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Estado de Minas Festa dos mascarados

O significado das máscaras no carnaval

Enquanto a imagem do Coringa tem conotação pesada, adereços carnavalescos representam a leveza de sentimentos, a liberdade de se divertir sem o compromisso de prestar contas à sociedade


17/02/2020 11:00 - atualizado 17/02/2020 11:57

'No carnaval, literalmente, usamos máscaras que escondem nossa própria face e nos permitem diminuir as repressões sociais e assumir os mais diversos personagens%u201D - Marília Kallas, psiquiatra, psicanalista e membro da diretoria da Associação Mineira de Psiquiatria
"No carnaval, literalmente, usamos máscaras que escondem nossa própria face e nos permitem diminuir as repressões sociais e assumir os mais diversos personagens%u201D - Marília Kallas, psiquiatra, psicanalista e membro da diretoria da Associação Mineira de Psiquiatria (foto: Divulgação)
Além das máscaras invisíveis da vida real, do cotidiano, umas das mais antigas práticas humanas é o uso de máscaras para os mais diversos eventos e fins, de acordo com a cultura e a religiosidade de um povo. Dos egípcios aos gregos, dos contadores de história ao halloween e, claro, no carnaval, adereço indispensável à imaginação. E, por que não, de revelação. Engana-se quem pensa se tratar apenas de uma fantasia, de só diversão.

Se a máscara do Coringa tem conotação pesada, sofrida e sanguinária, é possível traçar um paralelo sobre o significado das máscaras usadas na festa do Momo. Marília Brandão Lemos de Morais Kallas, psiquiatra, psicanalista e membro da diretoria da Associação Mineira de Psiquiatria, afirma que “no carnaval, literalmente, usamos máscaras que escondem nossa própria face e nos permitem diminuir as repressões sociais e assumir os mais diversos personagens e fantasias que queiramos representar, tais como Colombina, Pierrot, rei Momo, entre outros, e viver a alegria e a folia com menos repressões sociais. A máscara do Coringa representa uma persona, uma parte do pacato cidadão Arthur Fleck, palhaço feliz, que naquele momento se apresentou e tomou conta de seu eu”.

Já Olinta Fraga, psicóloga junguiana, diz que o sucesso de bilheteria do filme Coringa ocorreu porque fez ressonância com o “coringa” que está em cada um de nós e também no plano coletivo. “Nosso lado miserável, irrealizado e também potente está na sombra do inconsciente e precisa ser reconhecido e realizado. Pode ocorrer para muitos indivíduos, mesmo sendo portadores de sucesso conforme os valores culturais vigentes, estarem muito distanciados de suas reais necessidades de autorrealização. No plano coletivo, há milhões de miseráveis como Artur Fleck (Coringa/Joaquin Phoenix) que perambulam pelas ruas do mundo, carentes absolutamente de tudo, pedindo uma chance de ser acolhidos e ouvidos na sua dor.”
 
BRUXAS E PALHAÇOS
 
Olinta Fraga afirma que temos várias personas porque exercemos inúmeras funções sociais: pai, mãe, filho, profissional, vizinho...
Olinta Fraga afirma que temos várias personas porque exercemos inúmeras funções sociais: pai, mãe, filho, profissional, vizinho... (foto: Euler Junior/EM/D.A Press)
Para Olinta Fraga, tudo sinaliza que a necessidade psicológica atual vai além de exaltar o herói e destruir o bandido em cada um de nós, como ocorreu quando torcíamos pela vitória do Batman sobre o Coringa. “O Coringa atual nos impactou porque nos revelou o que estava velado pela sua máscara, e consequentemente nos pede atenção às máscaras que vestimos e nem nos damos conta. Anualmente, em fevereiro, temos uma chance de experimentar por algumas horas facetas contidas e mesmo desconhecidas que nos habitam. O carnaval cumpre a função de abolir as diferenças num campo único onde reis, princesas, bruxas, sereias, palhaços e super-heróis convivem harmoniosamente. Posso ainda experimentar meu lado masculino ou feminino. São algumas horas nas quais o convite é guardar nossas máscaras sociais cotidianas e dar passagem, pelo anonimato adornado por uma máscara escolhida, a aspectos de nossa verdadeira natureza.”

Enfim, enfatiza a psicóloga, “já chega de acreditar e procurar o Coringa no outro próximo ou estrangeiro. Experimente, sem medo, na intimidade, baixar as máscaras e examinar o que encontra. Isso não é fácil, mas sempre se pode pedir ajuda a um profissional”.

E Leonardo Torres, psicoterapeuta junguiano e doutorando em comunicação, reforça que “nós não somos diferentes: todos temos tristezas, frustrações e dúvidas. Resta-nos entender as nossas e não apontar dedos para as do indivíduo ao lado. O lado sombrio e negativo da vida é inevitável. A única coisa possível de se fazer é escolher o que fazer com elas”.

