A Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) protocolou na tarde desta sexta-feira (23/6) a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar supostas irregularidades cometidas por duas empresas de ônibus da capital cujas linhas lideram o ranking de reclamações por parte dos usuários. O pedido de instauração da comissão aconteceu logo após aprovação do Projeto de Lei (PL) 538/2023, que trata do repasse de R$ 512 milhões às concessionárias que operam o transporte coletivo (veja mais abaixo).
O grupo também vai averiguar a suspeita de que umas das 40 empresas de ônibus de BH conta com proprietários laranjas e contrata motoristas inexperientes para operar os veículos que circulam na capital. De acordo com o signatário da CPI, vereador Gabriel Azevedo (sem partido), a concessionária que opera as linhas teria um capital social de R$ 1 mil, e que, formalmente, estaria no nome de duas pessoas da periferia de São Paulo.
A denúncia do suposto esquema já havia sido feita pelo parlamentar no início de abril. Na ocasião, Azevedo afirmou que a fraude consta nos relatórios do Ministério Público de Contas do Estado de Minas Gerais sobre o atual contrato entre as empresas de ônibus e a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH).
“Eu já adianto à imprensa que aqui está (nos processos do Ministério Público de Contas) o primeiro conjunto probatório que mostra que uma das empresas tem que ser posta para fora de imediato, a Viação Torres. Um conjunto probatório de uma empresa que faz chamamento de motoristas no WhatsApp, profissionais não contratados que não têm experiência de dirigir e que colocam a população de Belo Horizonte em risco” , disse o vereador em coletiva de imprensa no dia 5 de abril.
Na sequência ele segue elencando irregularidades na empresa. “Isso foi o que nós, pela manhã, conseguimos averiguar. Porque dois dos ditos proprietários da Viação Torres moram no meio de uma comunidade carente de São Paulo? Eu quero que os senhores conheçam toda essa documentação, todos os registros que vieram, porque pelo jeito duas pessoas que não tem condições nem de pagar a passagem de ônibus em Belo Horizonte durante mês são proprietárias de uma empresa de ônibus em Belo Horizonte (morando) lá em São Paulo. O nome disso é laranja”, afirmou.
Agora, com o protocolo das comissões na presidência da Câmara, passa a ser contado o prazo para que os líderes de blocos e bancadas partidárias indiquem ao presidente da Casa suas sugestões de integrantes para a CPI.
A reportagem procurou o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros para um posicionamento em relação a abertura da investigação, mas até a publicação desta matéria não obteve respostas.
Sistema precário
Um dos objetivos de investigação da CPI recém protocolada na Câmara dos Vereadores de Belo Horizonte, as reclamações das condições dos ônibus que operam no transporte público da capital se soma a uma extensa lista de ocorrências envolvendo os veículos e expõe a precariedade do serviço.
Desde o dia 11 de maio, o Estado de Minas noticiou 11 acidentes em que os personagens centrais foram ônibus de linhas que circulam por BH. Os números correspondem a praticamente uma ocorrência a cada três dias. Além disso, ao menos 40 pessoas ficaram feridas, e 15 veículos estiveram envolvidos.
Desde que os acidentes com ônibus passaram a fazer parte da rotina dos passageiros, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), por meio da BHTrans e da Guarda Municipal, começou a operação de fiscalização da situação dos veículos. Oito veículos, de diferentes linhas e empresas, foram apreendidos por estarem com pneus carecas, e um, por estar com a documentação irregular.
Os veículos que não estão em condições adequadas de operação são autuados e têm as autorizações de tráfego recolhidas. Em alguns casos, são removidos para o pátio do Detran. Eles só podem voltar a operar depois da comprovação de que as irregularidades foram sanadas.
Subsídio
Desde 23 de abril deste ano, a passagem dos ônibus de Belo Horizonte custa R$ 6, a mais cara do país. Em um de seus posicionamentos sobre os acidentes que aconteceram na cidade, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros afirmou que as empresas que participam dos consórcios associados estão colapsando, com as contas no vermelho.
Isso porque, conforme a entidade que responde pelos empresários, o valor da tarifa estava congelado em R$ 4,50 desde 2018. Segundo o Setra, esse é o motivo dos veículos estarem em más condições. “O reequilíbrio econômico-financeiro do sistema de transporte público municipal é essencial para que diversas ações de melhoria dos serviços sejam implementadas, possibilitando a recuperação da demanda e retomada dos investimentos na renovação da frota”.
No entanto, para que os usuários não fossem onerados com o aumento da passagem, o município propôs repassar o valor da diferença da tarifa, colocada pelas empresas como a ideal. Assim, mesmo com o congelamento da passagem, de julho de 2022 a abril deste ano, as empresas receberam um subsídio de R$ 243,4 milhões, valor que deveria suprir a carência das empresas.
Nesta sexta-feira, a Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) aprovou em 2º turno o Projeto de Lei 538/2023, que prevê o pagamento de outro subsídio às empresas de ônibus da cidade. Dessa vez, as concessionárias poderão receber R$ 512 milhões. A proposta aprovada pelos vereadores apresenta contrapartidas ao repasse da verba como a redução da passagem para R$ 4,50 e exigências na qualidade do transporte.
O projeto foi aprovado por 37 vereadores ante 3 votos contrários, de Fernanda Pereira Altoé, Braulio Lara e Marcela Trópia, todos da bancada do Partido Novo. A proposta agora vai à Comissão de Legislação e Justiça (CLJ) da Câmara para a redação do texto final. Uma vez pronto, o documento é enviado à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) para sanção.