Criança obesa segurando um estetoscópio no coração

Atualmente, já existem diversas iniciativas e campanhas para conscientizar e lutar contra a obesidade em adultos, porém a obesidade infantil é um problema que continua a crescer e preocupar

JCOMP/Divulgação

O Brasil passou por um fenômeno interessante nos últimos 50 anos em se tratando de nutrição infantil. O país saiu de um quadro em que a desnutrição era o maior desafio familiar para um momento em que o excesso de peso extrapola aquela antiga associação de crianças gordinhas à saúde e se junta ao cenário pandêmico mundial da obesidade infantil.

 

De acordo com uma pesquisa realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2019, 16,33% das crianças brasileiras entre 5 e 10 anos se enquadravam na categoria de obesidade, definida pela OMS (Organização Mundial de Saúde). O Dia da Conscientização Contra a Obesidade Mórbida, celebrado na sexta-feira (3/5), tem como intuito de trazer atenção e conscientização da sociedade para esse alerta, promover diálogo e visibilidade sobre a relevância e o impacto dos hábitos de vida na saúde dos pequenos.

 

"Só no Brasil estima-se que quase 7 milhões de crianças apresentam excesso de peso e, segundo o Ministério da Saúde, viu-se que uma em cada 10 crianças brasileiras de até 5 anos está com o peso acima do ideal: são 7% com sobrepeso e 3% já com obesidade", relata a nutricionista, pós-graduada em Nutrição Funcional e CEO da CalcLab (plataforma que faz leitura diagnóstica de exames laboratoriais), Karla Lacerda.

 

O que é a obesidade infantil e quando ela é mórbida?

 

A obesidade infantil é caracterizada por um excesso de gordura corporal em crianças de até 12 anos, sendo considerado sobrepeso quando o peso da criança está, no mínimo, 15% acima do peso de referência para a sua idade. O diagnóstico também pode ser realizado através do IMC (índice de massa muscular) e entende-se por obesidade quando o Índice de Massa Corporal (IMC) de uma criança de 5 a 10 anos está acima de 30 kg/m². Já a obesidade mórbida é quando esse índice supera os 40 kg/m².

 

Os dados mais recentes divulgados pelo Ministério da Saúde apontam que uma em cada três crianças de 5 a 9 anos está obesa. Tanto a obesidade como a obesidade mórbida são causadas pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, tendo como principal motivo a alimentação inadequada, hábitos de vida precários e sedentarismo. também podem partir de fatores genéticos e hormonais.

 

"Na prática, para uma melhor visualização e entendimento dos pais, temos que uma criança que tem seu peso 25% maior que o desejável para sua idade já apresenta sobrepeso, que é um primeiro alerta para a obesidade. Quando o peso está 30% acima, ela já é considerada obesa", explica.

 

Quais são as causas desse problema?

 

A obesidade é uma condição complexa, multifatorial e pró-inflamatória que está associada à um conjunto de determinantes incluindo fatores econômicos, sociais, culturais, genéticos, ambientais e comportamentais. Em relação a alimentação temos que o consumo excessivo de açúcar, gorduras industrializadas, alimentos processados e ultraprocessados intensificam o ganho de peso.

 

"Além disso, vemos que a propaganda de alimentos não saudáveis direcionadas ao público infantojuvenil e o sedentarismo são outros fatores que colaboram para o quadro da doença entre as crianças. A maior causa, porém, se encontra nos adultos que assistem essas crianças, os hábitos da família refletem na criança, e o adulto sedentário e com uma alimentação ruim será o exemplo para a criança, que apenas reproduzirá o que ela vivencia rotineiramente", alerta a especialista.

 

Por que ela vem aumentando entre as crianças?

 

Imagem da nutricionista, pós-graduada em nutrição funcional e CEO da CalcLab, Karla Lacerda

Nutricionista, pós-graduada em Nutrição Funcional e CEO da CalcLab, Karla Lacerda

Arquivo Pessoal/Divulgação
No Brasil, os índices de sobrepeso e obesidade refletem os padrões mundiais, as tendências atuais apontam que, haverá mais crianças e adolescentes com obesidade do que com desnutrição moderada e grave até 2030 segundo recentes pesquisas publicadas na revista The Lancet. "Os motivos para esse aumento são vários, se iniciando na gestação e composição materna. A nutrição inadequada da mãe e o excesso de peso já influenciam o perfil alimentar do neném que ainda nem nasceu", esclarece Karla.

