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Fabricio Carpinejar e a traição na era digital

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“Muitos homens vão me odiar”, declara o autor best-seller Fabrício Carpinejar sobre a reação esperada à metáfora que dá título ao livro autobiográfico Minha esposa tem a senha do meu celular. Com lançamento e sessão de autógrafos em BH na semana passada, a 44ª obra do poeta, cronista e jornalista aborda (e critica) a traição no contexto da era digital. Para ele, manter segredos, contato e relações extraconjugais no ambiente virtual é tão grave quanto chegar às vias de fato no mundo real.





Ambas as formas de traição, garante o autor, não valem a pena e representam uma atitude que em nada acrescenta à construção e manutenção do amor e do casamento. Antes pelo contrário, têm o potencial de inviabilizar a relação a dois. “O lançamento no mês das noivas e noivos foi planejado e o sucesso durante a primeira semana de pré-venda indica que o assunto permanece a gerar interesse em tempos de relacionamentos líquidos, em que casamentos se desfazem na velocidade de um clique.”


Nudes, conteúdo pornográfico, aplicativos de relacionamento, redes sociais e outras esferas que estimulam o comportamento infiel no ambiente virtual estão no alvo de Carpinejar. “Com a revolução tecnológica, posturas como fidelidade e lealdade estão mais difíceis e complexas”, analisa. Segundo ele, o ambiente virtual trouxe um aumento de distrações, dispersões, flertes. Ambiguidade e duplicidade de comportamentos. “Facilmente, o indivíduo tem acesso a aplicativos de traição, faz perfis falsos em aplicativos de relacionamento e por aí vai. Há uma espécie de divórcio que divide o ser em duas personalidades distintas: quem você é na rotina e quem você é nas redes sociais.”


O autor explica: “Isso por que há uma certa confusão que ‘diferencia’ o sujeito do avatar, o que o leva o sujeito a se posicionar de formas distintas no cotidiano e na rede. No entanto, trata-se da mesma pessoa na vida real e na virtualidade”, aponta.



AUTOBIOGRAFIA Em narrativa biográfica, Carpinejar revela no livro a própria experiência, desde o namoro até o casamento religioso com a advogada Beatriz Reys, em 2016. E aproveita para derrubar alguns mitos sobre a fidelidade, a exemplo do que associa o matrimônio a uma prisão ou o que reduz a traição masculina a uma questão biológica do homem, que teria nascido para ter várias parceiras. “Amar alguém não é perder a liberdade, mas partilhar responsabilidades. Bem-vindo ao mundo adulto do amor”, conclama o autor.


Não há pesquisas ou dados científicos na obra, mas a vivência de um homem de 46 anos, “católico e louco pela família”, como define a si mesmo, que optou por construir uma relação verdadeira com a mulher. Beatriz assina a orelha do livro e é citada por ele o tempo todo nas 144 páginas do livro.


“Penso que lealdade tem a ver com ter coragem de expor o seu amor. E acredito que gente que não apregoa a fidelidade o faz porque tem medo de o relacionamento acabar, baliza-se na sensação do provisório. Há, em geral, uma desconfiança nos relacionamentos. E para lidar com a incerteza, as pessoas optam por pular em boias no lugar de assumirem para si aquela responsabilidade, ainda que durante um mau tempo, uma tempestade.”






E um possível perdão? O jornalista se posiciona como descrente. E sentencia: “É preciso terminar a relação antes de trair. Não dá para colocar justificativas, explicações, porque não existem. Antes de pular a cerca, o indivíduo deve pensar que foi ele mesmo que a construiu”. Traiu mesmo assim? Aí, segundo ele, o caldo entornou. “Porque foi planejado. Você abraçou as consequências. E vai descobrir que não tem boa hora para contar sobre uma infidelidade. Já a reincidência é burrice”, alfineta.

FAMÍLIA A segunda obra biográfica publicada por Fabrício Carpinejar traz como tema central a família, e, nesse ponto, se assemelha à primeira, o livro Cuide dos pais antes que seja tarde (Bertrand Brasil, 112 páginas), que já vendeu mais de 5 mil exemplares em um ano. “Os dois são narrativas biográficas, em que exponho a experiência e faço a reflexão. E se completam pelo ideal de família, que para mim é a base de tudo. Muita gente tem medo de parecer careta, eu não. Meu caráter foi moldado ali e, desde então, posso até mudar de opinião, mas não de princípios.”


Por fim, Carpinejar justifica a frase que abre essa matéria, a respeito de o título do livro ter o potencial de incomodar maridos, mulheres e parceiros que não pretendem agir como o autor. “Alguns podem dizer: não vou dar a senha, tenho direito à minha identidade, intimidade. Mas, elas estão no celular? Nossa, então a vida desse indivíduo deve estar pequena, restrita a um aparelho.!” E justifica a crítica: “O celular não é mais importante que a relação. A lealdade é visível e eu não tenho nada a esconder. Digo que é muito maravilhoso e prazeroso não ficar sofrendo com o celular, com o que o outro pode ver ou saber”.





O autor reforça que, na publicação, defende o casamento fechado e fala sobre confiança. Pontua que “a lealdade impulsiona a fidelidade, que demanda do indivíduo estar presente na relação por inteiro, de corpo, cabeça, coração. E encerra com um manifesto. “A opção por fidelidade é a melhor escolha entre um casal. Porque ter intimidade com alguém faz com que você se conheça muito melhor. A rotina é tudo o que a gente gosta e vai repetir. Sexo no casamento é muito melhor. Um parceiro conhece o outro. Não é necessário fingir e nem fazer performance. Acima de tudo, ter a consciência tranquila é importante para a plenitude da relação”.

 

 

três perguntas para...

 

fabrício carpinejar

 

1 - Em que medida a web vem banalizando a fidelidade?
Há uma ideia generalizada de que não existe amor verdadeiro, cumplicidade. Mas existe! E hoje ocorre uma banalização das conversas, por exemplo. Não há nenhuma etiqueta.  Uma outra questão é a vulgarização, a profusão de pornografia, nudes. Ao mesmo tempo em que ninguém ensina a tratar o outro com respeito, com gentileza. Onde está o cortejo, o namoro? Sou muito feliz, não quero magoar minha esposa, nem no mundo real e nem no virtual. Nunca vou querer expô-la ao ridículo.

2 - Você sempre foi fiel, mesmo na adolescência ou no casamento anterior?
O que estou falando é sobre o meu casamento com a Beatriz. Ex é ex, e não acho legal ressuscitar relacionamentos anteriores, porque isso vai trazer um ciúme retroativo. E muita gente confunde namorado com terapeuta. Por isso, acho importante começar um novo relacionamento após zerar experiências anteriores. Já traí, na adolescência. Aprendi com erros. E jamais traí a Beatriz.

3 - Que dicas sugere para casais?
O que alimenta o amor é a admiração, que é vitalícia. Entre os desafios para uma relação harmônica destaco bom humor, nunca testar os limites do outro, jamais usar os segredos do parceiro contra ele, proteger a fragilidade do cônjuge, não querer ser melhor que, mas melhor para o outro. Para o casamento dar certo, não basta ter amor, mas partilhar projetos. E se lembrar sempre de que a união não é uma simbiose, mas a junção de dois indivíduos independentes. Não vou me anular para que o outro seja feliz.