Ela tem 102 anos e 104 consanguíneos (pessoas com o mesmo sangue dela). Ao todo, são 10 filhos, 25 netos, 45 bisnetos, 23 tataranetos e um pentaneto, ou seja, uma bisneta de Albertina Ferreira Cadena já é avó. Além de ser muito amada pelos familiares, vizinhos e amigos, ela adora passear e jogar conversa fora.
Albertina nasceu em 1920 – ano em que os historiadores definem como o fim da gripe espanhola, que vitimou pelo menos 50 milhões de pessoas em todo o mundo. Embora tenha sido considerado o início dos “anos loucos”, em que a mulher começava a se libertar das amarras da sociedade, a vida de “dona Bebeca” não foi tão fácil assim.
Nascida em Jataí, interior de Goiás, Bebeca se casou aos 14 anos com um garimpeiro e jogador de baralho de nome Deusdete, de 21. Ela conta que precisou de documentos “especiais” para que conseguisse se casar no civil. “Eu tive oito meninas e dois meninos, quase todos com parteira, um atrás do outro. A gente trabalhava muito, não sei como eu dava conta.”
Boa de papo e de memória, Bebeca se lembra muito bem da casa onde morava. “Eram 34 calcinhas secando no varal”, conta, sorrindo. “Mas nunca faltou nada, porque eles mesmos se ajudavam. O mais velho era da Aeronáutica, a mais velha criava as mais novas e ainda fazia doce para vender.”
Aos 52, ela ficou viúva e seguiu a vida assim: cuidando da família inteira. Na década de 1960, já em Brasília, Bebeca passou seguir a doutrina espiritualista cristã – como samaritana, uma espécie de missionária – e trabalhou durante mais de 50 anos no Vale do Amanhecer, sendo mais de duas décadas com a médium Tia Neiva, morta em 1985.
"Se eu estou preparada para morrer? Não tenho medo nenhum. Até minha roupa já está pronta"
Albertina Ferreira Cadena, 102 anos
Sobre o fato de viver tanto, Bebeca diz que nem sabe explicar. Ela fumou por quase 50 anos e, perto de chegar aos 70, foi atropelada. “Fiquei 20 dias no CTI e fiz uma cirurgia no pescoço. Mas depois fiquei boa”, diz.
A genética, com certeza, tem forte influência na longevidade de Bebeca. Das últimas três irmãs que restaram, ela era a do meio e é a única ainda viva. As outras duas morreram aos 105 e 98 anos, mostrando que a história familiar é longeva.
A alimentação não é regrada. Ela diz que come de tudo: desde galinhada com arroz e pequi, mocotó, rabada, costelinha e um biscoito frito que ela mesma fazia, até bem pouco tempo. “E adoro doce.”
Quando as filhas e os netos perguntam: “E aí, vó, você não vai namorar nunca mais?”. Ela responde: “Namorado nessa idade? Velha já chega eu”, brinca.
VIDA E MORTE
Hoje, Bebeca se divide entre seu apartamento e a casa de uma das filhas, onde passeia pelo jardim, colhe frutas, toma sol, tira uma soneca e se diverte com netos, bisnetos e por aí vai. É uma idosa encantadora, divertida e de bem com a vida. As seis filhas dela preferem acreditar que “é coisa de Deus mesmo”.
Mesmo já tendo perdido quatro filhos, ela vê a morte como prolongamento da vida. “Se eu estou preparada para morrer? Não tenho medo nenhum. Até minha roupa já está pronta”, diz, com um sorrisão no rosto e com a sabedoria digna de uma mulher de 102 anos.
Mas então, assim como dona Bebeca, como justificar o crescimento do número de pessoas com mais de 100 anos no Brasil e no mundo?
As explicações são várias e envolvem uma série de fatores. Segundo os especialistas em envelhecimento, aspectos como a relação entre genética e estilo de vida contam muitos pontos, assim como a evolução da medicina e a inovação na área de medicamentos, os tratamentos cada vez mais precoces e as campanhas que promovem a saúde.
* Estagiária sob supervisão da editora Ellen Cristie