Entre as várias questões que chegam às mãos do prefeito Fuad Noman (PSD), junto do Projeto de Lei (PL) do subsídio dos ônibus nesta semana, uma tem potencial de alterar significativamente a mobilidade urbana da capital: a gratuidade na passagem aos domingos e feriados. A medida foi inserida na proposta que prevê o repasse de verba pública às concessionárias da capital e a redução da tarifa para R$ 4,50, mas sua aprovação ou seu veto pelo Executivo Municipal ainda é incerta. Nas ruas, a reportagem do Estado de Minas ouviu usuários de ônibus, e a percepção geral é que a tarifa zero alteraria a rotina da cidade e permitiria mais acesso a atividades de cultura e lazer.
termina nesta terça-feira (4/7). Uma vez com o documento em mãos, o prefeito Fuad Noman (PSD) e sua equipe têm 15 dias para avaliar todos os pontos e decidir por sancionar ou vetar trechos específicos.
A tarifa zero aos domingos e feriados é uma das mais de 50 emendas adicionadas ao texto original do PL 538/2023, de autoria da PBH. Ela foi aprovada em dois turnos pelos vereadores em pacote que prevê uma série de outros benefícios, como o passe livre para moradores de vilas e favelas, estudantes e pessoas em tratamento de saúde. O prazo final para envio do projeto à prefeitura Conforme apurado pela reportagem, o clima na prefeitura é de hesitação diante das várias emendas que foram adicionadas ao PL. A gratuidade aos domingos e feriados é um dos pontos que deve ser analisado minuciosamente, já que é um gasto não previsto nas reuniões que estabeleceram a relação entre o valor do subsídio e o preço final da passagem. O preço calculado para o estabelecimento da tarifa zero fora dos dias úteis em Belo Horizonte é de cerca de R$ 25 milhões acrescidos aos R$ 512 milhões do subsídio.
Nos pontos de ônibus do Centro de BH, a reação dos passageiros à ideia de não pagar passagem aos domingos e feriados é bem recebida. Para a auxiliar de produção, Joana Patrocínia, não pagar passagem em dias que não trabalha é um incentivo a conhecer melhor a cidade. “Para mim vai ser ótimo não ter que pagar passagem. Já deixei de ir a compromissos no domingo porque a passagem já é muito cara, ainda mais que foi para R$ 6. Querendo ou não atrapalha porque é um gasto que a gente não tá prevendo para aquele momento. Eu passaria a sair mais nos domingos”.
A mesma percepção é compartilhada pela auxiliar técnica em segurança do trabalho, Maria Eduarda, moradora do Bairro Havaí, Oeste da capital: “eu acredito que vai ser benéfico. Eu, por exemplo, estou sem carro no momento e no fim de semana, no momento de lazer acredito que vai ser bem benéfico para gente se deslocar. Eu acredito que tanto a redução das passagens como a gratuidade aos domingo são boas medidas”.
De acordo com dados da Prefeitura de Belo Horizonte, os ônibus da capital registram 985 mil passageiros por dia útil em dados coletados entre junho de 2022 e maio de 2023. Esse número cai para 221 mil aos domingos e feriados. A gratuidade tende a aumentar o número de pessoas nos coletivos, e esse é um ponto avaliado positivamente pelo estudante Lauan Felipe, de 19 anos. Ele acredita que mais pessoas circulando na cidade é positivo para o comércio da cidade, por exemplo: ”É uma questão que vai dar praticidade à cidade. Vai melhorar a acessibilidade na cidade, as pessoas vão sair, fazer mais compras. Dinheiro da passagem a gente geralmente usa para trabalhar, então no domingo é comum a gente deixar de sair por causa da passagem. Aprova aí pra gente, prefeito, por favor”.
De passagem na capital para visitar a família, a modelista Maria Jurema veio de Salvador e comentou sobre a experiência soteropolitana com passagens cobradas pela metade aos domingos e feriados e se mostrou reticente em relação aos efeitos na capital mineira. “Seria uma boa ideia se os donos das empresas aceitarem isso. Eu moro em Salvador, e o prefeito de lá fez isso, na verdade ele começou a cobrar a passagem pela metade nos domingos. Mas as empresas retiraram os ônibus, se antes você ficava uma hora no ponto esperando no domingo, hoje você fica uma hora e meia, duas horas, até três. Se as empresas obedecerem a lei, a ideia é ótima”.
