Jornal Estado de Minas

O que estará na mesa do brasileiro em 2020? Veganismo e vegetarianismo ganham força

Entre os objetivos e promessas para 2020, por acaso você pensou no que colocar no prato durante as refeições ao longo do novo ano? O que estará na mesa do brasileiro? Essa é uma preocupação da Fundação Péter Murányi, que leva o nome do empresário húngaro que imigrou para o Brasil ainda jovem, e com uma trajetória de sucesso determinou, em testamento, que a família criasse um prêmio para celebrar as pessoas que veem a alimentação como aliada essencial na preservação da saúde e qualidade de vida.





 

Uma alimentação de qualidade, saudável e saborosa está na sua lista para 2020? Em sua 19ª edição, o Prêmio Péter Murányi revelou, no fim de 2019, as apostas de especialistas sobre o que o brasileiro vai comer neste ano. Será que vai continuar tentando consumir mais frutas, legumes e verduras, ou se renderá de vez às promoções, levando para casa apenas aquilo que couber no orçamento? Ou o que for mais prático e fácil? Ou seja, optar em abrir mais embalagens sem ter o trabalho de descascar?


Bem, para os especialistas, os estilos alimentares como o veganismo e o vegetarianismo, que incentivam o consumo de produtos mais saudáveis, deverão ganhar mais força. Nágila Damasceno, nutricionista e diretora-executiva do Departamento de Nutrição da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp), explica que os brasileiros estarão cada vez mais globalizados, seguindo a tendência mundial de sustentabilidade, em que a preocupação com a saúde, o bem-estar e o consumo minimalista (contramão do hiperconsumismo) individual e coletivo estarão cada vez mais presentes.

 

“Sendo assim, o número de indivíduos que optarão por um padrão alimentar baseado em plantas – vegetarianos, seguirá crescendo. O consumo de alimentos mais naturais, simples e nutricionalmente ricos deve ser reforçado como estratégia de redução no excesso do consumo de alimentos processados e produzidos fora de casa. Os indivíduos tenderão a comprar mais alimentos de pequenos produtores em feiras livres, centrais atacadistas e cooperativas agrícolas dentro da concepção de sustentabilidade ambiental, menor emissão de gases de efeito estufa e resgate de práticas culinárias menos agressivas à saúde individual e mais sustentável”, afirma Nágila.

 

Empresária do ramo da beleza, Natália Cruz, de 34 anos, foi impactada por uma viagem de férias a Caraíva, Sul da Bahia, em 2018, quando o contato com a natureza a fez rever conceitos: “Sempre tive uma alimentação equilibrada, comia carne, peixe, frango. No entanto, meu processo de mudança começou em Caraíva diante da exuberância de uma natureza que me fez despertar. Quis mudar minha alimentação para ser coerente com o que acredito. Não adianta só cuidar do corpo, mas do que como também. Creio numa mudança integral. Voltei de lá sem comer carne, passei a praticar ioga, mas ainda com peixe e frango no prato. Meses depois, em agosto de 2018, parei todo o consumo com a orientação de uma nutricionista para a substituição adequada dos nutrientes”. Ela confessa que a única dificuldade foi deixar de comer peixe.





 

Já no ano passado, Natália foi além: “Passei a ter necessidade de também parar com os derivados de animais e já fazer minha transição para o veganismo. Estou em processo. Não consumo mais leite e derivados, ovo e, aos poucos, vou substituir o uso de sapato e bolsa de couro. Tudo tem a ver com meu olhar de preservação da natureza, da saturação das cidades, da vida no planeta. Até mesmo profissionalmente. Comecei a desenvolver uma linha natural, a Cira Cosméticos, para cabelos cacheados, já que tenho um estúdio de beleza e a maioria dos produtos têm muita química e agridem demais os fios. É um propósito maior, não só de saúde, mas em ser coerente com a vida”.

