Dove/Divulgação


Pesquisa realizada em dezembro de 2020 pela Dove revela o impacto do uso das redes sociais e filtros na autoestima de meninas entre 10 e 17 anos nos Estados Unidos, Inglaterra e Brasil.

No país, a pesquisa foi conduzida pela Edelman Data & Intelligence com 503 meninas entre 10 e 17 anos e 1.010 mulheres entre 18 e 55 anos. Segundo o estudo, 84% das brasileiras com 13 anos já aplicaram filtro ou usaram aplicativo para mudar sua imagem em fotos.

Além disso, 78% delas tentam mudar ou ocultar pelo menos uma parte ou característica do corpo de que não gostam antes de postar uma foto de si mesmas das redes sociais.

“Esse cenário é ocasionado, principalmente, pelos padrões de beleza socialmente aceitos, intensificados pelas imagens distorcidas digitalmente. Esses padrões influenciam e pressionam cada vez mais jovens a distorcerem suas imagens em busca desse ideal de beleza, que não pode ser alcançado”, comenta Fernanda Gama, gerente da Dove no Brasil.
 
Não à toa, os dados da pesquisa apontam que 89% das jovens compartilham suas selfies na esperança de receber validação de outras pessoas. Além disso, ferramentas de edição, que antes eram disponíveis apenas para profissionais, agora podem ser acessadas pelos jovens com o toque de um botão, sem regulamentação específica.

“Essas ferramentas têm forte apelo de criatividade e autoexpressão, mas, quando usadas para esconder características do corpo e moldar aparência para atender a padrões de beleza, podem se tornar prejudiciais para a autoestima das jovens.”

Segundo a gerente da Dove, é por isso que, após um ano de maior tempo na tela e maior exposição a ideais de beleza irreais, nunca houve um momento mais importante para falar sobre isso e agir.

Outros dados relevantes do estudo mostram, ainda, que, nesse contexto de redes sociais, 35% das jovens brasileiras dizem se sentir “menos bonitas” ao ver fotos de influenciadores e celebridades. Além disso, os índices mostram que quanto mais tempo as meninas passam editando suas fotos, mais elas relatam baixa autoestima corporal.

Sessenta por cento das que passam entre 10 e 30 minutos editando as imagens dizem ter baixa autoestima. A pesquisa também retrata que meninas que distorcem suas fotos são mais propensas a ter baixa autoestima corporal (50%) em comparação com as que não distorcem suas fotos (9%).

Para a psiquiatra Jaqueline Bifano, isso tem muito a ver com a maior conexão e contato com as redes sociais. “Atualmente, vemos crianças e adolescentes com perfis reais e com vários seguidores. Nesses aplicativos, temos contato com influenciadores digitais, atores e com os famosos filtros, uma brincadeira que tem levado pessoas a desenvolverem transtornos, como o dismórfico corporal, que faz com que o indivíduo tenha uma visão distorcida de si.”

A pandemia da COVID-19 veio como agravante. Estamos mais tempo dentro de casa e não podemos nos relacionar com outras pessoas. Isso acaba sendo mais um motivo para ficarmos mais tempo no celular e aplicativos.

“Por mais que haja um movimento para acabar com a padronização da beleza, ainda assim estamos expostos a todo tempo. Se não tomarmos cuidado, isso pode mexer conosco, que somos adultos. Imagine com o comportamento de adolescentes, que estão passando por um período de mudanças e desenvolvimento evolutivo”, comenta.

Ela considera importante que a autoestima seja educada. No entanto, muitas vezes, ocorre o contrário. “Nessa fase da vida, jovens passam por mudanças hormonais que acabam gerando alterações físicas, como espinhas, pelos indesejáveis e gordura localizada. Tudo isso mexe muito com a autoestima, somado às horas nas redes sociais vendo pessoas da mesma idade com pele e corpo perfeitos, e também artistas impecáveis, o que prejudica ainda mais o emocional do paciente.”

 
PADRÃO INSTAGRAM 


A estudante L.N., de 13 anos, que não quis se identificar, sofre isso na pele. Segundo ela, na maioria das vezes, por não gostar de algumas características em si, sente-se mal quando não faz uso de aplicativos em suas fotos.

“Uso apps de edição e filtros desde sempre, por ajudar a aumentar a minha autoestima e corrigir iluminação e outras coisas. E como atualmente tudo é postado, as pessoas impõem um padrão a ser seguido, fazendo com que façamos o máximo para ser igual às meninas que o Instagram mostra”, conta. “Muitos ficam nos comparando com outras pessoas, julgando quem somos, e isso acaba nos deixando mal e cada vez mais tristes”, diz.

O resultado, segundo Jaqueline Bifano, é que meninas cada vez mais novas acabam insatisfeitas com a própria imagem, tendem a sair e a socializar menos. “O uso excessivo das redes sociais é uma das principais causas do transtorno dismórfico corporal, desencadeando quadros de ansiedade e depressão”, aponta a especialista.

