Desde a Segunda Guerra Mundial, a expectativa de vida no globo não havia sido tão baixa quanto a estimada em 2020, segundo um estudo publicado nesta segunda-feira (17/10) na revista Nature Human Behavior. Com dados de 29 países da Europa, além do Chile e dos Estados Unidos, o artigo reflete a mortalidade causada pela pandemia de COVID-19, mas também indica que as intervenções de políticas de saúde, como a vacinação, conseguiram reverter esse índice. Isso porque os deficits começaram a sofrer redução em 2021 em nações com alto índice de imunização.
Tanto os autores quanto especialistas independentes destacam, porém, que a expectativa de vida não é a previsão de quanto tempo um indivíduo viverá. Em vez disso, ela fornece um instantâneo das condições atuais de mortalidade, por isso está totalmente associada à realidade daquele momento.
No caso do estudo, o índice indica a média de idade que uma pessoa nascida em 2020 e 2021 viveria, se a pandemia continuasse a matar tanto quanto naqueles anos. No lugar de apontar uma tendência demográfica, a expectativa de vida reflete o impacto do Sars-CoV-2 e permite comparar como diferentes países foram afetados. Como não se morreu só de COVID-19 no período estudado, outros fatores associados à mortalidade, como doenças crônicas e baixo índice de desenvolvimento humano, precisam ser considerados.
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O estudo, do Centro de Ciência Demográfica Leverhulme da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e do Instituto de Pesquisa Demográfica Max Planck, na Alemanha, mostrou que "a COVID-19 levou a mudanças globais de mortalidade sem precedentes nos últimos 70 anos". Os dados fornecidos pelos 31 países indicam que naqueles com proporções mais altas de pessoas totalmente vacinadas, os déficits de expectativa de vida foram menores.
Divisão
De acordo com o artigo, "uma clara divisão geográfica apareceu em 2021". Os pesquisadores descobriram que a maioria dos países da Europa Ocidental conseguiu recuperar os índices anteriores, totalmente (como Suécia, Suíça, Bélgica e França) ou parcialmente (País de Gales, Inglaterra e Espanha, entre outros). Já nos Estados Unidos, no Chile e no Leste Europeu, a pandemia acentuou perdas que vinham sendo registradas nos períodos pré-coronavírus em pessoas de meia idade. No bloco europeu, "a escala das perdas de expectativa de vida durante a pandemia foi semelhante às vistas pela última vez, na ocasião do desmembramento da ex-União Soviética".
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Embora o Brasil não tenha entrado nessa análise, um estudo anterior, publicado na revista Nature Medicine, em junho do ano passado, apontou um declínio de 1,3 ano em 2020, "nível de mortalidade não visto desde 2014", de acordo com o artigo, assinado por pesquisadores dos Estados Unidos e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Entre os estados, o mais afetado foi o Amazonas, que perdeu 60,4% das melhorias registradas desde 2000.
Para um dos coautores do estudo divulgado, é possível que o país, assim como o México, continue a sofrer os impactos demográficos da pandemia, por mais tempo. "Em 2020, as perdas na expectativa de vida sofridas no Brasil e no México excederam as experimentadas nos Estados Unidos. Então, é provável que ambos continuem sofrendo impactos de mortalidade em 2021 - mesmo, potencialmente, excedendo os 43 meses que estimamos para a Bulgária", diz José Manuel Aburto, demógrafo do Instituto Max Planck e da Universidade de Oxford.
De acordo com Diego Ramiro, do Instituto de Economia, Estatística e Demografia do Conselho de Superior de Investigação Científica da Espanha, nos EUA, "os pesquisadores mostram como a pandemia acentuou as perdas na expectativa de vida que já apareciam em períodos pré-pandemia em pessoas de meia idade". A interpretação seria a continuação e a piora de uma situação existente. "Em 2020, a maior parte do excesso de mortes não-COVID-19 em homens nos EUA foi devido a causas externas (principalmente devido a overdoses de drogas e homicídio), quase 80% das quais ocorreram em idade produtiva", afirmou Ramiro, em um comunicado.