Com o avanço da vacinação, a COVID-19 deixou de liderar o ranking de mortes por doenças no Brasil. Patologias como o Acidente Vascular Cerebral (AVC), também conhecido como derrame, e o infarto voltaram a ser as causas mais comuns de óbitos no país. Segundo dados do Portal de Transparência dos Cartórios de Registro Civil do Brasil, nos primeiros seis meses de 2022, 56.038 pessoas morreram por AVC e outras 52.426, por infarto. Neste período, 48.763 pessoas faleceram pela infecção pelo coronavírus.
Os dados chamam atenção para a necessidade de cuidados preventivos e a importância de encaminhamento imediato para atendimento médico especializado, logo após os primeiros sinais de alerta.
Segundo o coordenador do departamento de Neurologia do Hospital Mater Dei Salvador, Ricardo Alvim, uma em cada seis ou oito pessoas terão um AVC na vida e 80% dos casos são isquêmicos, quando ocorre a obstrução ou redução do fluxo sanguíneo em uma artéria cerebral, causando a falta de circulação sanguínea em parte do cérebro.
Quando o paciente é atendido no período de até 4h30 após o início dos sintomas, o tratamento trombolítico endovenoso é o mais indicado. O medicamento age na desobstrução do vaso cerebral, normalizando a circulação no cérebro.
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O especialista explica que o tempo para atendimento no hospital é crucial. A Associação Americana do Coração e a Associação Americana de AVC preconizam que o tempo ideal da chegada do paciente ao hospital até a aplicação do trombolítico, o chamado tempo 'porta-agulha', é de até 1 hora.
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Nos casos de pacientes com AVC isquêmico, que são atendidos após 4h30 do início dos sintomas, é indicada a trombectomia mecânica, procedimento endovascular no qual uma artéria é puncionada para introdução de um cateter para desobstrução do vaso. O procedimento pode ser feito em até 24 horas do início dos sintomas e necessita de uma tecnologia de ponta para que sejam empregados protocolos avançados de neuroimagem.
Sequelas
O AVC é responsável pela maior incidência de danos neurológicos e incapacidade no mundo. Segundo dados da Sociedade Brasileira de Doenças Cerebrovasculares, aproximadamente 70% das pessoas não retornam ao trabalho após um AVC, devido às suas sequelas, e 50% ficam dependentes de outras pessoas no dia a dia. Pode ocorrer em qualquer idade, inclusive nas crianças, mas costuma ser mais frequente em idosos e pessoas com problemas cardiovasculares.
As sequelas também dependem do tamanho e da localização da lesão, sendo as mais comuns as neurológicas, como perda de memória (definitiva ou não), dificuldade em se expressar, dificuldade em falar, comer, de engolir a própria saliva, paralisia facial, desequilíbrio e sequelas motoras, como paralisia de um dos lados do corpo.
Atenção ao coração
O infarto agudo do miocárdio, também conhecido como ataque cardíaco, é outra grande preocupação entre a população e os especialistas. Ele ocorre quando as artérias coronárias que irrigam o coração têm seu fluxo sanguíneo bloqueado por uma placa de gordura ou um coágulo, culminando na falta de oxigenação e sangue nos tecidos cardíacos, provocando a morte celular, em consequência da diminuição da contração do músculo cardíaco. As placas de gordura são formadas nas artérias ao longo dos anos por processos inflamatórios e pelos mesmos fatores de risco do AVC, como pressão alta, diabetes, colesterol alto, sedentarismo, obesidade e tabagismo.
"Quando essa placa de gordura se rompe, existe um conteúdo lipídico de gordura inflamatório que favorece a formação de um grande coágulo, o qual chamamos de trombo, que faz a obstrução completa ou parcial da artéria coronariana. Quando essa oclusão é total, ocorre o infarto agudo do miocárdio com a necrose do músculo cardíaco, ocorrendo, às vezes, a morte súbita", explica o coordenador do departamento de cardiologia do Hospital Mater Dei Salvador, Nilvaldo Filgueiras.
