Para o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), o ex-presidente Jair Bolsonaro incorreu em pelo menos quatro crimes, caso se confirmem, as acusações feitas pelo hacker Walter Delgatti Neto no depoimento que prestou à CPMI do 8 de janeiro. Em entrevista ao CB.Poder — uma parceria entre o Correio Braziliense e a TV Brasília —, o líder do governo no Congresso acredita que o relatório da senadora Eliziane Gama (PSD-MA) pedirá o enquadramento de Bolsonaro nesses delitos, que podem chegar a 18 anos de prisão.
Randolfe, inclusive, lembra que seria o segundo indiciamento do ex-presidente, uma vez que na CPI da Covid foram imputados ao ex-presidente crimes que renderiam aproximadamente 60 anos de detenção. Sobre o os militares acusados de contribuírem para a tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro, o senador considera que eles não representam as Forças Armadas. A seguir, os principais trechos da entrevista.
A CPMI ouviu o hacker Walter Delgatti Neto e houve revelações graves. O que dá para tirar do depoimento?
Foi o mais forte na CPMI até agora. O conjunto das revelações podem incorrer ao final, no relatório da senadora Eliziane Gama (PSD-MA), no indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro em pelo menos quatro crimes. O do artigo 366 do Código Penal, que é o crime de golpe de Estado, com pena que vai de quatro a 12 anos de prisão. O do artigo 341 do Código Penal, que é o crime de autoacusação, e ele (Bolsonaro) fez isso quando induziu Delgatti a assumir um crime que não tinha cometido, em benefício dele.
O do artigo 286 do Código Penal, que é a incitação ao crime. Ficou patente isso quando Delgatti diz que ele daria carta branca para os atos a serem praticados. E o crime de escuta telefônica ilegal, artigo 10 da Lei 99.296, de 1996. Esses quatro tipos penais podem, ao final do relatório da CPMI, representar o indiciamento de Bolsonaro a pelo menos 18 anos de prisão. Chamo a atenção, aqui, que pode ser e será a segunda comissão de inquérito que indiciará a mesma pessoa. A última foi a que participei inclusive, como vice-presidente, que foi a CPI da Covid. Lembro que o relatório desta CPI indiciou Bolsonaro a um total de pelo menos 60 anos de prisão.
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O senhor acha que ele não tem escapatória, que vai acabar preso?
Ele tem muitas explicações a dar à Justiça. A gente aponta e olha para os crimes atuais e acaba esquecendo dos outros. São crimes contra a ordem democrática, de golpes de Estado, de subversão da ordem democrática, que ficou patente desde o dia que ele assumiu a Presença, em 1º de janeiro de 2019. E o caso das joias tem corrupção passiva, corrupção ativa, formação de quadrilha.
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A notícia da revista Veja colocou o advogado de Mauro Cid dizendo que ele fez tudo a mando de Bolsonaro e que está disposto a confessar esse crime. No momento em que ele confessa, não é uma delação premiada, certo?
Está construindo um caminho para uma delação. Acho que ele está muito bem assessorado juridicamente, que pode revelar outros crimes cometidos pelo ex-presidente.
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O tenente-coronel do Exército Mauro Cid será chamado novamente à CPMI?
Acho que temos elementos para chamar muita gente à CPMI. O agora ex-comandante da Polícia Militar do Distrito Federal (Jorge Eduardo Naime), com este áudio estarrecedor, é um personagem que tem de ser novamente chamado. Os dados mais recentes, que dão conta dos planejamentos terroristas de 12 de dezembro, que ateou fogo e disseminou terror na cidade, e outro de 24 de dezembro (a tentativa de realizar um atentado a bomba). Vamos dar o nome de todos que praticaram os atos de 12 de dezembro, de 24 de dezembro e de 8 de janeiro: terroristas.
Atentaram contra a ordem democrática, queriam colocar bombas que poderia levar milhares de inocentes à morte. Não tem outro nome para isso. Agora, chamar o ex-presidente (Bolsonaro), sinceramente, não considero necessário. No máximo, uma acareação dele com Delgatti.
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Conversei com o ministro da Defesa, José Múcio, que está muito preocupado de como esse caso vai se desdobrar, porque não vê a hora de separar o joio do trigo. Ele fala assim: "Olha, são alguns, não são os militares. Os militares não querem saber de golpe. É preciso separar quem esteve envolvido com esses atos de 8 de janeiro, com qualquer outra irregularidade, que seja punido. Para os militares poderem tocar o serviço".
Na quarta-feira, fiz questão de visitar o Quartel-General do Exército, a convite do general Tomás Ribeiro Paiva (comandante da Força) e fui recebido lá por ele e pelo ministro Múcio. A diretriz do ministro é a diretriz também do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. Há de separar a instituição Forças Armadas daqueles que cometeram delitos. Aliás, delito, crime, não combina com a trajetória das Forças Armadas brasileiras. Não combina, sobretudo, com a trajetória do Exército brasileiro. Senti muita firmeza, da parte do comando do Exército, da parte do ministro Múcio, de separar o joio do trigo. E, sobretudo, preservar as instituições. Lamentavelmente, no último período houve a contaminação e o resultado está aí: a contaminação do bolsonarismo sobre a atuação das Forças Armadas. O Exército é uma instituição fundamental à nossa formação como nação e assim deve ser respeitada.
