entre o valor do subsídio e o preço final das passagens. Também entraram na conta uma série de contrapartidas exigidas das empresas como a tarifa zero para vilas e favelas; passe livre para estudantes e pessoas em tratamento de saúde; auxílio- transporte para famílias em situação de vulnerabilidade extrema e mulheres vítimas de violência; e um aumento de 10% no total de viagens realizadas.
Diante do acordo, o PL 538/2023 passou a tramitar de forma acelerada na Câmara, avaliada de forma conjunta nas comissões e votada em plenário em sessões extraordinárias.
Transporte suplementar
A disputa entre Legislativo e Executivo passou a pautar o plenário a partir da votação de emendas destacadas do PL 538/2023. Adições ao texto que tratam sobre o transporte suplementar na capital tiveram sua votação marcada pelo colapso da bancada ligada à prefeitura.
Com presença massiva de representantes do transporte suplementar nas galerias, os vereadores deram vitória a emendas que garantem aos ônibus dessa categoria, os micro-ônibus amarelos que circulam nos bairros, 10% do subsídio de R$ 512 milhões concedido às concessionárias da cidade. Outras emendas aprovadas ainda tratam sobre a circulação em áreas centrais da cidade e direito à publicidade nos veículos.
As emendas foram aprovadas por 37 a 3, um placar surpreendente diante da orientação do Executivo para que a bancada do governo votasse contra o texto. Apenas os parlamentares do PDT, Miltinho CGE, Wagner Ferreira e Bruno Miranda, líder do grupo na Câmara, votaram contra.
À reportagem, Bruno Miranda disse que a orientação da prefeitura era de voto contrário às emendas destacadas pois há negociações em aberto entre o Executivo e as empresas de transporte suplementar. Ele acredita que há chance de veto para os pontos específicos sobre o tema pelo prefeito.
“Existe uma mesa de negociação com os suplementares, alguns avanços já foram incluídos nesse projeto , mas outros ainda estão em processo, inclusive de formatação de Projeto de Lei. Por isso, a orientação do governo era contrária em relação aos destaques. Agora a prefeitura vai analisar, não tenho como falar se planejam vetar, mas imagino que sim porque se a orientação era votar contra, é possível que o veto seja o próximo passo”, disse.
Autor das emendas, o vereador Irlan Melo comemorou o resultado no plenário. Eram necessários 28 votos para a aprovação e os votos favoráveis chegaram a marca de 37. Para derrubar um eventual veto do prefeito Fuad Noman (PSD) são precisos os mesmos 28 votos, o que anima o parlamentar.
“Estamos estabelecendo um percentual porque nós entendemos que o suplementar equivale a 10% do transporte municipal, então nada mais justo que receber esses 10%. tivemos 37 vereadores votando a favor do projeto, se desses, ao menos 28 tiverem coerência, nós vamos derrubar qualquer veto”, afirmou.
Nos bastidores, a expectativa na bancada da prefeitura é que a ampla adesão ao projeto não volte a se repetir para derrubar um veto. Diante de uma decisão do prefeito, os parlamentares esperam que a marca de 28 votos não seja alcançada.
Projeto de resolução
A última pauta da sessão extraordinária fechou a manhã exacerbando a tensão entre os vereadores e a prefeitura. Foi aprovado o Projeto de Resolução 579/2023, que susta os efeitos da portaria da prefeitura que aumentou o preço da passagem de ônibus na capital. A medida permite que o Legislativo tome a decisão sem a necessidade de uma sanção do Executivo.
Assim como no caso do PL do subsídio, o Projeto de Resolução também deve passar pela Comissão de Legislação e Justiça (CLJ) para a elaboração do texto final. Depois desse estágio, Gabriel Azevedo fica com o documento em mãos e pronto para publicação.
O Projeto de Resolução é uma carta na manga da Câmara para pressionar a prefeitura a aprovar rapidamente o PL do subsídio. O texto final, com mais de 50 emendas adicionadas pelos vereadores, ainda passará pelo crivo de uma equipe técnica da prefeitura, que pode vetar adições específicas à proposta.
Em entrevista após a votação desta sexta, o Gabriel Azevedo disse que espera que a CLJ entregue a redação final do PL do subsídio à prefeitura na próxima terça (27/6) e que o Executivo sancione o projeto na mesma semana. O vereador afirmou que, em caso de demora na aprovação, ele poderá publicar o Projeto de Resolução para abaixar a passagem sem intermédio da prefeitura.
“Esse projeto de lei vai na próxima terça-feira para Comissão de Legislação e Justiça para um procedimento breve, a redação final. O texto fica integralizado e vai para a mesa do prefeito já na semana que vem. Assim que o prefeito sancionar, a passagem volta para catraca a R$ 4,50. Se ele não for rápido com isso, quero lembrar que hoje nós aprovamos o Projeto de Resolução desta casa que cabe apenas a mim publicar no Diário Oficial”, disse.
O Projeto de Resolução 579/2023 foi aprovado por 39 a 0 na Câmara e tratado como a vitória de um instrumento de barganha na negociação sobre a tarifa com a prefeitura. A proposta tramita na casa desde que, no fim de abril, a passagem aumentou 33,3% em BH, saindo de R$ 4,50 para R$ 6.
A medida, desde que levantada, é tratada como uma alternativa ao PL do subsídio para revogar o aumento na tarifa. Vale destacar que, diferente do Projeto de Lei, o Projeto de Resolução reduz o valor da passagem sem exigir contrapartidas das empresas.
A reportagem procurou a prefeitura, que não se manifestou oficialmente sobre as aprovações do PL do subsídio e do projeto de resolução. A administração municipal informa que receberá o projeto de lei na próxima semana e avaliará o texto dentro do prazo determinado para a sanção ou veto das propostas.
Datas chave na discussão do transporte em BH
- 21 de março - PBH encaminha mensagem à Câmara que resulta no PL 538/2023, a proposta de subsídio.
- 3 de abril - Sindicato das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH) aciona a Justiça por reajuste tarifário que aumentaria a passagem para R$ 6,90
- 19 de abril - Em audiência de conciliação no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), SetraBH e PBH entram em acordo para aumentar a passagem em 33,3%, com o valor chegando a R$ 6
- 23 de abril - passagem passa a custar R$ 6 em Belo Horizonte
- 18 de maio- após várias reuniões, Fuad Noman e Gabriel Azevedo chegam a acordo sobre a relação entre o valor do subsídio, o preço da passagem e as contrapartidas exigidas das empresas.
- 24 de abril- Projeto de Resolução para sustar decreto do reajuste tarifário é protocolado na Câmara
- 30 de maio- PL do subsídio começa a tramitar na Câmara e é aprovado na Comissão de Legislação e Justiça
- 13 de junho - PL do subsídio é aprovado em 1º turno
- 23 de junho - PL do subsídio é aprovado em 2º turno e Projeto de Resolução é aprovado em turno único