 

Natália revela que neste processo que se solidificará ao longo de 2020 ela acabou influenciando o marido, Marcelo: “Ano passado, ele também começou a querer mudar, ser vegetariano. Já deixou de comer carne e conta que se sente bem melhor, mais disposto”.

 

Para Nágila Damasceno, o consumidor nos países desenvolvidos, sobretudo na Europa, já adquiriu um nível de consciência elevado, ou seja, é capaz de pagar mais pelo melhor para sua saúde e também pensando no coletivo e na sustentabilidade. “Nos países emergentes, dados de tendência do Euromonitor International mostram que essa conscientização é crescente. Essa mudança de perfil exigirá que as indústrias e o comércio de alimentos atendam às expectativas desse público crescente, já que correm o risco de ter perdas econômicas reais até 2023. No Brasil, O guia alimentar para a população brasileira recomenda o resgate da alimentação natural, do cozinhar em casa, do ir à feira livre. Pequenos comportamentos perdidos nas grandes cidades, mas que, atualmente, apresenta um forte impulso social. Outra tendência mundial e também nacional se associa à frase “eu quero um mundo sem plástico”. Essa decisão do consumidor impactará cada vez mais as indústrias e o comércio de alimentos porque a população, sobretudo os mais jovens, tenderá a escolher alimentos livres de embalagens primárias e secundárias contendo plástico. A opção em fornecer embalagens recicláveis, retornáveis e biodegradáveis deve ser um apelo de marketing, que encontrará cada vez mais adeptos dispostos a pagar mais a favor da sustentabilidade.”





 

Menos doenças

Na visão de Nágila Damasceno, a opção pelo vegetarianismo tem um cunho científico e social. “De fato, somente no Brasil, entre 2016 e 2017, 166 mil pessoas passaram a se autodeclarar vegetarianas. As evidências científicas fundamentam essa opção ao mostrar que indivíduos vegetarianos têm menor incidência de doenças cardiovasculares, obesidade, diabetes, câncer, além de serem mais longevos. Paralelo ao número crescente de estudos confirmando os benefícios do vegetarianismo, temos o compromisso social que muitas pessoas têm assumido com o meio ambiente. A sustentabilidade da cadeia produtiva da carne tem sido questionada porque envolve o desmatamento de grandes áreas, as queimadas, o uso de grandes volumes de água, o transporte mais oneroso, o uso de hormônio nas criações intensivas, a geração de CO2, até a morte animal. Portanto, até países como o Brasil devem ter o consumo de carne desacelerado nos próximos anos.”

 

Neste caminho de mudança do comportamento alimentar, Nágila Damasceno lembra que a busca por produtos orgânicos tende a aumentar: “Sim, os orgânicos vieram para ficar, embora o custo ainda seja proibitivo a muitos consumidores. Embora os alimentos orgânicos não sejam uma novidade, o número de consumidores conscientes tem crescido. Fato que deverá manter esse mercado aquecido e possivelmente favorecerá a redução do preço final.”


À mesa, sem pressa
Pesquisa revela o comportamento do brasileiro na hora das refeições em 2019 e quais são as mudanças de hábito para 2020. Seis em cada 10 gostariam de se alimentar com mais calma


(foto: Kerstin Riemer/Pixabay )

Em alguma medida, em algum momento da existência se faz necessário pisar no freio e reduzir a velocidade do ritmo da vida contemporânea. Que tal começar no momento das refeições? Na hora de alimentar o corpo e, por que não, o espírito? Pode ser um compromisso em 2020, já que é “inútil forçar os ritmos da vida. A arte de viver consiste em aprender a dar o devido tempo às coisas”, bem disse Carlo Petrini, jornalista italiano fundador do movimento slow food, em 1986, seguro de que é preciso melhorar a qualidade da alimentação e arranjar tempo para a saboreá-la, o que proporcionará um cotidiano mais prazeroso. Garantir tempo para apreciar a comida implica maior bem-estar.



