Jornal Estado de Minas

REPORTAGEM DE CAPA

Avós e netos: amor sem medidas



Avós e avôs são sinônimos de aconchego, de abraço, de colo. Privilegiados são aqueles que passam pela vida tendo a convivência destes seres que olham os netos com ternura sem medida e são responsáveis por deixar um legado que os acompanharão como sementes por toda a vida. De tempos tem tempos, os cientistas publicam estudos que revelam todo o bem que essa relação proporciona seja no funcionamento do cérebro, dos neurônicos, do coração, enfim, de toda máquina humana. Mas quem vive o poder deste contato não precisa de confirmação científica, apenas sente.





Os avós, na estrutura familiar, exercem o papel genuíno de amor sem medidas, sem amarras, sem julgamento e lhes cabem a missão de serem presentes de forma emocional e educacional, mas sem a responsabilidade de pais, ainda que muitos ocupem este lugar. O reconhecimento da potência dessa relação é tão importante que no dia 26 de julho é comemorado o Dia dos Avós em vários países pelo mundo. A data foi escolhida em referência ao Dia de Santa Ana e São Joaquim, que, segundo a tradição da Igreja Católica, são os pais de Maria e, portanto, avós de Jesus Cristo.
 
Além de distribuir amor, os avós são os guardiões da história da família, das tradições, costumes e particularidades de cada cultura e região apreendidas e repassadas para cada geração. Pode-se dizer que eles são raízes para as crianças e contribuem para o desenvolvimento dos pequenos a partir da construção das memórias familiares afetivas. Quem já não experimentou ao lado do vovô e da vovó a contação de histórias? A leitura, o colo, as brincadeiras, a comida preferida... Ensinamentos que, de forma lúdica, contribuem com a formação de um adulto, no mínimo, melhor por se sentir amado, cuidado, protegido.

Fernando Antônio Ferreira Barbosa, de 67 anos, e sua mulher, Samira Spyer Rachid Barbosa, de 68, vivem em estado de alegria desde a chegada da primeira neta, Yasmin, de três anos e meio. Professor de língua portuguesa e bancário aposentado e tendo a música como hobby, Fernando revela que desde o casamento sempre sonhou em ser pai e avô. Tem duas filhas, Fernanda e Ana Paula, e vinha aguardando inquieto a chegada dos netos. “A chegada tão esperada foi atrasada, a ansiedade tomava conta, e quando a Fernanda me contou da gravidez, me emociono até hoje, foi só alegria, sensacional. E até fiz letra e música para minha neta Yasmin, coloquei todo sentimento dentro de mim para fora. Foi de coração.”





E durante a gravidez, Fernando curtiu cada momento e chegou a produzir quatro blusas, como uma contagem regressiva para a chegada da neta, com os dizeres: “vou ser vovô”, “Yasmin vem aí”, “Yasmin, meu novo amor” e “Yasmin chegou... só amor!” Ao conhecer a netinha, ele conta que se transformou: “Foi além do que imaginava e, não sei por que, ela gosta tanto de mim. Não há adjetivo que traduza meu amor por Yasmin, ela completou a minha vida”. E Fernando destaca que tem mais amor para a chegada de mais netos. Recado dado para as filhas. 

Fernando conta que não tem essa de dizer que “avós estragam os netos”: “Até um ano, só dizia sim para Yasmin, com 2 anos, o percentual caiu para 90%, agora está em 80% e me dou o direito de ter 20% de nãos, quando realmente for necessário. Apesar de saber que quando crescer, o percentual vai aumentar. Criação, educação e caráter dei para as minhas filhas e vou passar para Yasmin, mas de maneira mais livre, sem estragar, mas dando alegria”.

MÚSICA DE PRESENTE 

Yasmin passa as manhãs com os avós, até a hora dos pais a levarem para a escolinha, e Fernando se deleita, ainda que reconheça que a idade, às vezes, pesa em acompanhar a energia da pequena. “É uma antítese, quando está comigo aproveito cada instante e fico até cansado, mas bastou ir embora para bater saudade. Ela chega às 8h e temos nossa programação. Caminhamos pelas ruas do bairro, ela sai dando 'oi, tudo bem' para todo mundo, adora ver as pessoas no crossfit, espera a passagem dos homens da limpeza, como a ensinei falar, o pessoal buzina, dá tchau para ela e é uma alegria só. Depois, tem a hora de pintar com os dedinhos, de ver a Pepa, do lanche até o almoço. É uma alegria e, sabe o que aprendo com a Yasmin? Sobre sua personalidade. Às vezes, está pintando e sugiro o vermelho, ela diz, ‘não vovô, quero o verde', se falo algo errado do desenho, ela me corrige. É firme, decidida. Ela adora shopping, como eu, e quando canta comigo, então... Na cantiga ‘fui no tororó’, ela canta 'tenho o vovô para ser meu par' e fala que ‘o vovô é o amor de Yasmin’.”




 
 
Letra de música que o avô Fernando Antônio fez ao saber da chegada da primeira neta Yasmin (foto: Arquivo Pessoal)
 
Assim, vovô Fernando, derretido, procura tornar a vivência com a neta um mundo lúdico e saiba que, desde que Yasmin fez um ano, ele se veste de Papai Noel e faz da relação ainda mais mágica. A vovó Samira, tímida e reservada, fugiu da foto, mas também curte todo esse amor, mas o vovô tira onda, acha que é o “preferido” e revela: “Ahh, existe sim um ciúme, mas velado”, brinca.



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Forte vínculo intergeracional

A boa notícia para os avós de agora é que, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019 o tempo médio de vida passou para 76,6. Isso mostra que a expectativa geral de vida vem crescendo, o que é um ganho para as crianças, que terão mais tempo ao lado dos avós na fase de desenvolvimento. Além disso, a tecnologia tem facilitado o contato entre netos e avós que não moram perto, reduzindo a saudade e trazendo novas formas de manter as famílias juntas, ainda que por meio das telas.

No último dia 16 de novembro, foi publicado pela Royal Society B um estudo, o primeiro a fornecer uma visão neural do precioso vínculo intergeracional entre as avós e os netos. Usando imagens de ressonância magnética funcional, os pesquisadores da Emory University, da Geórgia (EUA), escanearam os cérebros de 50 avós expostas a imagens de seus netos, que tinham entre 3 e 12 anos de idade. Eles também viram fotos de crianças desconhecidas, de um pai adulto do mesmo sexo que seus netos e de um adulto desconhecido.





O resultado, conforme James Rilling, antropólogo e neurocientista que liderou o estudo, foi que as áreas do cérebro envolvidas na empatia emocional foram capturadas, assim como as relacionadas na simulação e na preparação de movimentos motores. Também foi constatado que, quando viram as fotos dos netos, os avós tiveram os mesmos sentimentos que eles. Se expressavam a alegria, sentiam alegria; se era sofrimento, sofriam. Importante destacar que as mesmas regiões motoras do cérebro também são ativadas nos cérebros das mães. Daí a conclusão que todos já sabiam, que os avós são pais, mas sem o rigor da responsabilidade de criar, comprometidos apenas a dar, compartilhar amor.