O bolsonarismo transformou a cara de um partido político pela segunda eleição consecutiva em 2022. O PSL, legenda que abrigou Bolsonaro em 2018, viu sua bancada na Câmara subir de 1 para 54 deputados na esteira dos candidatos que abraçaram a pauta do ex-presidente. No pleito seguinte, o PL, sob a égide do então presidente, saiu de 33 para 99 parlamentares, se tornando a maior bancada da casa.
O crescimento vertiginoso cobra o preço de modificar as características do partido e seus quadros mais tradicionais. É o que explica o professor de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Cristiano Rodrigues, que acredita que a inelegibilidade de Bolsonaro deve ter o efeito de levar a legenda novamente ao Centrão.
“O PL é tradicionalmente um partido dos mais fisiológicos. Ele já esteve com o PT em outros momentos, especialmente quando o Lula foi eleito pela primeira vez e o vice era do PL (José Alencar). Então é um partido que tende a ter em seu quadro parlamentares de caráter mais fisiológico. Aqueles parlamentares mais fisiológicos ou de centro-direita vão tender a votar mais favoravelmente ao governo quando o tema for de interesse deles e aqueles mais bolsonaristas vão tentar se manter fiéis ao Bolsonaro. Mas com a inelegibilidade do Bolsonaro e essa perda de influência dentro do partido, acho que a tendência é que, em um segundo momento, o partido acabe entrando como um todo no governo”, analisa.
A perspectiva de que o bolsonarismo pode perder força dentro do PL não é uma unanimidade entre os cientistas políticos. Para Adriano Cerqueira, professor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e do Ibmec, a filiação de Bolsonaro significa uma caracterização inédita para uma legenda historicamente fisiológica. “O PL foi um partido que engrandeceu com Bolsonaro, saindo da condição de um partido mediano com conotações do tipo ‘Centrão’ e virou um partido com a maior bancada na Câmara dos Deputados”, observa Adriano. Para o cientista político, a cisão do partido na votaçaõ da reforma tributária não foi uma divisão ao meio. “
Sobre o tamanho da bancada, Cristiano Rodrigues acredita que o partido seguirá numeroso nas próximas eleições em virtude das regras de financiamento de campanha em vigor. O professor da UFMG, no entanto, reitera que o posicionamento ideológico dos membros da legenda tende mesmo a um retorno ao centro.
O fator Zema
O apoio público de Romeu Zema à reforma tributária é citado por parlamentares do PL mineiro como uma das justificativas para o voto favorável à pauta. Samuel Viana comparou a reação dentro do partido à postura dos governadores mineiro e paulista e destacou que há um movimento forte pela aproximação dos membros da legenda em Minas com o governo estadual. “Eu critiquei muito as vaias e as próprias críticas que fizeram ao Tarcisio (de Freitas, governador de São Paulo) quando ele quis ponderar e dizer que era preciso participar da reforma e discutir mudança. Acho que isso apequenou muito a oposição. Sobre o apoio do Zema à reforma, ninguém do PL fez críticas ao governador e ficou muito em um posicionamento individual. A bancada do PL na Câmara busca muito uma aproximação com o governo do Zema”, comentou.
Para o professor da UFMG, Cristiano Rodrigues, a relação com Zema faz parte de uma estratégia diversificada do PL para se manter relevante em frentes estaduais e no cenário federal. “Embora normalmente a gente possa pensar que o que ocorre ali no Congresso Nacional se repita em algumas assembleias estaduais, eu não acho que essa análise da aproximação do Zema com o PL em Minas Gerais ou a tentativa de manter o núcleo mais bolsonarista em Minas Gerais vá ter grandes efeitos no cenário nacional. Não vejo que isso vá gerar cisões no Legislativo”, avalia Rodrigues. (BE)