A psiquiatra explica que, aos poucos, a ausência de traços “perfeitos” faz com que, para além dos filtros, as pessoas queiram modificar aspectos da face ou do corpo, já que tudo o que não encaixa nos filtros passa a ser visto como algo que precisa de mudança. A jovem L.N. já sente essa consequência. Isso porque, além de ter o desejo de engordar para atingir o padrão de corpo socialmente ideal, ela já quis fazer rinoplastia. “Não gosto do meu nariz. Queria ser como as meninas que vejo”, desabafa.

Essas ferramentas têm forte apelo de criatividade e autoexpressão, mas quando usadas para esconder características do corpo e moldar aparência para atender a padrões de beleza podem se tornar prejudiciais para a autoestima das jovens

Fernanda Gama, gerente da Dove no Brasil

 
Segundo o dermatologista Lucas Miranda, essa relação é real. “Esses aplicativos aparecem mostrando padrões irreais de beleza e têm, sim, impactado na vida de inúmeras meninas e mulheres, como revelado pela pesquisa. É algo que nós, dermatologistas e cirurgiões, temos percebido com frequência no consultório. Um número cada vez maior de meninas e mulheres querendo, de alguma forma, melhorar algo na aparência para se sentirem melhores.”

No caso de adolescentes, isso pode ser um fator agravante. A pré-adolescência é marcada por muitas mudanças físicas que geram problemas com a autoestima. O dermatologista afirma que o que conta, e muito, é o bom senso do médico para saber se a queixa realmente tem fundamento ou se é algo que a paciente está enxergando sem precisar de mudanças.

“Não existe idade mínima para realizar procedimentos estéticos. Se algo incomoda e tem impacto psicossocial, isso pode e deve ser corrigido. Mas existe um limite, que é algo tênue, da supervalorização de queixas, muitas vezes aumentadas pelo uso desenfreado de redes sociais e exposição a essa falsa realidade do padrão de perfeição.”

Lucas Miranda, dermatologista

Lucas Miranda, dermatologista

Leca Novo/Divulgação
Lucas Miranda diz que, na primeira consulta, é válido que o médico observe o paciente por completo, avaliando se existe algum disformismo na fala, mesmo que sutil, para entender o limite entre o que realmente o incomoda fisicamente e o prejudica em âmbito social e o que se enquadra em um transtorno de imagem.

“Todos nós, por mais que queiramos mudar algo, temos características individuais e que fazem parte da nossa essência. Não adianta querer ou tentar ser como o outro, pois somos diferentes e essa é a graça da vida.”


AUTOESTIMA E AUTOACEITAÇÃO


É muito importante que os pais estejam sempre “lado a lado” ao filho para antever problemas e se apresentar como ajuda e escuta. “Se nossa face e corpo não obedecem à perfeição das redes, é comum que sentimentos como baixa autoestima comecem a surgir. Esse universo de sofrimento pode acontecer com todos.

Os pais devem ficar atentos a essa pressão e começar a perceber sinais, pois é bem provável que o jovem não esteja mais se vendo e se aceitando como é. E a forma de se igualar ao mundo idealizado pelas redes é por meio dos filtros ou busca por mudanças”, aponta o psicólogo Lucas Morelli.

Para o especialista, é válido falar, também, sobre a autoaceitação, mostrando aquilo que a criança tem de bom e não o que ela precisa ser ou ter para se sentir bem. O que é colocado nas redes sociais é irreal. Por trás da vida perfeita, as coisas mudam totalmente.

Pessoas que já têm transtorno mental e baixa autoestima precisam procurar ajuda profissional para orientá-las. “Elas precisam de alguém para ajudá-las enxergar a beleza que existe dentro delas. E essa beleza vai muito além da aparência física. O que vale é o que somos enquanto pessoas. Nada disso tem a ver com nossa beleza ou não. A imagem é importante. Mas todos temos defeitos e qualidades.”

CUIDE-SE!


Dicas para ajudar no processo de autoaceitação

» Gaste menos tempo em redes sociais e procure outras formas de lazer, principalmente com pessoas reais. Diga não aos filtros na face!

» Converse com outras pessoas sobre o que está acontecendo para saber que todos nós, de alguma forma, temos defeitos e qualidades.

» Lembre-se: é impossível agradar a todos, e as pessoas que importam estão interessadas em você, independentemente de filtro e procedimentos estéticos ou não.

» Não se esqueça de que se comparar com alguém e se sentir desconfortável é normal. Portanto, cobre-se menos!

» Entenda: procurar ajuda médica não é um problema, mas sim a solução.

Fonte: Jaqueline Bifano, psiquiatra
 

* Estagiária sob supervisão da editora Teresa Caram