O órgão havia sido extinto no começo da gestão petista, que planejava distribuir as atividades da fundação entre os ministérios da Saúde e das Cidades, mas o Congresso Nacional decidiu recriá-lo.
Criado em 1991, o órgão serviu historicamente para acomodações políticas. Com a mudança de planos, Lula deu aval para que aliados negociem o comando da Funasa para atrair mais partidos à base do governo.
Na sexta-feira (14) o governo publicou, em edição extra do Diário Oficial da União, a criação de uma comissão composta por integrantes do governo e especialistas indicados por parlamentares para discutir o novo desenho da fundação.
Além de escoar indicações parlamentares em ações de impacto eleitoral, a Funasa atua na melhora do saneamento básico, por exemplo, ao analisar a qualidade da água em pequenos municípios.A fundação também lida com obras de engenharia, como a restauração de casas que ficam em regiões que apresentam maior risco de circulação da doença de Chagas.
Em 2022, no governo Jair Bolsonaro (PL), a Funasa teve orçamento de R$ 3,4 bilhões, com estruturas distribuídas pelas 27 unidades da Federação.
Durante a gestão passada, viu ainda subir o aporte de emendas parlamentares. O órgão recebeu R$ 726,7 milhões em 2020 para indicações de deputados e senadores, enquanto esse valor variou de R$ 81 milhões a R$ 240 milhões nos orçamentos de 2014 a 2019.
O comando da Funasa passou por diversos grupos políticos, como MDB, PP e PTB. Bolsonaro chegou a nomear um militar, o coronel Giovanne Gomes da Silva, que deixou o cargo sob pressão de uma investigação.
Um dos cotados para assumir a presidência do órgão é o deputado federal Danilo Forte (União Brasil-CE), que já foi o chefe da fundação de 2007 a 2010, quando estava no PMDB.
A ideia de extinguir a Funasa foi apresentada pelo grupo da saúde no gabinete de transição de governo, do qual a ministra Nísia Trindade fez parte e que apontou que a fundação poderia ser esvaziada por realizar o mesmo que outros órgãos do governo.
A Funasa também foi centro de diversas apurações de órgãos de controle. A CGU (Controladoria-Geral da União) indicou, em 2011, que desvios da fundação poderiam ultrapassar R$ 500 milhões.
Em 2008, o então ministro da Saúde, José Gomes Temporão, quase perdeu o cargo após se tornar alvo do Congresso por citar que a ação da Funasa era de "baixa qualidade e corrupta".
Um relatório da CGU de 2022 também citou mau uso do dinheiro público. Segundo o documento, que mirou ações do órgão no Ceará, de 303 convênios avaliados, só 3 tinham sido executados no prazo inicialmente previsto.
Além disso, havia convênios de R$ 189 milhões, assinados de 2011 a 2019, mas sem recursos efetivamente liberados. Ou seja, sem o início das obras.
Relatório de auditoria interna de 2022 da fundação mostrou ainda, sem entrar em detalhes, mudança de perfil do órgão no último ano de Bolsonaro.
O documento afirma que a fundação "passou da massiva celebração de convênios com estados e municípios" para a "instalação de sistemas simplificados e abastecimento de água e de captação de água de chuva".
A mudança sinaliza foco, no ano eleitoral, para entregas de cisternas ou sistemas de abastecimento d'água por captação subterrânea.
Esse tipo de entrega massiva de equipamentos para pequenos municípios desperta o interesse de parlamentares, que direcionam os recursos para as suas bases eleitorais.
A Funasa também fornece caminhões coletores de lixo e financia a instalação de pequenos banheiros em casas de regiões mais pobres. Também realiza obras mais complexas de engenharia, como instalações de redes coletoras de esgoto e estações de tratamento.
O orçamento da Funasa previsto para 2023 era de aproximadamente R$ 3 bilhões. Ainda não está definido o volume de recursos disponíveis na reformulação do órgão.
Relatório de gestão da fundação sobre suas atividades no ano passado diz que o órgão tem perdido pessoal. Eram 2.600 funcionários em 2018, chegando a 1.588 em 2022.
"A estimativa é de agravamento, já que 44% dessa força de trabalho goza do abono de permanência, tendo, portanto, condições de se aposentar", diz o documento.
Além de significar uma derrota para Lula, a recriação da Funasa pelos congressistas também impactou na estrutura prevista para a Esplanada. O presidente resolveu ter 37 ministérios (14 a mais do que tinha Bolsonaro), mas determinou que não houvesse despesas adicionais na montagem das novas pastas.