Esse, aliás, é o desejo de muitos brasileiros em 2020 que acordaram para a importância da saúde alimentar. E ele vem impulsionado pela constatação de que as refeições de 2019 não foram adequadas ou ideais. A observação traz consciência e faz mudar. Pensando nisso, a Hibou, empresa de pesquisa e monitoramento de consumo, entrevistou digitalmente mais de 1.800 brasileiros entre 16 e 75 anos em todo o país, que fazem no mínimo uma refeição fora de casa entre segunda e sexta-feira, analisando o comportamento de cada refeição, café da manhã, almoço e jantar.

“O brasileiro está tentando se alimentar melhor, olhando mais para o que põe no prato, optando por composições mais saudáveis, porém sem deixar de lado os prazeres da comida. A busca é pelo equilíbrio, que para quem come fora é mais difícil porque bufês e quilos oferecem diversidade convidativa ao exagero”, destaca Ligia Mello, fundadora do Hibou, coordenadora da pesquisa sobre a maneira como o brasileiro gostaria de se alimentar. Para ela, o brasileiro busca melhorar a alimentação, “mas a falta de conhecimento do que combinar em um prato saudável atrapalha, junto com a indulgência de quem come na rua e está sempre com pressa e qualquer alimento serve”.

DELIVERY E FAMÍLIA


"O brasileiro está tentando se alimentar melhor, olhando mais para o que põe no prato, optando por composições mais saudáveis, porém sem deixar de lado os prazeres da comida" - Ligia Mello, fundadora do Hibou, empresa responsável pela pesquisa (foto: Victor Oliveira/Divulgação )
Ligia Mello revela outra lucidez que merece atenção no comportamento dos brasileiros: “Comer fora e tentar não voltar ao trabalho à tarde cheirando a gordura é uma percepção em diversas cidades. A roupa entrega onde você almoçou. Em casa, o principal foco de melhoria é no jantar, que as pessoas tentam comer melhor e mais cedo, já contemplando uma noite de sono mais saudável. Para quem não consegue fazer sua comida, o pedido de delivery tarde da noite com opções mais saudáveis, deixando de lado pizzas e lanches, é o mais bem-vindo”.



Na pesquisa, Ligia Mello destaca que seis em cada 10 brasileiros gostariam de se alimentar mais cedo e mais leve, já que acreditam que dormiriam melhor dessa forma. Nos jovens abaixo dos 30 anos, sete em cada 10 pensam da mesma forma. “Para 2020, o brasileiro gostaria de ter um sono melhor, podendo se alimentar mais cedo, com mais saladas, e reduzindo o consumo de cafeína. O lanchinho noturno, só se extremamente necessário, trocando o pão por alimentos mais saudáveis e leves, como barras de cereais, sementes, frutas e leite. Ele quer resgatar a refeição em família, e menos celulares à mesa.”

Soja e mandioca

Pesquisador da Embrapa Soja e um dos vencedores do prêmio Péter Murányi 2008, o professor José Marcos Gontijo lembra que outra mudança é a crescente busca dos brasileiros por alimentos livres de lactose, como a soja, seja por intolerância ou adesão a um estilo de vida: “A soja apresenta um excelente valor nutricional, principalmente quanto ao seu elevado valor proteico. É uma ótima fonte de minerais como ferro, cálcio, magnésio e potássio e de diversas vitaminas. É uma boa opção para veganos e vegetarianos. Aliás, há várias classes de alimentos que podem se tornar excelentes opções para veganos e vegetarianos, como as leguminosas de modo geral, os novos cereais (quinoa), bem como os já mais conhecidos, como centeio, aveia, cevada e trigo sarraceno”.

Já a engenheira-agrônoma pela Esalq/USP Teresa Vale Losada, vencedora do prêmio de 2012, aposta em um alimento tipicamente brasileiro como o ideal para esse público: “A mandioca é uma excelente fonte de energia para substituir cereais como o arroz, milho, trigo etc. A raiz e a farinha (o mais importante derivado para alimentação humana) são ricos em fibras comparativamente ao arroz branco, alguns sais minerais e vitaminas. Mas a mandioca é principalmente uma opção energética, barata e de boa qualidade, que se adapta às condições agrícolas brasileiras. E pode aumentar-se o consumo por meio de incentivo nas escolas e instituições públicas, e estabelecer políticas públicas que recuperem os hábitos saudáveis, com alimentos minimamente processados”.

