Jornal Estado de Minas

Saúde ameaçada

Fim de ano, época das dietas milagrosas e da rejeição aos modismos


A palavra dieta provém do grego díaita, que significa “modo de vida”. Não à toa, passando pelo conjunto das substâncias alimentares que constituem o comportamento nutricional dos seres vivos – a própria definição do conceito –, a alimentação humana não é determinada unicamente por questões biológicas. Fatores sociais, econômicos e culturais também são determinantes. Nesse aspecto, o termo vai além do regime para perda de peso e o que vale para uma pessoa pode não ser importante para outra. Trata-se de escolhas, de desejos, de se posicionar frente ao mundo e à vida.





Rotinas, trabalhos, comportamentos e organismos diferentes interferem no gasto energético diário de cada um e, consequentemente, no planejamento da dieta que cada pessoa deve seguir. Alguém que trabalha sentado em frente ao computador não deve comer o mesmo tanto que um professor de spinning que ministra quatro aulas ao dia, por exemplo. É o que diz a nutricionista comportamental e esportiva Ruth Egg.

“Quando levamos em conta o viés comportamental da nutrição, outro aspecto importante é a relação de cada um com a comida, que foi construída ao longo das vivências. A comida tem um significado distinto na vida de cada pessoa, tem um valor afetivo muito grande. Pode ter um papel compensatório, ou assumir a característica de entretenimento”, pontua.
 
 

" É algo muito complexo e individual. Então, sair testando receitas mágicas só vai trazer mais frustração e problemas 
de saúde”


Ruth Egg, nutricionista comportamental e esportiva
 
 
São ingredientes que fazem parte do histórico das pessoas no decorrer de anos, segundo a nutricionista. Ela alerta para o fato de que a relação com o alimento deve ser explorada durante o processo de acompanhamento da dieta. “Não adianta só passar um cardápio e esperar que a pessoa seguirá aquilo. Para ser sustentável, o profissional deve ter conhecimento para explorar essas outras funções que a comida ocupa na vida. Muitas vezes, é necessário, além do nutricionista, um especialista da área da psicologia ou psiquiatria”, ensina.





Dietas feitas sem a devida orientação e cuidados, por sua vez, representam grande risco à saúde e , em geral, impõem muita restrição, o que impede que sejam sustentáveis no longo prazo, reforça Ruth. “Os riscos de danos à saúde e as chances de ocorrer um efeito rebote são muito grandes. A recuperação do peso é algo quase certo”, esclarece.

Emagrecer, diferentemente do que normalmente se pensa, envolve muito mais incluir do que restringir, orienta a nutricionista. Requer dar preferência aos alimentos naturais ou minimamente processados, reduzir o consumo de industrializados ricos em sal e açúcar, aumentar a ingestão de frutas, legumes e verduras, beber muita água. É também trabalhar a consciência das questões e significados ligados à comida que o indivíduo traz consigo, desenvolver consciência corporal para entender os sinais que o corpo manifesta na fome e na saciedade (e isso é variável), assim como respeitar os valores e papéis que cada tipo de comida ocupa na vida daquela pessoa.

“Por exemplo, se você tira totalmente da alimentação um determinado tipo de comida que é muito importante emocionalmente para aquela pessoa, isso pode atrapalhar muito o processo. É algo muito complexo e individual. Então, sair testando receitas mágicas só vai trazer mais frustração e problemas de saúde”, salienta.




 

Experiências 

Karol Ribeiro tem 30 anos e trabalha como modelo plus size. Ela desfila para as principais marcas de moda desse segmento no Brasil, sempre viajando na ponte aérea Belo Horizonte-São Paulo para ensaios fotográficos. É o que se pode chamar de uma profissional de sucesso. Hoje, está satisfeita com o corpo, mesmo acima do peso, mas nem tudo foi um mar de rosas. Ela fez dietas que prometiam emagrecimento rápido e, com o tempo de aprendizado, vivenciou o processo de transição desse tipo de dieta para uma re- educação alimentar de fato, a forma que encontrou para conseguir manter os indicadores dos exames médicos saudáveis.

“Fui uma criança e uma adolescente grande e sou uma mulher grande. Minha estrutura corporal e óssea é grande. Minha adolescência foi difícil, eu era supercomplexada. Fazendo faculdade, já adulta, descobri que existia modelo plus size e investi nessa carreira”, lembra. Com a nova atividade, engordou um pouco e logo pela primeira vez teve algumas alterações na saúde, como um princípio de intolerância à insulina.
 
 
A modelo plus size Karol Ribeiro adotou a reeducação alimentar, com orientação profissional (foto: Wolf Wagner/Divulgação)
 
Até então, Karol Ribeiro fazia dietas por conta própria, seguia a que ditava a moda, ou recomendação sem orientação profissional. “Mas isso nunca dá certo. Você se inspira em alguém, ou em algumas dicas de uma blogueira, por exemplo, que tem estilo de vida diferente, que tem biótipo físico diferente, tem metabolismo diferente. Cada pessoa é única e o próprio organismo também, então não dá para se basear no que outra pessoa fala, tem que ser realmente com acompanhamento de um profissional” , pondera ela, que, nesse intuito, procurou ajuda de um endocrinologista.





Foi assim que descobriu, nitidamente, que dietas momentâneas não funcionam – o que vale é mudar o estilo da alimentação. Hoje, Karol se alimenta de forma saudável, balanceada, e os exames médicos estão todos em dia. Mas, sem radicalizar. “Até porque, eu trabalho como modelo plus size, então não estou fazendo nenhuma dieta restritiva para emagrecer. Faço uma reeducação alimentar para manter o meu peso e vou monitorando o que como, a minha saúde, e assim estou muito feliz. Mudei muito meu estilo de vida. Antes, era um círculo vicioso, só engordava.”

Karol diz que só conseguiu manter e entender o que é a reeducação alimentar no sentido de ter um estilo de vida saudável, percebendo as individualidades de cada pessoa. “E isso a partir do momento em que passei a respeitar meu corpo com foco na saúde. Quando você pensa em emagrecer somente, com foco estético, não é uma coisa que dura. A estética não permanece, ainda mais se você colocar apenas isso como objetivo. A saúde, sim, e isso gera motivação”, pondera.