Maria Araújo tem 75 anos e foi diagnosticada com Alzheimer em 2020. Ela, que sempre foi ativa, gosta de viajar e, mesmo aposentada, fez o curso da melhor idade na Fumec, em 2019, teve quadros articulares inflamatórios e iniciou um processo de alterações cognitivas, com esquecimentos e falas repetidas.
Por ser considerada da terceira idade, já fazia acompanhamento com geriatra e buscou, junto a outros profissionais, como neurologista, formas de diagnosticar o que estava acontecendo. Após avaliação neuropsicológica, constatou-se que se tratava de um Alzheimer em fase inicial e logo foi indicada a medicação para retardar a evolução da doença.
Assim como Maria, mais de 1,2 milhão de pessoas no Brasil convivem com o Alzheimer, a maior parte delas sem diagnóstico, segundo o Ministério da Saúde. Com o aumento da expectativa de vida, a doença pode se tornar mais frequente. Por isso, a medicina vem trabalhando com estratégicas que visam prevenir e combater os riscos considerados modificáveis para a patologia.
Nesta quarta-feira (21/9), quando é lembrado Dia Mundial da Doença de Alzheimer e Dia Nacional de Conscientização da Doença de Alzheimer, o tema é colocado em pauta.
Segundo a médica geriatra da empresa especializada em home care, Saúde no Lar, Simone de Paula Pessoa Lima, o Alzheimer é uma doença progressiva, caracterizada pela perda da memória e de outras funções mentais importantes. Ocorre quando o cérebro não consegue mais funcionar corretamente. Em estágio inicial, os sintomas podem ser mínimos, mas, à medida que o quadro piora e vai causando danos ao cérebro, as consequências podem variar em cada paciente.
"A doença afeta primeiramente a memória, mas na evolução acomete também outras partes do corpo, não só o cérebro. A pessoa pode ter a doença de Alzheimer e a demência de Alzheimer. A diferença é que a doença acontece quando ocorrem as lesões neuronais e a demência é quando essas lesões são capazes de interferir no dia a dia do paciente, com perda de funcionalidade." De acordo com a médica, cerca de 60% dos casos de demência são Alzheimer.
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A filha de Maria, Daniela Araújo, é médica e conta que, do diagnóstico até agora, os sintomas se tornaram frequentes. "Atualmente, ela repete o mesmo acontecimento e caso várias vezes, como se não tivesse falado sobre isso antes. Esquece onde colocou as coisas, relógio, brincos. Adora ler, mas não consegue contar sobre o livro, onde se passa a história, quais são as personagens principais, não consegue fazer um resumo sobre o que leu."
Veja o que a geriatra da empresa Saúde no Lar, Simone de Paula Pessoa Lima, ensina sobre o Alzheimer:
Apesar de ter sido observado pela primeira vez há mais de um século, ainda hoje o Alzheimer é cercado de mistérios, e não existem medicamentos capazes de tratá-lo de forma efetiva. Como não há tratamento disponível, cientistas estão investindo em prevenção, combatendo problemas como os de audição e visão, além de tentar melhorar a interação social de pacientes idosos.
"As medicações disponíveis hoje são usadas com o intuito de lentificar a progressão da doença neurodegenerativa. Com os remédios, a maioria dos casos evolui mais lentamente. Ao invés de perder a funcionalidade (ficar dependente e esquecer tudo) em um ano, o paciente vai chegar nesse ponto em dez anos (número hipotético), ou seja, ganha nove anos de uma vida melhor, com mais qualidade e de forma mais independente", ressalta Simone.
Sabe-se hoje que existem os riscos não modificáveis, que são as lesões neuronais, que estão em processo de entendimento na medicina, e as modificáveis, que têm a ver com meio ambiente e a maneira como as pessoas vivem no seu cotidiano, o que têm influência na evolução da doença.
"O mais sensato é prevenir. Isso inclui evitar cigarro, bebida alcoólica, obesidade, praticar atividade física e aumentar a capacidade cognitiva. E para isso é fundamental que familiares próximos e amigos cuidem para que o paciente tenha um ambiente adequado e saudável e com menos estresse, o que pode também influenciar na saúde mental", indica a profissional.
Daniela conta que, como médica, ficou bastante apreensiva, triste e preocupada ao perceber as falas repetidas e esquecimentos da mãe e, por conta da profissão, entender a evolução do quadro. "No momento do diagnóstico, percebi que seria muito importante ter mais paciência, sabedoria, tranquilidade em lidar com as perdas que ela sofreria. Também tenho duas irmãs. Sou eu quem faço a transmissão das informações, traduzo as falas dos médicos, tento dar suporte. E, sem dúvida, nossa união, compreensão, respeito, amor e o cuidado com a minha mãe faz toda a diferença. Atualmente, ela tem acompanhamento com fisioterapeuta duas vezes por semana, é presenteada com livros, cuidamos de sua alimentação, levamos para passear e viajar. Sempre deixando-a o mais confortável possível", relata.
A perda auditiva também pode ser considerada um fator de risco importante que contribui para o desenvolvimento de demência e doença de Alzheimer, já que aqueles que possuem essa perda não tratada tem tendência a se isolar socialmente e esse comportamento pode intensificar o risco de estagnação.
Por isso, tanto o diagnóstico da demência quanto da perda auditiva deve, preferencialmente, acontecer de forma precoce. Daí a importância de a família estar sempre por perto e atenta a pequenos sinais para, assim, tratar e melhorar a qualidade de vida do paciente.
Déficit cognitivo x pandemia
A geriatra ressalta que, quando um indivíduo já tem um déficit auditivo, complementa o entendimento da audição junto com a leitura labial. "Com a pandemia, nós tivemos de cobrir a boca. Isso fez com que ficassem ainda mais restritos, pois, quem só tinha a audição, que já era ruim, perdeu a leitura labial que complementava esse entendimento."Além de gerar ainda mais dificuldade para compreender o que está sendo falado, o uso de máscaras comprometeu também a relação dessas pessoas com problemas auditivos com outras pessoas e sua participação em conversas.
"A irmã de uma paciente comprou para mim uma máscara em que a parte da boca é com um material transparente. Todas as vezes que eu a visitava, usava, porque era uma forma de ela comunicar comigo, pois mesmo que eu falasse alto, ela não conseguia entender", conta Simone.
Sobre o futuro
O futuro do paciente com Alzheimer acaba sendo limitado. A especialista dá como dica àqueles que convivem com o doente que tenham sensibilidade para perceber quando algumas atitudes passam a ser diferentes do que eram anteriormente."É ficar de olho se está ocorrendo certo isolamento, como o de querer ficar mais no quarto, não querer participar de festas, ou evitar um ambiente que tem mais pessoas conversando de máscara, por exemplo. Isso pode ser sinal de um começo de depressão que favorece o surgimento do Alzheimer", finaliza.