Helena e Luzia

Para Luzia Umbelino Borges, de 60 anos, pedagoga, avó de Helena, de 13 anos, ser avó é uma grande bênção que a renova, encoraja e a faz entender que o amor é infinito

Arquivo Pessoal
O Dia dos Avós é comemorado hoje, 26 de julho, data escolhida por referência à comemoração do dia de Santa Ana e São Joaquim, que, segundo a tradição da igreja católica, são os avós de Jesus Cristo. E com as mudanças do mundo, de comportamento e de gerações, o perfil da vovó e do vovô também se transformou, ganhou novas cores e contornos. A imagem dos bons velhinhos, mais quietos, guardiãos das tradições familiares e repletos de sabedoria recebeu ajustes. São cada vez mais ativos, participativos e presentes na vida dos netos. Eles se tornaram não só conselheiros e confidentes, mas amigos. E não ficam só fazendo quitanda, vão a shows, jogam viodegames, viajam juntos. 

Luzia Umbelino Borges, de 60 anos, comemorados no sábado (23/7), é pedagoga, no Colégio Villa Realm em Sabará, onde mora, e é a avó coruja da neta Helena Umbelino Peçanha Araújo, de 13 anos. "Ser avó é uma grande bênção. É um amor que transcende, que me renova, me encoraja e me faz entender que o amor é infinito. A Helena chegou para colocar luz na nossa vida com sua meiguice, beleza, inteligência e ternura. Muito além do que imaginei."

Luzia conta que sempre sonhou em ser avó: "Tenho uma família constituída e ver nossa descendência chegando e nos ensinando a ser pessoas melhores é maravilhoso. A minha relação com Helena é de amor e proteção. E é recíproco. Antes da pandemia, a gente ia rodar no centro de BH para ela comprar bijuterias e brinquedos para ajudar nas campanhas solidárias de pessoas do seu entorno. Há seis anos ela segurava minha mão para atravessar a rua e dizia: 'vou te ajudar porque você tá um pouco velhinha....' Imagina se fosse hoje!"
A relação de Luzia com Helena é de trocas: "Ela me ajuda nas minhas dúvidas tecnológicas,  me manda as respostas em forma de vídeos, me ajuda nas apresentações que tenho de fazer para minha escola, e nas chamadas de vídeo para fazermos as tarefas escolares juntas. Ela até me manda o boletim escolar no WhatsApp para analisar o que precisa estudar. Sempre tivemos uma relação de afinidade e cumplicidade, o que ficou bem intensa no período da pandemia. Com as atividades on-line, fizemos chamada de vídeo diariamente. Ficamos mais de um ano sem nos ver, pois ainda não tinha vacina e eu sou do grupo de risco. Às vezes, mandava um agrado para ela (comidinha especial, uma sobremesa). Recebia bilhete e cartinhas de agradecimento."

Avó nos dias de hoje

Para Luzia, nos dias atuais ser avó se tornou um desafio maior. "A pandemia nos fez pensar o quanto viver é urgente. Como trabalho com pesdoas na idade dela, vejo o quanto este tempo afetou a saúde emocional de todos, sinto uma desesperança instaurada, mas é para isso que existe os avós. Para dar carinho, ouvir, falar como viver e fazer boas escolhas. É gratificante, afinal somos a prova viva de que a vida é uma dádiva. Estou aqui há seis décadas e aprendo a cada dia com os jovens e adolescentes. Eles são puros e generosos. Solidários, emotivos, só precisam de aconchego e carinho".

A pedagoga conta que não chegou a conhecer seus avós: "Infelizmente, sou de uma geração em que a expectativa de vida era bem mais baixa, porém sou de uma família grande, nove irmãos. Tive a sorte de ser filha de uma mãe que amava e literatura e compartilhava com a gente este gosto, o que foi determinante para nossa formação. E de um pai musicista, que nos ensinou a alegria de viver, a sensibilidade e a beleza da música na vida. A gente aprende e passa para frente."

Luzia destaca que uma avó que ensina crochê, faz canjica, doce, um bom almoço, mas que sobretudo aconselha, conversa sobre os perigos, sobre o livre arbítrio. "Sei que a Helena confia em mim é isso é  gratificante. Ela me ouve, me conta coisas da vida dela. Ela é bem resolvida, aprendeu a se posicionar com ajuda da mãe, da terapeuta, sabe contornar as adversidades. Sinto que ela é bem madura, sente que é amada pelos pais, avós e tios. Criamos uma rede de apoio, de afetividade que transforma em segurança emocional".
A programação com Helena é intensa. Luzia conta que "fazemos muitas  coisas juntas. Vamos a lojas, visitamos os tios, saímos para comer pizza. Eu ela é o avô. O coração da gente fica repleto de alegria. Já viajamos pelo Sul de Minas e fomos no início do mês para a Bienal do livro em São Paulo. Ela foi prestigiar a mãe que foi autografar uma obra. Ela me ajudou nas demandas tecnológicas do aeroporto, do celular, ficamos juntas no mesmo quarto de hotel, e pude ver o quanto ela cresceu, deixou de ser o bebê que eu paparicava para se tornar uma companheira. Alguém que eu amo incondicionalmente. Sou privilegiada por ser avó de uma pessoa tão linda, tão iluminada, tão Helena". 