Saúde alimentar
Resultados da pesquisa com brasileiros sobre as três principais refeições do dia


Café da manhã


(foto: Randy Fath/Unsplash)

Para 35% dos brasileiros entrevistados na pesquisa da Hibou, o café da manhã deveria ser uma boa refeição, mas hoje não a consideram ideal. Entre os jovens, esse número sobe para 41%. Como expectativas para 2020, o brasileiro pretende beber mais sucos e leites e deixar o café preto para depois do almoço ou no lanche da tarde. Trocar os petiscos gordurosos por snacks saudáveis. Incluir grãos sem glúten, torradas integrais, geleias naturais e produtos orgânicos locais. Menos açúcar também foi citado, e para substituí-lo de manhã pretende-se incluir mais frutas.



64% dos brasileiros acreditam que poderiam ter mais tempo no café da manhã

43% acreditam que essa refeição poderia ser mais saudável

48% disseram que deveriam reduzir o açúcar

38% gostariam de mais frutas

32% variariam o cardápio

26% gostariam de comer menos pão

81%
dos brasileiros tomam o café da manhã em casa

67% tomam o segundo café no trabalho ou no local de estudo

Almoço


(foto: Stefan Vladimirov/Unsplash)

A pesquisa mostrou que 40% dos brasileiros almoçam mais de três vezes por semana. Número que sobe para 49% entre os jovens. Na hora do almoço, a maior reclamação é não conseguir manter uma dieta balanceada. Em 2019, o brasileiro já modificou um pouco seu comportamento, já que 49% introduziram mais saladas no prato. Porém, 61% ainda acham que não é o suficiente. Para 2020, o brasileiro gostaria de ter acesso a um conteúdo colaborativo, em que ele pudesse buscar mais informações sobre os alimentos que está consumindo, compartilhar suas experiências.

73%
disseram que poderiam montar pratos mais saudáveis

71% gostariam de reduzir o consumo de frituras

68% gostariam de poder comer com mais calma

51% acreditam que poderiam reduzir o consumo de refrigerantes

40% evitariam bufês, já que misturam muitos tipos de alimentos

33%
acreditam que poderiam consumir mais frutas

43% tentam se alimentar com marmitas preparadas em casa

61%
consideram uma refeição completa se for finalizada com sobremesa, fruta ou café

Jantar


(foto: Sharon Ang/Pixabay )

O jantar é a refeição mais praticada em casa pelo brasileiro. Entre os com mais de 30 anos, 77% jantam em casa no mínimo seis vezes por semana. Já nos abaixo dos 30, esse número cai para 68%. Apesar de ser a refeição mais feita nos lares, é também a mais negligenciada: 56% nem pensam no assunto até sentir fome. Entre os jovens brasileiros esse número sobe para 63%. Chamou a atenção um dado: o pãozinho está presente tanto no jantar quanto no café da manhã. Nada menos que 81% dos entrevistados afirmaram ter o pão presente nas refeições noturnas. Ao menos uma pessoa da casa inclui esse alimento no jantar.

64% acreditam que poderiam planejar o jantar antecipadamente

43% disseram que poderiam comer algo mais leve e saudável

49% gostariam de reduzir o pão e similares

40% gostariam de evitar o consumo de comida pronta

37%
disseram que poderiam introduzir mais verduras e legumes

33% poderiam reduzir o consumo do café

Educar o consumidor
Para selecionar o que o brasileiro vai colocar no prato, é urgente a consciência do desperdício. Mais de 30 milhões de toneladas de alimentos vão para o lixo. As pessoas comem muito e mal


41kg é a média de comida que cada brasileiro manda para o lixo por ano (foto: Couleur/Pixabay )

A consciência não só do que escolhe comer na hora das refeições como também o cuidado para evitar e combater o desperdício do alimento faz parte do compromisso que todo brasileiro deveria assumir em 2020. Acadêmicos, especialistas, governo, autoridades e a população têm de lutar e buscar mudanças que serão benéficas não só para as pessoas como para o meio ambiente e a economia. É uma cadeia.