 

Outro problema, reitera a nutricionista, é o descumprimento da exclusividade do aleitamento materno até os seis meses de idade, inserindo a criança no ambiente de alimentação não saudável mesmo antes dela estar apta a comer e introduzindo industrializados e ultraprocessados já durante os primeiros meses de vida. "As crianças passaram a ter acesso a esses alimentos industrializados e hipercalóricos que estão substituindo as frutas e outros alimentos naturais e saudáveis na rotina".

 

De acordo com o Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil recente, 80% das crianças brasileiras de até 5 anos consomem alimentos ultraprocessados, como bolachas recheadas, o que também é observado entre bebês com menos de 2 anos. Com esse consumo excessivo de gorduras e açúcares, há um desequilíbrio na produção hormonal e no processo inflamatório que dá início ao acúmulo de peso.

 

Junto a mudança alimentar, observa-se uma mudança em relação às atividades físicas. Antigamente, crianças eram mais ativas e costumavam brincar a maior parte do tempo livre. "Hoje, os pequenos passam grande parte do tempo sentados e entretidos em diversas telas, seja televisão, computador, celular ou tablet, intensificando hábitos sedentários, prejudicando a saúde deles", declara.

 

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A obesidade pode contribuir para o surgimento de outras doenças?

 

Sim. O excesso de peso na infância e na adolescência está associado a um maior risco e início precoce de doenças crônicas. Tanto a obesidade como a obesidade mórbida infantil, são condições que podem favorecer doenças como:

 

 

  • Diabetes
  • Insônia
  • Apneia
  • Pressão alta
  • Colesterol alto
  • Depressão
  • Câncer
  • Doenças cardiovasculares

 

 

O aumento de peso entre os pequenos hoje resultará em um aumento significativo no futuro nos custos da saúde.

 

Decisão

 

Diante desta situação, faz-se necessário pôr em prática ações que favoreçam a melhora desse quadro e, pensando nisso, o primeiro passo é identificar que a criança está acima do peso. "Essa é a maior dificuldade dos pais ou responsáveis, pois normalmente identificam apenas quando as crianças já estão muito obesas ou já apresentam doenças advindas do excesso de peso. Os adultos tendem a não dar tanta atenção ao fato de a criança estar gordinha até que isso vire um problema grave de saúde".

 

A nutricionista ainda instiga a família, como um todo, a mudar os hábitos, pois a criança repete o que ela vê os adultos a sua volta fazendo, então, se todos se sentam à mesa, sem telas, com alimentos saudáveis, se é um momento tranquilo e bom, a criança replicará esse comportamento e desenvolverá uma relação melhor com a comida. Isso, inclusive, está no guia alimentar para a população brasileira, que orienta comer com atenção em ambiente tranquilo e, sempre que possível, em companhia.

 

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"Além disso, criança precisa ter rotina. A rotina é uma segurança para a criança e permite que ela se desenvolva melhor num ambiente seguro, onde ela está ciente das atividades que vão acontecer no dia da família, incluindo seu momento de brincar, de estudar, de comer, de dormir, gerando menos tensão e estresse na hora de concluir as tarefas".

 

Uma última dica de Karla é incluir a criança, já desde bem pequena, nas compras da feira e na produção da alimentação, dando oportunidade para que ela conheça e escolhas os vegetais, frutas, legumes, hortaliças que vão compor o cardápio da semana.

 

"As estratégias preventivas provaram ser a intervenção de saúde pública mais eficaz para conter esta pandemia. Uma abordagem multidisciplinar envolvendo modificação da dieta e implementação de um estilo de vida saudável, incluindo atividade física regular, minimizando o tempo de tela e intervenções comportamentais, foi considerada a mais benéfica na prevenção da obesidade", finalizou.

 

* Estagiária sob supervisão do subeditor Diogo Finelli.