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Um estudo desenvolvido por pesquisadores do Cefet-MG, campus Divinópolis, comprova que o tingimento com corantes naturais provoca melhora significativa na proteção ultravioleta do tecido. Os corantes à base de vegetais, com diferentes concentrações, extraídos da casca de cebola, repolho roxo e beterraba, são eficazes na proteção contra a radiação.
O trabalho “Determinação do fator de proteção ultravioleta para tecidos tingidos com corantes naturais” foi desenvolvido pela egressa do curso técnico integrado de produção de moda, Ana Clara Machado, pelo orientador e professor de física, Fábio Lacerda Resende e Silva, e pelas coorientadoras e professoras Iza Fonte Boa e Silva, de química, e Hemilly Brugnara Lara, de design de moda.
Os corantes foram utilizados para tingir por infusão pedaços de um tecido 100% algodão. Todas as amostras tingidas a partir da casca de cebola apresentaram proteção e um fator de proteção UPF 50+, a maior classificação segundo normas internacionais – Australian Radiation Protection and Nuclear Safety Agency (Arpansa).
“O tingimento com corantes naturais provocou uma melhora significativa na proteção ultravioleta do tecido. Aproximadamente 24% da radiação ultravioleta é transmitida pelo tecido sem tingimento, valor que pode causar riscos à saúde. Quando tingido a partir da casca de cebola, esse valor cai para menos de 1,5%, fazendo com que o tecido tenha uma excelente proteção e um fator de proteção ultravioleta 50+”, comenta. “Quando tingido com o repolho roxo e a beterraba, a transmitância média fica abaixo de 9% e 11%, respectivamente”, destaca Fábio Lacerda.
Devido à pandemia da COVID-19, os tingimentos foram feitos na casa de Ana Clara Machado. Depois de prontas, as amostras foram analisadas no Laboratório de Espectroscopia Raman do Departamento de Física da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Medidas de transmitância difusa foram conduzidas no laboratório em todas as amostras. “As medidas fornecem informações sobre a porcentagem de radiação, para cada comprimento de onda que é transmitida através do tecido. Com isso, foi possível determinar a transmitância média nas regiões UV, UVA e UVB, além do fator de proteção ultravioleta, comumente chamado de UPF”, explica o professor Fábio.
Fábio Lacerda destaca que o resultado é garantido em tecido 100% algodão e em outros tipos também. “O tecido 100% algodão foi utilizado por ser de fácil acesso, apresentar baixo custo e ser hipoalergênico. Mas outras fibras, como lã, linho e seda, também podem ser tingidas com esses corantes mantendo os mesmos benefícios.”
Os pesquisadores apontam dois pontos importantes do projeto que seriam descobrir corantes que tenham uma boa proteção contra radiação ultravioleta e que também agridam minimamente o ambiente.
Para Ana Clara, o trabalho foi determinante em sua formação. “O projeto apresenta poucos impactos ambientais, sendo um trabalho que tem viés sustentável. Além disso, foi determinada a proteção ultravioleta dos corantes no tecido, o qual utilizado no vestuário comercial, proporcionará uma considerável proteção solar para as pessoas.”
Fábio Lacerda revela que a ideia era utilizar materiais de fácil acesso, como cebola, repolho e beterraba, baixo custo e com pouco ou nenhum impacto ambiental. “Para isso, precisávamos de compostos contendo moléculas capazes de absorver a radiação ultravioleta e que se encaixassem nesses requisitos. Pensamos em corantes naturais que poderiam ser facilmente encontrados e chegamos nesses alimentos."
No caso da cebola, por exemplo, sua casca contém uma molécula capaz de absorver radiação solar e, além disso, é uma parte normalmente descartada, "portanto, poderíamos dar uma nova finalidade a ela".
"Outro ponto importante é que na etapa de preparação, não tivemos acesso a laboratórios ou reagentes. Isso também nos levou a escolher esses compostos.”
TESTES
O professor garante que, certamente, há outros vegetais com a mesma capacidade. “Existem inúmeros outros alimentos que podem conferir propriedades de proteção UV a tecidos. Inclusive, além da cebola, beterraba e repolho roxo, nossa equipe já testou o feijão preto, o urucum e o mate e obtivemos bons resultados, mas, ainda, nenhum tão bom quanto a cebola.”
A professora de química EBTT do Cefet-MG, Iza Fonte Boa e Silva, campus Divinópolis, acrescenta que os corantes naturais podem não ser tão inofensivos, apesar de naturais. “As pessoas, geralmente, acham que produtos naturais ou ‘orgânicos’ são melhores por serem ‘livres de química’, o que não é verdade”, comenta.
“A toxina botulínica, outro exemplo, que é produzida por uma bactéria, é um composto natural, no entanto é uma das substâncias mais tóxicas do mundo em determinadas concentrações. A ideia é tentar utilizar da melhor forma esses recursos naturais, sempre atentando aos princípios da chamada Ecomoda, ou ModaBio, que utiliza métodos visando reduzir o impacto ambiental da indústria, como o uso de fibras eco-amigáveis – como algodão orgânico, cânhamo e linho – , além de substituir os produtos sintéticos por produtos naturais e reduzir o consumo de água. Para isso, outros estudos ainda devem ser desenvolvidos.”