Infelizmente, o Brasil descarta por ano quase 37 milhões de toneladas de lixo orgânico, basicamente restos de alimento, ainda que milhares não tenham o que comer ou não possam escolher. Por ano, cada brasileiro manda para o lixo mais de 41 quilos de comida. Em uma família com três moradores, esse volume chega perto dos 130 quilos. É o que aponta levantamento com quase 700 famílias feito pela Fundação Getulio Vargas em parceria com a Embrapa. Hábito terrível repetido em todas as classes sociais. Com tantas pessoas no mundo, e no país, passando fome, como lidar com o desperdício de alimentos?

O professor Marcos David Ferreira, da Embrapa Instrumentação, explica que é importante deixar clara a definição do que é perda e desperdício. “Em definições internacionais, padronizadas pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), perda é aquele produto que sai do campo e não chega ao consumidor, perde ou estraga pelo caminho. Já desperdício é o alimento pronto para consumo que é jogado fora. Infelizmente, no Brasil os valores são altos em ambas as situações.”

Marcos David Ferreira enfatiza que, no caso das perdas, de cada 10 caixas produzidas, dependendo do produto, quatro a cinco são jogadas no lixo. Aliados aos dados de desperdício, os valores são enormes. “O mundo passou de um pós-guerra com escassez de alimentos para uma oferta abundante de comida, e mesmo em países que sofreram diretamente com guerra as gerações posteriores não têm, muitas vezes, essa consciência. No Brasil, o agravante é que por sermos um país tropical/subtropical, praticamente tivemos que reinventar a agricultura, criando uma situação muito diferente, na qual somos autossuficientes nos principais itens da alimentação e grandes exportadores no agronegócio. Mas desperdiçamos muito, jogamos grandes quantidades de comida fora. E a pergunta principal é como alterar essa situação..”

Para Marcos David Ferreira, um dos pontos principais é a conscientização – tanto na questão socioambiental, como no impacto no orçamento familiar. Menos desperdício significa lixões menores e mais dinheiro para as famílias. “Existem outras faces, como a ausência de políticas públicas claras para combater o desperdício, em especial no setor de alimentação, como restaurantes, hotéis etc., em que a legislação restringe a distribuição de alimentos.”

No entanto, há aspectos positivos. Marcos David Ferreira destaca que ações louváveis são da Mesa Brasil Sesc, com uma rede nacional de bancos de alimentos e também de ONGs como banco de alimentos e de associações como a Associação Brasileira de Supermercado (Abras). “Assim, com ações conjuntas não somente no final da cadeia – em nível de consumidor, mas com o setor produtivo, aliadas a políticas públicas –, podemos alterar essa situação.”

ENVELHECIMENTO

Também relevante, há outra questão que diz respeito ao envelhecimento da população brasileira. Além de saber escolher e não desperdiçar, é preciso saber o que comer. O professor Franco Maria Lajolo, do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da USP e vencedor do prêmio Péter Murányi de 2016, alerta que a população está envelhecendo, mas sem cuidar do que está ingerindo. As pessoas comem muito e mal. Estamos lidando com variados problemas de obesidade e deficiências nutricionais. “Para enfrentar essa situação, um caminho que se vem desenhando é a nutrição personalizada. Já existe um bom número de pesquisas mostrando a relação entre genes e a necessidade de nutrientes. Essa tendência estará consolidada em cinco ou 10 anos.”

