Jornal Estado de Minas

REPORTAGEM DE CAPA

Sheikh limpa a mesquita em BH e fala da faxina 'na casa de Deus'

 

   

Uma sexta-feira, um pouco antes de o culto ser iniciado na mesquita, às 13h em ponto, no Bairro Mangabeiras, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, o marroquino Mokhtar Elkhal, de 65 anos, há dois anos radicado na capital, se depara com a reportagem, na escadaria que dá acesso ao templo religioso.




Mokhtar segurava um balde, um rodo e um pano de chão. A repórter perguntou: "Quero falar com o sheikh, marquei por telefone uma entrevista", ao que ele respondeu: "Sou eu!".


A repórter não escondeu o constrangimento. Demonstrando nenhum espanto com a abordagem, Mokhtar desfez o mal-estar com um sorriso singelo, acolhedor e com uma pergunta: "A gente limpa a casa da gente, por que não limpar a casa de Deus também?".

A simplicidade no gesto do sheikh acompanha a fala que expõe um conteúdo complexo de quem verbaliza uma formação esmerada em teologia e ciências humanas, em especial no estudo da história. Nesse estudo, o sheikh coloca os muçulmanos do lado dos injustiçados - apesar, adverte ele, de toda a contribuição que deram para o desenvolvimento da ciência e da espiritualidade.


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Chega

Questionado sobre se ciência e espiritualidade podem andar juntas, ele não vacila na resposta: “Sempre! A consciência livre não tem fronteira, não tem religião”, afirma ele.





Mokhtar Elkal, cuja pronúncia do nome e sobrenome é difícil para nós, latinos, sorri ao relatarmos nossa dificuldade e simplifica: "Me chame de sheikh, tá bom assim?". 


A pronúncia do português do sheikh também não é fácil. Além disso, ele fala muito rápido. Isso dificultou, em alguns momentos, entender o que estava sendo dito em sua íntegra. O obstáculo foi sanado com paciência de ambas as partes, por que o sheikh também tinha dificuldade para entender a repórter. Mas, em resumo, o conteúdo do diálogo em seu contexto geral não foi comprometido.

Fanatismo

 

À certa altura, o sheikh disse que as organizações mundiais, citando a Otan e o mundo árabe, "não têm coragem de falar 'chega'" para as atrocidades cometidas em nome da religião.

Perguntado sobre o porquê de essas organizações não ajudarem a dar um basta nas guerras mundo afora, ele afirma: "Porque não têm a consciência livre (os integrantes das organizações mundiais), porque estão sentados no trono e não querem sair”.





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Ao ser indagado sobre os motivos da violência, de uma maneira geral, em nome muitas vezes do fanatismo religioso, o sheikh particulariza ao se referir "às dores do povo mulçumano, alvo de preconceitos".

“Porque só nós (somos) fanáticos? O mundo injusto aponta pra mim... Desculpa, dentro da minha casa, vem um e ocupa meu espaço, divide a casa e deixa só um quarto pra mim?”, pergunta, sem esconder o ressentimento perpetuado há milênios no meio muçulmano.


Mokhtar, ele próprio, responde, à pergunta: “A gente compartilha (muçulmano) o pouco que tem com o outro, esse é o nosso coração”. 

Em dia de culto, o sheikh se diz apressado para se paramentar com o traje apropriado para dar início à cerimônia, que tem hora para começar - e se despede.



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Véu na mesquita

Centro Islâmico de Minas Gerais, em Belo Horizonte (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press )
A repórter entra na mesquita e um responsável pela obediência à liturgia no local, pede para colocar o véu, entregando um lenço, entre os vários que se encontram ali com essa finalidade. “Por que?”, pergunto. “Em sinal de respeito”, responde.

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Antes, o sheikh havia presenteado o repórter fotográfico com uma edição do Alcorão, a “Bíblia” dos muçulmanos, e um livreto intitulado "Um breve guia ilustrado para compreender o Islã".

Ao ser comunicado que meu colega era responsável pelas imagens e eu pelo texto, o sheikh se retratou, oferecendo os dois exemplares para a repórter que assina essa reportagem.

 

 

 

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