"Neto é filho com açúcar"

Caio e Elenice

Elenice Ribeiro, de 52 anos, design de interiores, e avó de Caio, de 7 anos, diz que ser avó é ter nos braços aquele ser que veio do primeiro amor

Arquivo Pessoal

Para Elenice Ribeiro, de 52 anos, design de interiores, e avó de Caio Augusto Ribeiro Silva, de 7 anos, é uma experiência única: "Você ter em seus braços aquele ser que veio do seu primeiro amor é inexplicável. O sentimento de amor, de gratidão, de deslumbre e de felicidade. Todas essas emoções juntas que ao mesmo tempo estimula e acalma, dá paz interior de que você é uma vencedora, que ganhou o maior troféu que Deus poderia lhe dar: o título de avó. Um título que lhá dá o direito de mimar muito, de abraçar e beijar mil vezes, de dar colo e apartar o choro, é curar o machucado com um beijo. Ser avó é ser o remédio mais doce para todos os dodóis dos netos. Se tem felicidade na terra maior que essa eu desconheço. Neto é filho com açúcar".

Elenice Ribeiro conta que Caio é apaixonado por ela e ela por ele: "É um doce, sensível, esperto, inteligente, e lindo. Minha relação com ele é de puro amor, de escutar suas queixas e suas conquistas. É de brincar de cavalinho na sala, chutar bola, brincar na pracinha é de se jogar no mundo dele que é maravilhoso".

A designer destaca que é dinâmica em casa e, na profissão, é daquelas que faz tudo de uma vez, exigente com ela: "Já com o Caio, deixo as exigências para os pais. Claro, corrijo, ensino, explico o porquê das coisas, mas falo de um jeito doce, sem ficar nervosa nem brigando. Se eu tivesse aprendido isso quando tive meus filhos, não teria batido neles. Eu os eduquei muito bem, mas sempre fui brava e o coro comia. Fui criada assim, mas isso não é desculpa. Hoje, vejo que não é preciso bater para educar, que uma boa conversa, olho no olho, com seriedade, dá super certo. O Caio me escuta, me obedece e me ama por eu tratá-lo com o respeito que ele merece. Não sei se existe uma maneira certa de se comportar, procuro ser  verdadeira e passar segurança para ele."

Elenice lembra que suas avós eram um doce, "vó Zezé e Vó Sinhá eram umas santas porque nós (eu e minhas irmãs e primas ) éramos espoletas. Eu era muito levada, minha mãe me batia todo dia, mas nem ligava, minhas avós me defendiam, me mimavam, era uma delícia saber que eu tinha pra onde correr na hora do coro. Eu sou outra avó. O que mudou? Tudo. Com a chegada da o Caio melhorei como pessoa, ser humano, minhas prioridades mudaram, me deu um novo vigor e entusiasmo. Vontade de viver muitos anos para vê-lo crescer e se tornar um homem lindo e feliz".
O fato do título de avó estar ligado ao envelhecimento não é um problema para Elenice: "É um processo natural da vida, são ciclos, fases e ninguém foge disso. O tempo é cruel, mas vaidosa, me cuido faço musculação, academia, vitaminas, dieta e tratamentos estéticos. É importante para mim, porque se eu não estiver bem comigo como posso passar isso para o Caio? Como posso cuidar de alguém se não cuidar de mim? Não sou a típica vovó de óculos na ponta do nariz fazendo crochê. Mas faço coisas de vó, aquele bolo quentinho no fim da tarde, o jantar preferido dele, pegar no colo apesar dele ter 7 anos, jogar vídeo game e brincar muito. Ele me escuta e respeita muito, passeamos juntos, fazemos vídeos de tiktok. Nossos momentos são únicos".

A medicina que cuida dos avós

Simone de Paula Pessoa Lima, geriatra

Simone de Paula Pessoa Lima, geriatra da Saúde no Lar, diz que preciso pensar numa maior valorização dos idosos, em formas de aprender com eles e de oferecer cuidado dentro e fora de casa

Jordana Nesio/Divulgação
Simone de Paula Pessoa Lima, geriatra da empresa especializada em home care, Saúde no Lar, fala sobre o etarismo, o preconceito latente com os mais velhos e, consequentemente, que também atinge muitos avós: "A questão da sociedade em que vivemos permanece sendo um grande entrave que precisa melhorar. Como ainda existe o etarismo, esse pré-conceito em relação ao processo de envelhecimento, as pessoas não querem envelhecer e nem lidar com a pessoa idosa.  Os países desenvolvidos dão de 10 a 0 nos países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos nesse quesito. Valorizam muito mais os próprios idosos."

Outro ponto que precisamos abordar, chama a atenção a geriatra, é o familiar. "Antigamente, as famílias eram grandes e os filhos responsáveis por cuidar dos idosos, dos seus pais. Em uma casa com 10 filhos, por exemplo, sempre tinha uma filha que não casava para exercer esse papel de cuidadora dos pais. Hoje em dia não temos mais isso. O perfil da sociedade mudou com família menores e as mulheres também responsáveis por contribuir financeiramente com a casa."

No entanto, Simone de Paula Pessoa Lima enfatiza que o perfil do idoso também mudou. "Precisamos pensar numa maior valorização desse grupo, pensar em formas de aprender com eles, de oferecer cuidado não só dentro de casa, mas fora também. Dando qualidade para que possam ter relacionamentos, amigos e uma vida social mais digna e ampla."