Franco Maria Lajolo, professor da USP, alerta que a população está envelhecendo, mas sem cuidar do que está ingerindo (foto: Premio Peter Muranyi/Divulgação )

Franco Maria Lajolo enfatiza que há uma aliada, que é a inteligência artificial: “O uso de tais tecnologias já permite, por exemplo, a composição da tabela de nutrientes. E, futuramente, serão aplicadas nos smartphones e outros dispositivos. A inteligência artificial empodera o indivíduo a construir sua própria dieta, de acordo com seus hábitos e sua genética”.



Porém, Franco Maria Lajolo avisa que há um desafio a curto prazo: o combate às fake news e seus efeitos sobre a nutrição. “Reduzir a ingestão de gorduras saturadas, de açúcar e de sal são as maiores tendências na indústria dos alimentos. As notícias falsas passam informações que não estão associadas à ciência. É preciso ensinar o consumidor a buscar conhecimento.”

Dicas para evitar o desperdício

1. Nunca vá às comprar sem saber o que já tem em casa na geladeira, na despensa

2. Cuidado com os alimentos perecíveis.  Compre somente a quantidade pedida na receita ou se programe para ir mais vezes ao supermercado, feira ou sacolão

3.
Saiba o que vai cozinhar na semana para só comprar o necessário

4. Sempre dê preferência ao que é da época: verduras, legumes e frutas

5. Tenha o hábito de levar às compras uma lista para não comprar mais do que deve e precisa

6. Aprenda a condicionar de maneira adequada os alimentos para que, mesmo na geladeira, não estraguem antes do tempo

7. Busque conhecimento e saiba como aproveitar integralmente os alimentos: folhas, talos e cascas. Sabia que as sementes de abóbora podem ser torradas no forno e servidas como petisco?

8. Abandone o preconceito contra a comida requentada. O que sobrou e foi para a geladeira, dentro do prazo, mantém o sabor e pode ser consumido. Ou, se preferir, também pode ser transformado em outras receitas. O arroz, retemperado, pode virar um delicioso bolinho.

Enquanto isso... Agrotóxicos liberados

Ao mesmo tempo em que existe a preocupação com o que comer, o que é saudável, a qualidade do alimento, há o medo por parte da população com o uso exagerado dos agrotóxicos no Brasil. Medo dos hormônios nos animais e dos venenos nos vegetais. Muitas perguntas, inúmeras dúvidas e respostas pouco convincentes. A realidade é que o Ministério da Agricultura publicou no Diário Oficial da União, em 27 de novembro de 2019, autorização do registro de mais 57 agrotóxicos no Brasil (55 são produtos genéricos, ou seja, com base em ingredientes ativos que já estavam presentes em outros produtos existentes no mercado).

Ao todo, somente em 2019, foram liberados 439 desses produtos pelo governo. De acordo com a pasta, o objetivo é aumentar a concorrência no mercado e diminuir o preço dos defensivos, o que faz cair o custo de produção. Por outro lado, parte da sociedade se preocupa em demasia porque os agrotóxicos impactam a saúde pública, podendo causar intoxicações e doenças como o câncer.



Dados de 2019, apresentados no livro A geography of agrotoxins use in Brazil and its relations to the European Union, da editora FFLCH/USP, revelam que diversos agrotóxicos não aprovados, por exemplo, em países da União Europeia são autorizados pelo governo brasileiro. Estima-se que 4.500 pessoas sejam intoxicadas por ano por esses produtos no Brasil.

No país, maior consumidor de agrotóxicos do mundo, segundo dossiê de 2008 da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), esses produtos estão relacionados a uma morte a cada dois dias por doenças agudas, sendo um terço suicídio e os outros dois terços por inalação por pessoas que os manipulam, segundo dados disponibilizados no livro da editora FFLCH/USP. Mas isso ainda é subnotificado.

Além disso, o livro detalha que os agrotóxicos têm ligação com mortes por efeitos diretos, por exemplo, devido ao consumo de alimentos contaminados. E efeitos indiretos, como na contaminação do lençol freático, o que tem relação com a incidência de tumores, mas que ainda não é quantificado, devido ao câncer ter múltiplas causas.