Há um projeto que prevê que o militar que tiver entrado para a política, automaticamente sai da caserna. Isso acontece no Judiciário. Esse projeto vai ser aprovado? Existe uma conversa para aprovar esta proposta?
A ideia é apresentar um conjunto legislativo que pode ser apresentado pelo próprio governo ou pode ser aproveitado matérias que estão no Congresso. Quero citar uma. Tem uma proposta de emenda constitucional, do (senador) Renan Calheiros (MDB-AL), que contempla muito das preocupações que estamos debatendo no governo. Vivemos um período que não pode ser apagado da nossa memória, sobretudo para não se repetir. Um período em que as estruturas das instituições do Estado Democrático de Direito foram ameaçadas e, por pouco, não foram rompidas. Se metade do que eles planejaram — ainda bem que eles eram muito incompetentes — tivesse se concretizado, teríamos uma ruptura na democracia. Quem faz concurso para juiz, para promotor de Justiça, para procurador da República, para a carreira militar, escolheu seu sacerdócio na vida. Assim como acho que o exercício da função pública na política é um sacerdócio, essas outras missões são funções públicas de sacerdócio na vida. Não podem derivar disso.
Vai ser fácil aprovar esta proposta?
Estou convencido que sim, porque tem um amadurecimento, independentemente de partido político. Uma reflexão do que foi a última quadra histórica, da última Caixa de Pandora que foi aberta na última quadra histórica e que tem que ser em definitivo fechada.
Para a semana que vem, tem a votação do arcabouço fiscal e de medidas provisórias. E tem uma reforma ministerial "encantada"...
Primeiro, têm três MPs fundamentais que devem ser votadas até sexta-feira: a MP do salário mínimo, e que a ela foi incorporada a correção da tabela do Imposto de Renda, e junto com isso a tributação necessária de offshores. São 2.400 famílias que nunca pagaram imposto no país desde a colonização portuguesa. Então, é necessário o esforço fiscal do governo. (Tem) a MP do reajuste dos servidores públicos, de 9%, e a MP do vale-alimentação. Estou muito confiante de que o presidente Arthur Lira (PP-AL) fará a leitura e as colocará para serem votadas na terça e na quarta-feira. O presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), inclusive de forma de forma prudente, reservou a quinta-feira para, se for o caso, votarmos essas três MPs que dizem respeito ao básico para o povo brasileiro: reajuste do salário mínimo, correção da tabela do Imposto de Renda e o reajuste do salário dos servidores. Junto com isso tem o Marco Fiscal, que estou muito confiante que a gente consiga também votar.
Mesmo sem sair a reforma ministerial, esperada desde meados de julho? Já tem um mês.
Eles têm consciência, tanto o deputado André Fufuca (PP-MA) quanto o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), que o tempo é o senhor da razão. Todos que quiserem vir para a obra de reconstrução nacional são bem-vindos. O PP demonstrou e manifestou esse interesse. O Republicanos manifestou esse interesse. O governo está à disposição para recebê-los e incorporá-los. Agora o senhor do tempo para consolidar a incorporação deles no governo será o presidente da República. Independentemente disso, a pauta desta semana do Congresso é uma pauta que pertence ao Brasil. Tenho certeza de que a Câmara e os deputados, e todos os partidos que até agora têm contribuído com a obra da reconstrução nacional, assim compreenderão também e votarão essas matérias que aqui citamos. Agradeço a Deus por estar trabalhando com Luiz Inácio Lula da Silva, que é a maior figura política da história deste país, e que tem a melhor sensibilidade política da história deste país. É por isso que em tão pouco tempo de um país dividido, ele, segundo a última pesquisa, tem 60% de aprovação popular, porque tem a sensibilidade necessária para dialogar com a cobrança nacional e definir o tempo. Ter a compreensão de cobrança nacional e também ter o apoio do povo brasileiro.
Esta semana começou com um apagão elétrico. Há algum risco ou essa questão está resolvida?
Tem um incidente que precisa de profunda apuração, inclusive sobre o fato, que foi levantado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira — se não existiu algum dolo. Não foi um ato corriqueiro. O sistema brasileiro de energia elétrica é seguro, que não teve eventos dessa natureza. Causa espécie ocorrer após a privatização da nossa empresa de energia elétrica (a Eletrobrás). Não estamos debatendo a revisão disso, mas tem que ter uma apuração profunda das causas que levaram um sistema robusto e seguro a trazer tantos transtornos, como na última terça-feira.
*Com Marina Dantas, estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi