Com o recesso parlamentar marcado para começar no dia 15 de julho, está e a próxima serão decisivas para o governo Lula aprovar seus projetos prioritários na Câmara dos Deputados. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já anunciou que haverá um esforço concentrado para votar os projetos de lei do Carf e do arcabouço fiscal. Lira também afirmou a intenção de votar a reforma tributária, mas a tendência é que o texto fique para a última semana antes do recesso. Na noite de ontem, Lira se reuniu com os lideres partidários para definir a pauta de votação para os próximos dias.
A tramitação desses projetos, bem como a medida provisória (MP) que retoma o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), de relatoria de Guilherme Boulos (Psol-SP), vão medir também o quanto avançou a articulação política do governo nas últimas semanas. Após o susto com a votação da medida provisória de reestruturação da Esplanada e com a revogação de decretos no marco do saneamento, o presidente Lula e os articuladores da base prometeram uma mudança total no trato com os parlamentares.
Na Câmara, onde o terreno para o governo é mais espinhoso, algumas reuniões foram feitas, e além de mais agilidade para liberar emendas parlamentares, os deputados cobraram do governo uma melhor comunicação sobre as agendas dos ministros, especialmente na entrega de programas e obras nos respectivos redutos eleitorais. Os parlamentares do centrão que deram votos ao governo cobravam maior prestígio. Uma das queixas é que nas entregas de projetos e obras, do governo, os chefes das pastas não convidavam deputados que deram votos ao Planato para estar no palanque nessas entregas, que muitas vezes, contava com a presença de governadores ou prefeitos que marcam oposição a Lula. No entanto, essa relação vem melhorando gradativamente.
Segundo o deputado federal Augusto Coutinho (Republicanos-PE), Lula conseguiu passar para os ministros que não só a Casa Civil e as Relações Institucionais devem entrar em campo e que a articulação apresentou melhoras. No entanto, ele alertou que Lula não deve inserir pautas ideológicas nas prioridades do governo, pois isso pode gerar retrocessos na boa relação que está sendo construída com o centrão.
“Eu acho que a relação melhorou, o presidente mostrou que precisa ter a contribuição dos ministros nessa relação com os parlamentares, não é só uma relação da Casa Civil e das Relações Institucionais. O (Alexandre) Padilha de fato é muito esforçado e tenta construir isso. Acho que melhorou, mas ele cometerá um grave erro se incorporar a agenda do PT com a agenda do governo. O que quero dizer, é que tem algumas agendas que são ideológicas, não são agendas importantes para o governo e para o país, muitas vezes por ministros ideológico”, disse o deputado.
Coutinho também disse que o governo deve conseguir aprovar as medidas planejadas para o esforço concentrado na semana que vem: o Carf e o arcabouço fiscal. Sobre a Reforma Tributária, o parlamentar acredita que ainda possui muitas dúvidas sobre o texto, e deve ficar para a última semana, ou até mesmo para depois do recesso parlamentar, que começa no próximo dia 15 de julho.
Balanço No meio da última semana, o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), fez um balanço da atuação do governo na Câmara no primeiro semestre. O petista admitiu algumas dificuldades e afirmou que se a MP da Esplanada não fosse votada, o governo estaria “um caos” e também citou que a revogação do decreto de Lula ao marco do saneamento foram derrotas da base.
No mais, o Guimarães disse que a situação estava controlada e que o governo votaria nessa semana o projeto de lei do Carf, do arcabouço fiscal, e tentaria ainda apreciar a reforma tributária, se não nos primeiros dias de julho, na semana seguinte. O líder fez um discurso dando a entender de que os problemas haviam sido contornados e apesar da indefinição sobre a votação de alguns projetos, especialmente a MP da Esplanada, o governo conseguiu os votos esperados e aprovações com boa margem de vantagem.
“Foram as duas discussões nas quais tivemos problemas aqui dentro. Evidentemente há matérias, sobretudo nas questões econômicas e sociais, que têm um quórum maior. O União Brasil tem dado 38 a 40 votos em todas as votações. O Republicanos, com exceção do destaque que acabou com o teto de gastos, tem 39 votos. O MDB, 35 votos. E o PL, nas duas principais votações que tivemos, a bancada contribuiu com 29 votos em uma e na outra com 30 votos, precisamos reconhecer isso também”, disse Guimarães.
