Jornal Estado de Minas

REPORTAGEM Da CAPA

Dores na coluna: linha tênue entre operar ou não

 
Por Ellen Cristie 

Geralmente, as  cirurgias de coluna são indicadas apenas em casos extremos, quando os tratamentos convencionais não funcionam. O ortopedista Daniel Oliveira, especialista em coluna do Núcleo de Ortopedia e Traumatologia de Belo Horizonte (NOT), explica que casos em que não há alívio das dores ou remissão da inflamação, mesmo com o uso de medicação, bloqueios, fisioterapia, pilates, atividade física, RPG ou ainda em casos de alterações neurológicas graves - como perda de força ou sensibilidade nos braços e pernas - “é fundamental, independentemente da dor ou problema de coluna, consultar um ortopedista com boas referências e especializado em coluna”, comenta. 




 
Por meio de exames físicos, clínicos e de imagem, como tomografia computadorizada, ressonância magnética e raio-x, o especialista pode diagnosticar com precisão o problema, o grau da patologia e as formas de tratamento. 
 
 
 
O engenheiro Bruno Queiroz Cury, de 43 anos, acabou se submetendo à cirurgia da coluna em março deste ano. Além da dor, a tomografia mostrou que os nervos da coluna estavam sendo comprimidos. Ele conta que o procedimento foi rápido. “Entrei para o bloco às 8h e acordei da cirurgia às 13h, sem dor nenhuma.”
 
Leia mais: 
A importância do abraço para a saúde mental
 
“Por volta das 17h do mesmo dia eu tive alta e fui caminhando até o carro. Fiquei por duas semanas sem fazer esforço físico. Evitei peso, sem agachar ou fazer qualquer atividade que forçasse a lombar. Ficava em pé para tomar banho, fazer minhas refeições ou então deitado.”




 
Após duas semanas, ele iniciou as sessões de fisioterapia. Foram 10 sessões e ele conta que na 5ª ou 6ª seção já estava muito bem, conseguindo se movimentar com segurança e sem dor. “Quando o fisio falou que eu estava bem, na sexta sessão, eu tive que fazer uma viagem internacional a trabalho e fiquei 15 dias fora. Nesse período, com a recomendação do fisioterapeuta eu fiz alongamentos.”
 
Depois de um período de caminhadas diárias, o engenheiro começou a correr e a fazer pilates. Quinze dias depois, voltou a fazer trilha de moto e de bicicleta. “A recuperação foi rápida, sem dor. O que mais mudou depois da cirurgia foi não sentir dor. Nunca mais senti dor na lombar. E isso me deu muito mais ânimo e disposição para tudo. Estou muito feliz, tirando o atraso com relação ao que eu gosto de fazer, principalmente das atividades físicas. O aumento da qualidade de vida foi o mais relevante. Sensação de renovação, como se tivesse voltado aos 20 anos”, comemora.
 
CONSERVADOR Em muitos casos, o  tratamento conservador é o mais indicado, evitando assim métodos mais invasivos, como as cirurgias. A nutricionista Gabriela Cler, de 30 anos, optou por procedimentos fisioterapêuticos e hoje está se sentindo muito bem.




 
Gabriela diz que sempre fez atividade física, mas em 2016, ficou um ano sem treinar em decorrência das dores na lombar. “Sempre era diagnosticada com lombalgia. Um dia, o ortopedista pediu uma ressonância e aí os exames mostraram uma hérnia de disco e uma protrusão discal com compressão de nervo ciático. Eu sentia muitas dores lombares que irradiavam pelo glúteo, região posterior da coxa até o calcanhar.”
 
“Resolvi procurar um ortopedista especialista em coluna, mas aí começou meu pesadelo. Quando mostrei os exames, o médico apenas falou que não poderia agachar, varrer, passar pano, praticar musculação e muito menos carregar minha filha no colo que, na época, era pequena. Comecei a chorar enquanto ele falava e passei o resto do dia chorando.”
 
Ao buscar mais informações sobre coluna nas redes sociais, a nutricionista acabou conhecendo um fisioterapeuta. “Achei o profissional que iria salvar minha vida.” Ela conta que após a análise dos exames, ele se concentrou nos sintomas. “Fiz exercícios em casa e ele também fez manipulações (terapia manual). “Lembro que na época realizei apenas umas 4 consultas e em 2 meses já tinha voltado para academia com algumas restrições de exercícios e já quase não sentia dores.” 

 
Em 2018, ela resolveu competir como fisiculturista e hoje agradece ao profissional que cuidou dela. “Hoje, vivo minha vida normal graças ao tratamento. Aquela garota que na época não poderia nem varrer uma casa elevou o físico ao palco de uma competição de fisiculturismo.” 
 
