O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, anunciou que até o fim do ano o SUS vai efetivamente incorporar a trombectomia mecânica, técnica que aumenta a sobrevivência e reduz as chances de sequelas em pacientes diagnosticados com AVC (acidente vascular cerebral) grave.
O anúncio ocorreu em agosto durante o Global Stroke Alliance, evento em São Paulo que reuniu políticos e especialistas nacionais e internacionais para discutir o AVC. A adoção do procedimento já havia sido comunicada em portaria publicada em fevereiro de 2021, mas ainda não foi concretizada nos hospitais.
"Sempre existe um intervalo entre saber que tem de ser implementado e implementar de fato, principalmente por causa dos recursos necessários. Além disso, era necessário concluir a portaria que regulamenta o uso, porque não é qualquer hospital, não é qualquer tratamento. Precisamos ter o hospital adequado, com médicos treinados", afirma a neurologista Sheila Cristina Ouriques Martins, presidente da Rede Brasil AVC.
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Atualmente, é oferecida no SUS a trombólise endovenosa, que consiste na aplicação de um medicamento. Esse tratamento pode ser realizado até quatro horas e meia após o início dos sintomas de AVC, mas segundo Martins não funciona bem quando o entupimento compromete vasos de maior calibre. "O trombolítico abre só de 10% a 30%, então os pacientes ficam com muitas sequelas", diz.
Já a trombectomia mecânica consiste em um cateterismo para retirar o coágulo que está entupindo a circulação. Os médicos passam o cateter pela perna, vão até o vaso comprometido e aspiram ou puxam o coágulo usando um stent. "Esse procedimento desentope a circulação em 80% a 90% dos casos, uma diferença enorme comparando com a trombólise. Isso aumenta em três vezes a chance de o paciente ficar independente, não precisar de outras pessoas para as atividades diárias", compara a neurologista.
Os resultados positivos da técnica e a possibilidade de implementá-la no SUS foram apresentados por Martins e um grupo de pesquisadores em um artigo científico publicado em junho de 2020 na revista científica The New England Journal of Medicine. O estudo, financiado pelo Ministério da Saúde, serviu de base para a decisão de incorporar o procedimento.
"Agora o que eles têm de fazer é definir quanto vão pagar pelos dispositivos que fazem o tratamento para os hospitais do SUS que já estão prontos. Combinamos de discutir no ministério os detalhes em relação aos hospitais pré-avaliados e ao reembolso do custo do equipamento", conta Martins.
Atualmente, quatro hospitais públicos oferecem a técnica, porém sem recursos dedicados do governo federal. O Hospital Geral de Fortaleza e o Hospital Estadual de Vitória disponibilizam o tratamento com verbas estaduais; o Hospital Municipal São José, em Joinville (SC), recebe recursos da prefeitura, e o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (SP) utiliza de sua verba de manutenção.
"Os outros não têm recurso e estão aguardando a incorporação com o custo repassado", comenta a neurologista, fazendo menção a 15 hospitais que têm capacidade de oferecer a trombectomia mecânica e que foram sugeridos ao ministério para credenciamento.
Com a incorporação das unidades, as equipes do Samu terão mais opções para encaminhar o paciente com AVC grave, respeitando o intervalo aprovado de até 24 horas de início dos sintomas para a realização da trombectomia mecânica.
"O caminho começa pela educação da população para reconhecer os sinais de AVC e saber que deve chamar o Samu. O Samu, ao reconhecer esse paciente como urgente, identificará se há necessidade de trombectomia ou se pode encaminhar para um centro de AVC para trombólise", explica a neurologista.
Martins conta que a dinâmica já foi testada no Rio Grande do Sul, com 22 ambulâncias, e mais recentemente em Ribeirão Preto. Com esse sistema, diz, o hospital e a equipe, incluindo o neuroradiologista intervencionista que conduz o procedimento, podem ficar preparados e ganhar minutos preciosos.