Cães podem ser treinados para detectar pessoas que estão infectadas pelo novo coronavírus, e eles se saem muito bem na empreitada. É o que garantem cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de Helsinki, na Finlândia. Segundo a equipe, a performance dos animais é equiparada à eficácia do teste PCR, considerado o padrão ouro para o diagnóstico do causador da covid-19. Por isso, apostam os pesquisadores, eles podem ser treinados para ajudar no combate à pandemia em andamento e a outras crises sanitárias.
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De forma geral, a precisão diagnóstica de todas as amostras detectadas foi de 92%. A sensibilidade combinada — precisão de detectar aqueles com infecção — foi de 92%, e a especificidade combinada — precisão de detectar aqueles sem a infecção — foi de 91%. A taxa de acurácia do PCR pode chegar a 99%.
Os quatro cães já haviam sido treinados anteriormente para farejar drogas ilícitas, produtos perigosos ou cânceres. O treinamento para acusar a presença do novo coronavírus durou "semanas", segundo os cientistas, e os animais tiveram performance praticamente semelhante — o com melhor desempenho atingiu 93% para sensibilidade combinada e 95% para especificidade combinada, o com pior, atingiu 88% e 90%, respectivamente.
Os números mudaram pouco em casos de amostras de pessoas infectadas e que não apresentavam sintomas da COVID-19 (assintomáticas). Havia 28 amostras com esse perfil. Apenas uma foi identificada incorretamente como negativa pelos animais, e duas não foram cheiradas, o que significa que 25 das 28 (pouco mais de 89%) foram corretamente identificadas como positivas.
Vida real
Em uma segunda etapa, os cães foram levados para farejar 303 passageiros no Aeroporto Internacional de Helsinki-Vantaa, entre setembro de 2020 e abril de 2021. O resultado do PCR tem eficácia de 98% — 296 de 303 amostras. Já os animais identificaram corretamente as amostras como negativas em 296 dos 300 testes PCR negativos (99%) e identificaram três casos positivos de PCR como negativos.
Após reavaliação com dados clínicos e sorológicos, um foi considerado negativo para Sar-CoV-2, outro positivo, e um terceiro como um provável pós-infeccioso. Da mesma forma, os cães indicaram quatro casos negativos de PCR como positivos. Todos foram considerados negativos para o Sars-CoV-2 na análise posterior.
Como a amostra de casos positivos na vida real era pequena, os cientistas apresentaram aos cães 155 amostras de pessoas que deram positivo em um teste de PCR. Dessa vez, os animais identificaram corretamente pouco menos de 99% deles como positivos.
Variante alfa
Também chamou a atenção da equipe o fato de que os cães tiveram menos sucesso ao identificar corretamente a variante alfa. Isso porque eles foram treinados para detectar o tipo selvagem, a primeira versão do Sars-CoV-2. Para os autores do estudo, porém, "isso serve para mostrar como os cães são bons em distinguir entre diferentes cheiros".
"Essa observação é notável, pois comprova o robusto poder discriminatório dos cães farejadores. A implicação óbvia é que as amostras de treinamento devem cobrir todas as variantes epidemiologicamente relevantes. Nossas observações preliminares sugerem que os cães preparados com um tipo de vírus podem ser treinados novamente, em poucas horas, para detectar suas variantes", indicam.
Os cientistas ponderam que mais estudos devem ser conduzidos, considerando, por exemplo, as novas variantes do Sars-CoV-2 e testes na vida real com um maior número de infectados. Ainda assim, a equipe enfatiza que estudos recentes têm mostrado a alta habilidade de cães em detectar distintos compostos orgânicos liberados por processos metabólicos no corpo, incluindo os gerados por infecções bacterianas, virais e parasitárias. "Os farejadores podem apresentar uma abordagem valiosa para triagem rápida e de alto rendimento de um grande número de pessoas", sustentam.
Semelhança com doenças pediátricas
A COVID-19 e a síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica (SIM-P), complicação que tem acometido meninas e meninos infectados pelo novo coronavírus, compartilham a mesma resposta imune, descobriram cientistas da Escola de Medicina da Universidade da Califórnia em San Diego, nos Estados Unidos. Há semelhanças também com a doença de Kawasaki, enfermidade inflamatória que intriga pediatras há mais de 50 anos.
Por meio de análises genéticas, a equipe identificou um conjunto de 166 genes expressos em doenças respiratórias virais, incluindo a COVID-19. Eles, então, descobriram que essa mesma "assinatura gênica" se aplicava à SIM-P e à doença de Kawasaki, o que sugere que todas as condições decorrem de um mecanismo subjacente semelhante: a rápida liberação de citocinas IL15/IL15RA, proteína que regula as respostas do sistema de defesa.
"Queremos que nosso sistema imunológico nos proteja de estímulos nocivos, mas algumas crianças são geneticamente predispostas a responder de forma mais intensa, levando a inflamação e sintomas indesejados em todo o corpo", explica Jane C. Burns, coautora do estudo, publicado na revista Nature Communications.
Embora o trabalho forneça uma nova estrutura unificadora para essas doenças, ele também identifica algumas diferenças sutis. Por exemplo, os pacientes com SIM-P apresentaram contagens mais baixas de plaquetas e eosinófilos, duas características que podem ser medidas a partir de exames de sangue de rotina.
Segundo Debashis Sahoo, também autor do estudo, os resultados abrem portas para novas investigações que ajudem no desenvolvimento de estratégias preventivas. "Acreditamos que nossas descobertas têm um alto potencial para impactar imediatamente o planejamento de ensaios clínicos e também para moldar as diretrizes de atendimento de clientes", aposta.