Em meio à crescente onda de violência política de gênero em Minas Gerais, a vereadora Gaby Valeska (Cidadania), de Sarzedo, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, denunciou seu colega vereador Rodrigo Ferrette (PR) por ameaças de agressão. O incidente resultou na instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara Municipal.
Conforme consta no Boletim de Ocorrência registrado pela parlamentar, em 17 de agosto, Ferrette, após o evento de lançamento da Pedra Fundamental do hospital que será construído no município, dirigiu-se ao gabinete de Gaby e declarou, diante de testemunhas, que a parlamentar havia se aproximado dele e de outras pessoas em uma roda de conversa para cumprimentá-los no evento, mas ele se recusou a cumprimentá-la.
Posteriormente, na Câmara, o vereador proferiu ofensas à vereadora, que estava ausente. “Minha vontade era de dar um soco naquele doce”, afirmou a assessoria de Gaby, referindo-se ao apelido pelo qual as pessoas se referem à vereadora.
Gaby Valeska é pré-candidata à Prefeitura de Sarzedo e alega ser vítima de violência de gênero e de uma tentativa sistemática de silenciamento. “Este é o cenário em Minas. Não é um caso isolado. Até quando vão tentar calar nossas mulheres na política? Querem nos confinar ao papel de donas de casa. Somos as matriarcas da sociedade e não aceitarei qualquer tipo de ameaça”, afirmou a vereadora ao Estado de Minas.
Após a denúncia da vereadora, uma CPI foi instaurada para investigar as declarações do vereador, que alega nunca ter ameaçado Gaby. Em uma entrevista ao jornal, Ferrette declarou seu apoio aos direitos das mulheres e assegurou que “jamais” teria proferido palavras contra a parlamentar. O pedido de investigação partiu do próprio vereador, com o aval de Gaby.
“Eu, que denunciei uma ameaça feita por um vereador em meu gabinete, estou agora sendo acusada. Não se enganem, o vereador em questão é bastante astuto e tem a intenção de me silenciar e buscar a cassação do meu mandato. Não posso me calar diante de qualquer tipo de ameaça. Preciso que os fatos sejam devidamente apurados e que a justiça seja feita. Não é apenas por mim, mas por todas as mulheres que sofrem qualquer tipo de violência. Continuarei lutando até que toda essa maldade seja erradicada”, afirmou Gaby Valeska.
Em contato com o Estado de Minas, Ferrette solicitou que a reportagem entrasse em contato com seus advogados. Por meio deles, foi encaminhada uma nota ao jornal. No texto, a assessoria enfatizou que o vereador Rodrigo Ferretti é reconhecido por seu “firme compromisso na luta contra a violência às mulheres” e nega veementemente ter cometido qualquer crime do qual está sendo “falsamente acusado”.
“Suas ações e histórico político demonstram seu apoio contínuo e defesa dos direitos e segurança das mulheres em nossa comunidade. Ressaltamos que as falsas alegações feitas pela vereadora já estão sendo investigadas no âmbito criminal, e a equipe jurídica do Vereador está trabalhando diligentemente para esclarecer a verdade e garantir que a justiça prevaleça. O parlamentar aguarda, confiante, uma investigação imparcial e justa, na certeza de que sua inocência será comprovada. Ferretti agradece o apoio e compreensão de seus eleitores e da comunidade durante este momento desafiador. Ele reitera seu compromisso inabalável em servir à população e continuar a lutar pelos direitos das mulheres, independentemente dos desafios encontrados na jornada.”
Corrida pela Prefeitura
Além de ser pré-candidata à Prefeitura de Sarzedo, Valeska ocupa o cargo de presidente da Associação de Vereadores da Região Metropolitana de Belo Horizonte (Verbel). Após as ameaças que sofreu, ela tem recebido apoio de vereadores de todo o estado. Em vídeos, os parlamentares têm repudiado as declarações de Ferrette e solicitado que as investigações conduzidas pela Câmara sejam imparciais.
“O problema é que minha atuação no município tem incomodado meus colegas. Eles veem em mim uma ameaça na corrida pela Prefeitura, e isso os irrita. Quando uma mulher tem voz, é frequentemente silenciada. Isso é um fato. Querem retirar minha voz porque tenho habilidade política. Porque sou vista como uma líder. Porque presido a Verbel. Enfim, é apenas mais um caso em meio a tantos outros que temos acompanhado”, explicou a vereadora.
Gaby alega que, além dos vereadores, recebeu apoio de deputadas estaduais, como Bella Gonçalves (PSOL-MG) e Macaé Evaristo (PT-MG).
Violência de gênero na política
Depois que as deputadas estaduais de Minas Gerais foram alvos de ameaças de morte, estupro e violência de gênero, o estado se tornou o primeiro do Brasil a ter uma lei própria de combate à violência política contra a mulher.
No final do mês passado, foi sancionada pelo governador Romeu Zema (Novo), a Lei 24.466, que cria o Programa de Enfrentamento ao Assédio e Violência Política contra a Mulher, a partir de um projeto criado e aprovado na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O texto é de autoria das deputadas Ana Paula Siqueira (Rede), Andréia de Jesus (PT), Beatriz Cerqueira (PT) e Leninha (PT).
A nova lei estabelece os objetivos do programa de enfrentamento à violência política, além de critérios e procedimentos para as denúncias; fixa o dever de comunicação às autoridades por parte dos servidores públicos que tenham tomado conhecimento de atos dessa natureza; e prevê ações a serem instituídas pelo Poder Executivo para tornar eficaz a implementação da política.
Dessa forma, será possível instituir mecanismos de monitoramento e avaliação das ações de prevenção e enfrentamento à violência política contra a mulher, por meio de parcerias entre órgãos e entidades públicos e organizações privadas.
Também estão listados objetivos como promover a divulgação de informações sobre as formas de identificar, denunciar e combater a violência política contra a mulher, assim como ações para fomentar a paridade entre homens e mulheres em todos os órgãos e instituições públicas, e nas instâncias decisórias de partidos políticos, associações e organizações políticas.
O Programa também buscará o combate a qualquer forma de discriminação de gênero, considerando-se aspectos relativos a raça, cor, etnia, classe social, orientação sexual e religiosidade, que tenha por finalidade ou resultado impedir ou prejudicar o exercício dos direitos políticos da mulher.