Segundo o fisioterapeuta Aléssio Novais, as técnicas utilizadas tanto no tratamento conservador quanto no pós-operatório, requerem uma criação de protocolos que respeitem a individualidade do paciente (foto: Michele Dutra/Divulgação )
  

Respeito à individualidade do paciente

Aléssio Novais é fisioterapeuta, especialista em movimento humano, professor de pós-graduação em quiropraxia e atua na Clínica Be Light - Saúde Integrada. Ele esclarece que no Brasil 13% da população sofre de dor lombar, “sendo a segunda condição de saúde mais comum, perdendo apenas para a hipertensão arterial”.




 
Já a lombalgia crônica inespecífica é responsável por 80% de todos os casos registrados em pacientes entre 25 e 55 anos, constituindo subgrupos de pacientes em que a dor não tem uma origem específica e na maioria das vezes são mal definidas, melhorando em algumas semanas a partir de terapias físicas e psicológicas simples que mantêm as pessoas ativas.
 
“Por isso, a escolha do tratamento será baseada principalmente nas causas e suas interações, sendo somente a presença da dor não justificável para procedimentos invasivos como uma cirurgia”, comenta o fisioterapeuta.
 
Segundo o fisioterapeuta Aléssio Novais, as técnicas utilizadas tanto no tratamento conservador quanto no pós-operatório, requerem uma criação de protocolos que respeitem a individualidade do paciente, assim como idade, condição física e origem das disfunções apresentadas. “Os principais problemas de coluna que chegam ao consultório são diversos, mas podemos destacar: artrose, escoliose, hérnias de disco, estenose espinhal, espondilolistese, fraturas e traumas.”




 
Na visão do especialista, “o acompanhamento de um fisioterapeuta é fundamental para identificar as causas da dor e o controle e potencialização da capacidade funcional, visando o aumento da mobilidade corporal e devolvendo ao paciente a melhora da qualidade de vida e retorno às atividades normais”.

LIMITAÇÕES O engenheiro Cláudio Menezes, de 65 anos, sabe muito bem o que é lidar com problemas na coluna. Ele começou a ter dores na lombar aos 25 anos e aos 27 fez sua primeira cirurgia: laminectomia descompressiva (remoção de uma pequena porção da coluna lombar para obter acesso à medula espinhal). 
 
Até os 52 anos ele conta que viveu com limitações e consumindo analgésicos e anti-inflamatórios regularmente. “Nessa idade, fiz a segunda cirurgia: artrodese (fusão de duas ou mais vértebras da coluna). Depois de seis meses de recuperação e fisioterapia, passei 10 anos com mais algumas limitações.” 
 
No ano passado, Cláudio teve uma forte crise que praticamente o imobilizou. Após vários exames e consultas, foi recomendada ao engenheiro a terceira cirurgia, mas numa consulta médica  às vésperas da operação, o médico pediu que ele fizesse uma última tentativa de três meses de fisioterapia. 




 
“Comecei o tratamento e, nas primeiras sessões, tive vontade de desistir. Tive náuseas, sudorese intensa e até a sensação de passar um a dois dias com dores intensas.”Hoje, aos quase 66 anos, tenho uma consciência corporal muito mais desenvolvida, evidentemente com as limitações da minha idade, mas pratico natação, musculação, spinning e estou aprendendo beach tennis.”  
 
(foto: Fernando Alves/Divulgação)
 
 

Palavra de especialista

Rodrigo Moura, Diretor-clínico do Centro de Reabilitação e Condicionamento Físico Fortaleser 

Fisioterapia: alívio da dor e reabilitação

“A dor nada mais é do que uma resposta do sistema nervoso central e tudo isso pode sensibilizar esse sistema, aumentando sua intensidade, mesmo que a pessoa não esteja mais machucada ou lesionada, considerando a estrutura física especificamente. 
 
Essa triagem tenta analisar os níveis de complexidade do paciente (baixo,
 médio ou alto risco) e nós, enquanto profissionais, atuamos com condutas como as terapias manuais, que têm evidência comprovada, para preparar o paciente para o movimento, uma etapa que acontece em conjunto com a prescrição de exercícios terapêuticos para que ele evolua de acordo com sua funcionalidade. 
 
E, à medida que for tolerando e diminuindo a dor, vai, funcionalmente, caminhando para a parte final do tratamento, que é integrá-lo com atividades físicas - principal conduta preventiva – e a melhor forma de evitar outras crises de dor lombar, até fazer a transição para o exercício físico.



Durante a pandemia, surgiu uma grande demanda para o tratamento para dor lombar que foi atendida graças à telerreabilitação - que apresenta grande efetividade se comparada, por exemplo, com o que é realizado no tratamento pragmático dentro do consultório, principalmente para realizar a triagem desses pacientes no sentido de identificar aqueles que eram de baixa ou alta complexidade (pacientes do menos grave ao mais grave). Conseguimos educá-los com relação à saúde e exercícios à distância, além de facilitar a comunicação e interação com o fisioterapeuta a todo momento.”