De acordo com o cardiologista, nessas situações, existe a necessidade de uma abordagem rápida de tratamento para evitar que o paciente venha a óbito. As diretrizes internacionais preconizam o 'tempo porta-balão', que é igual ou menor que 60 minutos e consiste no intervalo de tempo médio decorrido entre a entrada do paciente com sintomas de infarto agudo do miocárdio no pronto-socorro, até o início do cateterismo de emergência.
"Quando falamos de tempo na emergência é necessário que o eletrocardiograma seja feito o mais rápido possível, sendo o tempo ideal de 10 minutos. Depois o paciente deve ser imediatamente encaminhado para o procedimento de angioplastia primária, para que a artéria seja desobstruída por meio de um cateter de balão que vai dilatar a lesão para colocação de um stent, molde cilíndrico que vai abrir a artéria e evitar novo entupimento", explica o especialista.
Em situações mais raras também é utilizada a terapia fibrinolítica, medicação que tem o objetivo de dissolver o trombo. Nilvaldo Filgueiras destaca que é fundamental reconhecer os sintomas iniciais do infarto para que o paciente seja encaminhado imediatamente para uma unidade de saúde.
O principal sintoma do ataque cardíaco é a dor no peito, caracterizada por um peso ou aperto no meio do tórax ou do lado esquerdo do peito, que pode irradiar para os braços e pescoço. Essa dor, às vezes, pode ser acompanhada com sensação de sudorese, extremidades frias, enjoo e vômitos. Pacientes idosos podem sentir também uma sensação de falta de ar em repouso. "Um indivíduo que sente dor no peito em repouso ou após fazer algum exercício físico, além de falta de ar, deve se dirigir imediatamente para o pronto-socorro'', alerta.
Os pacientes que não recebem atendimento de forma adequada ou no tempo adequado, tendem a evoluir de forma menos favorável, com um quadro de arritmia cardíaca que pode evoluir para quadro insuficiência cardíaca ou de morte súbita. "Quando o indivíduo tem a perda da contração cardíaca adequada, eles perdem a qualidade de vida, com episódios de inchaços nos membros inferiores e falta de ar, aumentando a chance de morte", pontua.
Infartos e AVCs cada vez mais precoces
Hábitos de vida são decisivos para prevenção de infartos e AVCs. O acúmulo de fatores como estresse, obesidade, colesterol alto, diabetes, sedentarismo e tabagismo fazem com que exista maior chance dessas doenças acometerem cada vez mais adultos mais jovens.
"Quando falamos em AVC, sempre existe a relação com os fatores de risco cardiovasculares. Ou seja, o paciente pode ter infarto e pode ter também um derrame. Não necessariamente ao mesmo tempo, mas os riscos de acontecerem os dois episódios em alguma fase da vida existem. Quando os pacientes são idosos, existe uma maior taxa de comorbidades, mas podem ocorrer em pacientes jovens também", explica o cardiologista.
O aumento da obesidade nos últimos anos no Brasil preocupa os especialistas, sobretudo em adolescentes, pois também está associada ao diabetes e ao aumento da pressão arterial. A hipertensão arterial acomete 30% da população brasileira e, em muitos casos, o indivíduo é assintomático, assim como os portadores de colesterol elevado. Segundo uma pesquisa do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), divulgada pelo Ministério da Saúde esse ano, quase seis em cada dez brasileiros (57,25%) estavam com sobrepeso em 2021.
"Tudo isso faz com que o indivíduo tenha tendência maior de acumular gordura no sangue e de vir a desencadear um infarto ou um AVC. Por isso, a importância de campanhas constantes de prevenção e adoção de hábitos saudáveis de vida, além da realização regular de exames de check-up com cardiologistas, a fim de controlar esses fatores. Sabemos que o infarto tem maior incidência em pessoas idosas, mas temos visto cada vez mais casos da população entre 40 e 50 anos desencadeando fenômenos de ataques cardíacos", alerta Nivaldo Filgueiras, que aconselha, pelo menos, uma avaliação de rotina com cardiologista a partir dos 30 anos.