A sequência de violência da qual foi vítima o ator e o cantor Lucas Penteado, no BBB 21, foi terrível. De maneira vil, articulada e violenta, pessoas-jogadoras, quase todas elas, uniram-se contra o rapaz, acusando-o, xingando-o, rejeitando-o, humilhando-o, destratando-o, pondo em causa a sua verdade, a sua sinceridade, a sua existência. Classificado por “abusador”, “aproveitador”, “falador”, Lucas não aguentou a pressão e saiu da Casa.
Em explícito sofrimento, perseguido, Lucas parecia uma vítima tradicional do bullying, aquela que não consegue nem se defender e nem consegue que quem assiste a sua degradação a defenda.
As pessoas que violentaram Lucas o fizeram de modo perverso, atacando-o, desferindo golpes, usando uma espécie de “ética” e de “verdade”, uma justiça bárbara e coercitiva. Juntam-se muitos para perseguir um, é comum em casos de bullying.
As pessoas que violentaram Lucas o fizeram de modo perverso, atacando-o, desferindo golpes, usando uma espécie de “ética” e de “verdade”, uma justiça bárbara e coercitiva. Juntam-se muitos para perseguir um, é comum em casos de bullying.
Lucas teria, em um dado momento do jogo, numa festa, regada, como sempre, a muita bebida alcoólica, comportado-se de modo inadequado com algumas pessoas da casa. Isto foi o suficiente para que a hostilidade e a toxidade dessem o tom da convivência e Lucas passasse a ser tratado como uma espécie de “escória”, “indesejado”, “nocivo”, “escroto”. Os que o violentaram o fizeram sem qualquer réstia de empatia.
Em 2014, nos Estados Unidos, um adolescente negro, Lamar Howkins, matou-se no banheiro da escola, a Greenwood Lakes.. Segundo a sua mãe, Lamar foi vítima de perseguição sistemática, de abusos físicos e emocionais. Assim como no caso de Lucas, quem violentou Lamar não teve sentimento de compaixão, de compreensão, não se importou com o sofrimento do adolescente. E ele ceifou a vida.
No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, entre os anos de 2012 e 2016, para cada 100 mortes por suicídio de homens-jovens-brancos, houve 145 mortes por suicídio de homens-jovens-negros. 45% a mais quando comparados os números entre uma etnia e outra. Lucas é negro. Lamar era negro. O racismo estrutural, sutil e criminoso, dilacerante e adoecedor é certamente matriz dessas tragédias.
No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, entre os anos de 2012 e 2016, para cada 100 mortes por suicídio de homens-jovens-brancos, houve 145 mortes por suicídio de homens-jovens-negros. 45% a mais quando comparados os números entre uma etnia e outra. Lucas é negro. Lamar era negro. O racismo estrutural, sutil e criminoso, dilacerante e adoecedor é certamente matriz dessas tragédias.
Ocorre que, no caso de Lucas, além do racismo, houve bifobia, homofobia, machismo, adultocentrismo. Numa palavra, houve muita maldade, perversidade, julgamento e condenação. Elementos que são campo fértil para a emergência do sofrimento, logo para a existência de psicopatologias, de comportamentos autodestrutivos, de doenças mentais das mais diversas e de difícil tratamento.
O bullying surge em espaços e tempos nos quais nas convivências não há diálogo, reflexão e cuidado, mas há preconceito e ruindade. Esse tipo de violência envolve frequentemente pessoas egocêntricas, vaidosas, agressivas, com baixa autoestima, vítimas de abuso sexual, inseguras, autoritárias, impulsivas, frias, calculitas, dissimuladas, vulneráveis de alguma sorte. Quando expulso da mesa, no momento das refeições, Lucas não reagiu. Preferiu o silêncio. Aceitou para não guerrear.
É uma estratégia de sobrevivência. Tornar-se invisível. Não dizer mais nada. Tentar agradar. Submeter-se. De alguma maneira, acreditar que quem o violentava tinha razão e o que cabia a ele, era acatar.
Antes de se matar, Lamar Howkins suportou humilhação, destrato, covardia. Realmente, não sei se as forças econômicas que sustentam o reality show em questão estão interessadas nesta minha reflexão, mas deveriam.
É uma estratégia de sobrevivência. Tornar-se invisível. Não dizer mais nada. Tentar agradar. Submeter-se. De alguma maneira, acreditar que quem o violentava tinha razão e o que cabia a ele, era acatar.
Antes de se matar, Lamar Howkins suportou humilhação, destrato, covardia. Realmente, não sei se as forças econômicas que sustentam o reality show em questão estão interessadas nesta minha reflexão, mas deveriam.
Segundo a OMS, o suicídio de pessoas entre 15 e 29 anos de idade é a segunda causa morte no mundo e a terceira causa morte no Brasil. Ocorre-me uma questão: para além de supostamente entreter, o que quer realmente o BBB 21? O que objetiva? Qual a sua mensagem? Qual o seu compromisso com os jovens que lhe dão audiência? Ou nada disso é relevante? Isso não tem qualquer relevância?
*Professor, pesquisador, historiador e terapeuta