Quase 30% dos casos de demência vascular - o segundo tipo mais comum do declínio cognitivo - poderiam ser evitados retirando da despensa alimentos ultraprocessados, como salgadinhos, refrigerantes, batata frita congelada e embutidos. Um artigo publicado na revista Neurology com dados de 72 mil pessoas acima de 55 anos mostra, também, que uma dieta composta por ingredientes naturais ou minimamente processados tem potencial de prevenir 14% das ocorrências de Alzheimer.
O estudo, da Universidade Médica de Tianjin, na China, é mais um a indicar a relação entre alimentação e saúde cerebral, tema que desperta o interesse da ciência à medida que se espera uma explosão na prevalência dos diversos tipos de demência. Hoje, 55 milhões de pessoas vivem com a condição, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), que projeta 78 milhões de casos em 2030 e 139 milhões daqui a 28 anos.
Ultraprocessados são produtos industrializados que utilizam partes de vários alimentos - como o amido retirado de um e o açúcar, de outro -, além de substâncias químicas artificiais para dar cor, sabor e estender a validade do item. "São aqueles que você não consegue dizer do que são feitos, como salsichas", resume a médica nutróloga Marcella Garcez, diretora da Associação Brasileira de Nutrologia e membro da Sociedade Brasileira para o Estudo do Envelhecimento. Entram também na categoria refrigerantes, molhos e empanados comprados prontos.
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"Os alimentos ultraprocessados reduzem a qualidade da dieta", disse, em nota, o principal autor do estudo, Huiping Li. "Esses alimentos também podem conter aditivos alimentares ou moléculas produzidas durante a embalagem e o aquecimento, todos os quais demonstraram, em outros estudos, ter efeitos negativos nas habilidades de pensamento e memória. Nossa pesquisa não apenas descobriu que os alimentos ultraprocessados estão associados a um risco aumentado de demência, mas descobriu que substituí-los por opções saudáveis pode diminuir esse risco", diz.
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Prevenção
Depois de fazer ajustes de idade, sexo, histórico familiar e outros fatores de risco, os cientistas descobriram que cada aumento de 10% na ingestão diária de ultraprocessados estava associada a um risco 25% maior de demência. Ao estimar o que aconteceria se a pessoa substituísse esse mesmo percentual de produtos do tipo por alimentos não processados ou minimamente processados (frutas, vegetais, leite fresco e carne), a probabilidade de ter algum tipo de demência caía 19%.
O risco de ter demência em geral foi 25% maior entre os consumidores mais adeptos de ultraprocessados; 28% mais elevado em relação à demência vascular e 14% quanto ao Alzheimer. Embora o estudo não aponte, diretamente, que os alimentos altamente descaracterizados causem declínio cognitivo, a médica nutróloga Marcella Garcez explica que vários mecanismos fisiológicos podem contribuir para essa associação.
"Além do processo natural de envelhecimento, o cérebro é impactado negativamente pela falta de ômega 3, por radicais livres, que são combatidos por alimentos antioxidantes, e por deficiências vasculares, que têm uma relação muito forte com doenças metabólicas como diabetes, e por lipidemias (gorduras no sangue)", aponta a diretora da Associação Brasileira de Nutrologia. Ela também lembra que ingredientes como corantes, sal e gorduras modificadas deflagram processos inflamatórios nas células, incluindo as do cérebro.
Embora os alimentos saudáveis não possam reverter um processo de demência já instalado, Marcella Garcez destaca que, além da prevenção, especialmente em pessoas com histórico familiar, a retirada dos ultraprocessados do cardápio tem o potencial de ajudar pessoas que apresentam o problema. "A alimentação pode evitar a progressão da demência", diz.