Emendas Apesar da melhora nesse trato com a Câmara, a relação e comunicação com os aliados que o governo quer firmar ainda possui falhas. Recentemente, causou insatisfação no Congresso uma execução de emendas do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, gerou um burburinho entre os integrantes do Congresso Nacional. Fávaro indicou R$ 127 milhões em emendas parlamentares a apenas sete cidades de seu estado, o Mato Grosso – cerca de R$ 18 milhões para cada município.
Isso fez com que o ministro de Relações Institucionais da Presidência, Alexandre Padilha, determinasse o cancelamento do envio dos recursos. Segundo apurou a reportagem, Fávaro ainda não tinha acatado o cancelamento até a última sexta-feira. O governo avaliou que Fávaro extrapolou as novas regras das emendas RP2, que foram turbinadas por ter recebido um incremento bilionário das emendas de relator (RP9), definidas como inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Estados temem perder autonomia com reforma
Com votação prevista para esta semana, a reforma tributária ainda está longe de um consenso. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), convocou sessão extraordinária da Casa hoje, para iniciar a votação de três medidas econômicas cruciais para o governo federal, entre elas o novo regime tributário. No entanto, enquanto o Congresso concentra esforços, governadores engrossam o coro de críticas e tentam barrar o texto.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), está em meio a uma mobilização junto a deputados estaduais e federais do estado na tentativa de adiar a votação. Na sexta-feira ele se reuniu no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, com o coordenador da bancada paulista na Câmara, deputado federal Antônio Carlos Rodrigues (PL), com o presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), André do Prado (PL), e com o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), para discutir o tema.
Também participaram do encontro empresários e entidades que representam o setor de serviços, um dos maiores críticos ao texto da reforma. A ideia do governador é formar um bloco de pressão contra Lira e o relator da reforma na Casa, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), para postergar a apreciação do texto. Tarcísio tem enfatizado que não é contra a reforma e que concorda com outros aspectos da proposta que, no passado, foram objeto de contestação por parte da administração paulista. O principal deles é a mudança na cobrança do imposto de origem (onde o bem ou serviço é produzido) para o destino (onde é consumido).
O estado agora tem unido esforços contra a criação do Conselho Federativo, colegiado que vai gerir o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), imposto a ser criado pela reforma para substituir o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é um tributo estadual, e o Imposto sobre Serviços (ISS), tributo municipal. O governo teme perder autonomia na gestão dos recursos com o IBS. Outros estados também já se colocaram contra o colegiado, como o Rio de Janeiro. O governador Cláudio Castro (PL) subiu o tom contra a reforma e afirmou que a instalação de um Conselho fere o pacto federativo e criticou a indefinição sobre as alíquotas propostas pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) – que serão decididas posteriormente.
“Como se fala de um IVA e não se fala da alíquota? Não deixaremos essa discussão passar sem alíquota”, disse durante o 22º Fórum Econômico, organizado pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide). “O Rio de Janeiro não aceita votar a reforma sem uma clareza sobre isso. Sem saber efetivamente a alíquota, não tem votação”, ressaltou. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), que também esteve no Fórum Econômico, declarou que não se elegeu para “receber mesada” da União e afirmou que não irá abrir mão da autonomia estadual com a criação de um Conselho: “É aviltante imaginar que o cidadão eleito com a prerrogativa de governador e de prefeito fique amanhã a depender do que um Conselho Federativo vai dizer do que ele pode fazer no seu estado ou no seu município.”
Um dos maiores críticos da reforma, Caiado se comprometeu a destinar sua agenda nesta semana a reuniões com deputados federais e lideranças. O governador chegou a convocar empresários e parlamentares do estado a virem à Brasília para um ato na Câmara dos Deputados nos próximos dias. O objetivo é convencer de que a reforma apresenta risco para a arrecadação de estados, municípios e para o pacto federativo.
Contraproposta O relator da reforma na Câmara, foi informado de que São Paulo pretende apresentar uma contraproposta para a criação do Conselho Federativo nesta semana e que não tem intenção de obstruir o projeto. O secretário da Fazenda paulista, Samuel Kinoshita, defende a criação de uma câmara de compensação, pela qual os Estados compensariam uns aos outros ao fim do dia por operações que transbordam os limites de cada unidade da Federação. Tributaristas temem que a solução se complique ao considerar os mais de 5,5 mil municípios, que também farão parte da reforma e terão a gestão da arrecadação compartilhada no Conselho Federativo.