Ministros do governo e aliados do presidente Lula (PT) no Congresso veem com apreensão uma eventual prisão de Jair Bolsonaro (PL) em decorrência do avanço das investigações contra o ex-presidente.
O cenário em que Bolsonaro poderia ser preso atiçou a militância petista, e movimentos sociais ligados ao governo pretendem incorporar o pedido de prisão de Bolsonaro no rol de reivindicações das manifestações no 7 de Setembro.
Apesar disso, integrantes do governo e articuladores políticos dizem torcer para que uma prisão, caso ocorra, seja em cumprimento a uma solicitação do Ministério Público Federal e com robustez de provas.
Isso porque a eventual detenção de Bolsonaro poderia contribuir para inflamar e dividir mais a sociedade, avaliam.
O ex-presidente está no centro de apurações que apontam a existência ao seu redor, e com o seu estímulo, de um grupo que alimentava reais expectativas de aplicar um golpe de Estado e barrar a posse do presidente eleito em 1º de janeiro.
Leia Mais
Bolsonaro visita Festa do Peão, recebe afago de Tarcísio e ignora investigaçõesMauro Cid não poderá se comunicar com Bolsonaro nem Michelle, decide MoraesForças Armadas procuram 'saída honrosa' após escândalos de Bolsonaro, avalia pesquisadorBolsonaro, Michelle, Mauro Cid e outros são interrogados pela PF hojeAos gritos de 'mito' e 'ladrão', Bolsonaro chega a Belo HorizonteFaixas ironizam a chegada de Bolsonaro a BH: 'Ladrão de joias na cidade'Lula pede para Itamaraty estudar abertura de novo consulado em AngolaPGR aciona STF por inconstitucionalidade do 'Dia do Patriota'Apesar de todas essas apurações, um parlamentar muito próximo de Lula cita a própria anulação das acusações contra o petista e a posterior absolvição de Dilma Rousseff (PT) em processos como exemplos do que pode vir a ocorrer com Bolsonaro.
Este congressista lembra que muitos petistas foram alvos de investigação e avalia que esse "mangue" tem que acabar, numa referência a decisões da Justiça que considera arbitrárias.
Mais dois ministros ouvidos sob reserva avaliam ser necessário ter maiores evidências antes que seja tomada uma medida desta, já que a prisão do ex-presidente poderia, em vez de enfraquecê-lo politicamente, contribuir para inflar seus apoiadores.
Eles lembram que Lula, mesmo preso, conseguiu articular a candidatura de Fernando Haddad (PT) no seu lugar e levou o aliado a ficar em segundo lugar na disputa presidencial de 2018.
Nesta sexta (25), em entrevista ao UOL, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, afirmou que os investigadores devem se pautar na lei, na apuração, na "responsabilidade e na qualidade da prova" e que Bolsonaro pode ser preso se os requisitos forem atendidos.
"Se nessa conjunção de elementos se chegar a essa conclusão , se os requisitos legais são atendidos, esse é um caminho possível, e aqui falo hipoteticamente", disse o diretor da PF.
Na última semana, o ministro Flávio Dino (Justiça) também afirmou que as investigações contra o ex-presidente são conduzidas de forma séria, isenta e técnica. Afirmou ainda que as apurações estão longe do fim.
"Cabe a mim garantir ao povo brasileiro, especialmente à população de Minas Gerais, que a investigação é técnica, séria, isenta e está sendo bem conduzida. Bem conduzida no sentido de não haver interferência externa, nem no sentido de perseguições, nem no sentido de haver proteções", disse o ministro na última segunda-feira (21), ao ser questionado sobre a possibilidade de o ex-presidente ser preso.
O ministro admitiu a possibilidade de o passaporte de Bolsonaro ser apreendido, mas afirmou que, por enquanto, essa solicitação ainda não foi feita à Justiça. "Não antecipo investigação, não presido investigação. O que posso falar é que legalmente é possível. Nesse momento ainda não houve esse pedido", afirmou.
Em outra frente, os aliados de Bolsonaro querem usar as acusações para tentar transformá-lo em uma espécie de mártir.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) aposta que a sociedade enxerga o que ele classifica como perseguição ao pai.
"A perseguição faz com que a população fique mais simpática a ele. Pesquisas mostram que ele continua forte e que o apoio dele para eleição de 2024 vai ser decisivo", diz o filho mais velho do ex-presidente.
Essas afirmações são contestadas pelo entorno de Lula, que afirma que o ex-presidente tem sofrido uma erosão em seu apoio devido às investigações.
Bolsonaro despencou em relevância nas redes após a operação da PF no caso das joias e as declarações de Walter Delgatti Netto, conhecido como hacker da Vaza Jato, de acordo com o IPD (Índice de Popularidade Digital), analisado diariamente pela empresa de pesquisa e consultoria Quaest.
A leitura de aliados de Bolsonaro, entretanto, é que, como o ex-presidente já está inelegível, o avanço uma uma investigação manca vai passar a imagem de que a Polícia Federal, o STF e o Ministério da Justiça conduzem um processo político.
Essas pessoas acham que é o caso especialmente da investigação do envio de mensagem que sugeria, sem provas, uma fraude do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Bolsonaro confirmou na quarta (23) o teor da mensagem enviada ao empresário Meyer Nigri que levou a Polícia Federal a intimar o ex-presidente para explicar a difusão de fake news sobre o processo eleitoral brasileiro. "Eu mandei para o Meyer, qual o problema?", disse à Folha de S.Paulo.
Um dos casos mais delicados até agora é a apuração sobre as joias e presentes dados por autoridades de outros países ao ex-mandatário. Ao autorizar diligências no processo, o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), apontou investigação de possível cometimento de crimes de peculato e de lavagem de dinheiro.
Aliados do ex-presidente dizem que, com o tempo, a população vai interpretar o episódio como uma falha causada por uma legislação capenga, que inclusive deverá ser refeita pelo Congresso, mostrando que havia inconsistências.
Flávio Bolsonaro afirmou que, como resultado dessas investigações, o ex-presidente terá ainda mais poder de transferência de votos.
O discurso de vitimismo, portanto, tem sido a principal aposta do entorno do ex-presidente desde que denúncias e acusações contra ele passaram a ficar mais claras.