A preocupação de Maria Jurema também foi levada em consideração no PL 358/2023, que determina que as empresas não só não possam reduzir a oferta de viagens, como tenham que aumentar o número em 10%, como ressalta o economista e integrante do Movimento Tarifa Zero, André Veloso. Além de destacar essa trava no contrato, ele destaca que medidas de gratuidade nas passagens já foram adotadas em outras cidades com sucesso.
“É um experimento interessante em Belo Horizonte inclusive por esses problemas que devem surgir do aumento da demanda sem aumento da oferta, mostrando que existe um apelo pela passagem gratuita. Caucaia-CE, por exemplo, tem os dados mais relevantes. Lá está para Fortaleza assim como Contagem está para BH e a gente viu que, que desde que adotaram a tarifa zero, eles reduziram em 40% o número de carros nas ruas e aumentaram em quatro vezes o número de usuários”, destacou com um exemplo de cidade cearense que adotou a grafia zero em todos os dias da semana.
O cálculo
André Veloso explica que o custo de R$ 25 milhões adicionais ao subsídio já previsto no caso da gratuidade aos domingos e feriados foi feito a partir dos dados disponibilizados pela prefeitura no mesmo período pelo qual a tarifa zero ficaria válida neste ano.
“Eu peguei a média de passageiros do ano passado e multipliquei pelo valor da tarifa prevista, de R$ 4,50, e depois pelo número de domingos e feriados que teremos neste ano de 15 de junho em diante. Vale lembrar que a gratuidade não é um custo no sentido que uma pessoa andar de graça no ônibus não custa a mais para o sistema, o que existe é uma renúncia de receita tarifária se os ônibus fossem gratuitos”, explica
Esses R$ 25 milhões serão acrescidos aos R$ 512 milhões do subsídio. Veloso destaca que, mesmo com a adição de mais recursos, a previsão original da prefeitura às empresas era ainda maior. Isso porque o PL original previa o pagamento de R$ 476 milhões saídos dos cofres do Executivo.
Após as tratativas com a Câmara Municipal (CMBH), o valor final foi reajustado para R$ 512 milhões, mas foi repartido entre os poderes. O Legislativo arca com R$ 120 milhões, enquanto a prefeitura, com R$ 392 milhões. Portanto, mesmo com a adição do valor referente à gratuidade em domingos e feriados, o valor desembolsado pelo Executivo não chega ao montante pensado inicialmente, como destacou Veloso à reportagem.
O risco do veto
Os trechos vetados do PL 538/2023 voltam à Câmara, que vota novamente em plenário a possibilidade de derrubar o veto. Para tal, são necessários 25 votos entre os 41 vereadores. Para Irlan Melo (Patriota), autor da emenda que incluiu a gratuidade aos domingos e feriados no projeto, defende a ideia como uma forma de favorecer a população diante dos empresários do transporte.
“Essa medida é superimportante, primeiro que nós queremos reduzir o número de carros na cidade, segundo que muitas pessoas deixam de fazer atividades de lazer e cultura porque não tem como se locomover. Terceiro que a questão do orçamento é uma questão relativa. Quando a gente fala dos R$ 512 milhões, que é o valor do subsídio, não se estabelece a questão especificamente qual o percentual de cada um, no projeto não fala isso. Na verdade, o que estamos dizendo é retirar um pouco dos empresários que vão ganhar meio bilhão de reais e passe para outra parcela da sociedade que precisa”, disse à reportagem.
A Prefeitura de Belo Horizonte não comentou sobre possíveis cálculos e análise da viabilidade da gratuidade. A administração da capital se limitou a informar que ainda não recebeu o projeto. O Sindicato das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH) disse que vai esperar a manifestação da prefeitura no Diário Oficial do Município para se pronunciar.