Símbolos de comunicação e expressão

Yubertson Miranda, ou, como é mais conhecido, Yub Miranda, astrólogo, numerólogo, tarólogo, formado em filosofia pela PUC Minas e simbologista, traduz com profundidade as máscaras humanas que se revelam no carnaval. Momento dos mais oportunos. Para ele, “as máscaras de carnaval podem ser vistas como símbolos, tal como uma tatuagem. Mas uma espécie de tatuagem de verão. Daquelas que colocamos na praia e saem após o dia. Queremos sentir por breves momentos os sentimentos que essas imagens simbólicas veiculam. E expressá-los dentro de um contexto carnavalesco, o qual é mais livre. Não temos o peso do julgamento social durante esta época. E, com isso, damos vazão ao que desejamos transmitir por meio das máscaras que usamos na festa de Momo”.

'Não temos o peso do julgamento social durante o carnaval. E, com isso, damos vazão ao que desejamos transmitir por meio das máscaras que usamos na festa de Momo%u201D - Yub Miranda, astrólogo, numerólogo, tarólogo, formado em filosofia e simbologista
"Não temos o peso do julgamento social durante o carnaval. E, com isso, damos vazão ao que desejamos transmitir por meio das máscaras que usamos na festa de Momo%u201D - Yub Miranda, astrólogo, numerólogo, tarólogo, formado em filosofia e simbologista (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press - 2013 24/12/2019)

Segundo ele, cada máscara manda um recado. “A verdade é que as análises demonstram a relevância das máscaras como dispositivos para projeções interiores e exteriores que facilitam processos de autoconhecimento e de desenvolvimento da oralidade em público. Percebe-se, ainda, que há diversidade na manifestação e expressão de pensamentos e sentimentos.”

Qual a sua máscara?

Veja a interpretação de Yub Miranda sobre o significado de alguns clássicos do carnaval

 
» Troca de gênero

"Pode ser que essas máscaras sejam o meio pelo qual nós possamos expressar uma atitude desprovida de preconceito. Queremos dar vazão à liberdade de ser: de ser diferente, de ser fora dos padrões convencionais da sociedade."

» Desenhos animados

"Estar com a máscara de personagens de filmes ou desenhos marcantes pode indicar o quanto gostamos do tipo de história ali contada. A saga de cada personagem é uma jornada que admiramos, com que nos identificamos. Talvez por já termos vivido algo semelhante em nossa vida ou por almejar ter uma aventura similar à desses desenhos e filmes."

» Pessoas famosas, poderosas, históricas

"A máscara desse perfil é uma espécie de crítica ou de reverência a essa pessoa. Porque queremos mostrar o quanto não concordamos ou o quanto aprovamos as decisões mais marcantes que tal personalidade tomou em sua vida."

» Profissões

"Cada profissão tem suas peculiaridades. A máscara de carnaval de enfermeira ou de médico, por exemplo, pode transmitir a disponibilidade do folião de cuidar. Um desejo, muitas vezes inconsciente de oferecer seu colo, seu carinho, seus cuidados a outra pessoa dentro de um clima romântico durante o período carnavalesco. Pode indicar uma predisposição em começar um relacionamento nesta época."

» Super-heróis

(foto: Jeff Chabot/Pixabay )

"Cada herói ou personagem favorito tem características que admiramos. E a máscara dele pode justamente ser uma forma de dizer ao mundo que amamos essas qualidades. Além de revelar o quanto desejamos também ser assim, agir como esses personagens agem."

» Animais

"No xamanismo há uma experiência em que se busca conhecer qual é o seu animal de poder. As características desse podem representar um perfil de nossa personalidade ou o tipo de comportamento que precisamos desenvolver e expressar. Essa máscara de animal pode justamente enaltecer a nossa identificação com esses atributos ou o desejo de vivenciá-los."

(foto: M W/Pixabay )
» Monstros, filmes de terror

"Na psicologia analítica (também conhecida como junguiana), existe uma faceta comuma todas as pessoas: a sombra. Ela representa tudo aquilo que tentamos reprimir em nós pelo fato de a sociedade condenar, considerar algo sujo, feio, monstruoso. Pessoas que usam as máscaras de monstro durante o carnaval podem - inconscientemente - desejar mostrar esse lado sombrio e assustador de si. Ou, muitas vezes, alguém que tende a ter uma personalidade mais tímida, receosa, insegura, quer nesta época causar medo nas pessoas, isto é, sair da condiçãode 'ser assustada' pelo mundo, pelas figuras de autoridade, pelas duras realidades da vida. E 'trocam de posição', sendo nesses dias aquele que 'assusta'."

» Contos de fadas


(foto: William Adams/Pixabay)

"Cada conto de fadas tem sua lição. Muitas vezes, a máscara desse conto é uma mensagem: admiramos os aprendizados e os tipos de situações mais marcantes de determinada estória."

» Sereias, unicórnios...


"Tais máscaras podem indicar o quanto amamos fantasia e estamos com a predisposição neste período de carnaval em acreditar no impossível ou em esquecer bastante a realidade."


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