Jornal Estado de Minas

REPORTAGEM da CAPA

Corpo saudável e esculpido exige comprometimento

 

Estabelecer metas para o “Projeto Verão”, período em que muitos querem desfilar um corpo mais bonito e torneado, significa seguir uma rotina saudável, não só de exercícios físicos, mas de alimentação, treinando de forma correta e selecionando o que vai no prato. E tudo com disciplina, já que ninguém perde peso do dia para a noite. 




 

 
A nutricionista esportiva e comportamental Ruth Egg explica que há uma diferença entre emagrecer e perder peso - que a maioria das pessoas desconhece. Emagrecer significa perder gordura. A massa gorda é o que pode prejudicar a saúde quando em níveis altos. Já a perda de peso implica perda de massa magra, massa gorda e água. Ou seja, uma pessoa que perdeu muito peso não necessariamente emagreceu. 
 
O professor Erivelton Braz passou de 117kg para 86kg e sua mulher, a advogada Renata Cely Frias, perdeu 21 quilos com dieta, atividade física e rotina alimentar saudável (foto: arquivo pessoal)
 
 
“E é aí que começam os problemas em relação às dietas da moda com muitas restrições: a perda de massa magra é maior que a perda de gordura, devido à velocidade que essa perda de peso ocorre, o que causa redução direta na taxa do metabolismo corporal, dificultando ainda mais a perda de gordura e mau funcionamento dos músculos, inclusive, intestino e coração. Além disso, grande parte das pessoas que adotam esse tipo de alimentação não conseguem mantê-la por longo prazo e retomam o peso anterior ou até maior, por um mecanismo de proteção do próprio corpo.” 
 
A psiquiatra Maria Francisca Mauro diz que é fácil ser seduzida por dietas em que o foco não é a saúde, mas o resultado (foto: Arquivo Pessoal )
 
 
Portanto, esse tipo de dieta não promove a reeducação alimentar essencial para a manutenção de peso e da saúde e, inclusive, aumenta o risco para desenvolvimento de compulsão e outros transtornos alimentares. Ruth Egg alerta que, além da consistência de uma alimentação saudável e treinos bem orientados, a estratégia para o verão é simples: dieta com baixa caloria que seja rica em fibras, frutas, vegetais e muita hidratação. 
 

 
(foto: Marcus Santiago/Divulgação)
 
 
“As fibras ajudam no funcionamento do intestino e promovem saciedade. As frutas e vegetais são carboidratos sem açúcares adicionados, mais saudáveis que os produtos industrializados. Também é importante ingerir uma quantidade adequada de proteína em todas as refeições, mas sem exagero, pois assim como os carboidratos, as proteínas também engordam se ingeridas em excesso. Água e chás (sem açúcar) são bem-vindos não só para ajudar a refrescar do calor, mas para manter um bom funcionamento renal e intestinal, auxiliando no ganho de massa magra e redução do inchaço causado pela retenção de líquidos, e também na regulação termo-corporal.” 
 
A nutricionista destaca que alguns nutrientes também podem ajudar no “Projeto Verão”, se a pessoa já tem hábitos alimentares saudáveis. “Mas eles também não fazem milagres. Ômega 3, aveia, canela, gengibre, cúrcuma e vitamina D são nutrientes que podem ajudar com a menopausa e TPM, auxiliam no ganho de massa magra, redução de colesterol e triglicérides, funcionamento intestinal, aceleração do metabolismo basal e antioxidantes.”





RECEITA CERTA Quem não embarca nessa onda de “milagre” é o casal Erivelton Braz, de 40 anos, professor e jornalista, e Renata Cely Frias, advogada, de 46, pais de Luísa Frias Braz, de 7. Eles resolveram juntos mudar o hábito alimentar e de vida e começaram a missão em fevereiro. “Como muitos brasileiros, houve um descontrole da minha alimentação em 2020, agravado pela pandemia. Tenho 1,80m e, pelo meu biotipo, o peso ideal seria 80 quilos. Sempre tive sobrepeso, mas cheguei a 117 quilos, com dor no joelho, na sola do pé e pressão alta. Num checape anual com a cardiologista, ela me perguntou se queria ir ao casamento da minha filha um dia. Porque aqueles resultados dos exames não indicavam uma vida saudável e longa. Foi um baque.”
 
Diante do susto, Erivelton conta que procurou um nutrólogo que lhe prescreveu uma dieta com reeducação alimentar para a perda de peso. E indicou exercício físico. “Tudo com orientação e supervisão de profissionais da saúde. Faço academia, musculação e aeróbico cinco vezes por semana. E às 6h, para não ter desculpa e ser um desafio. Acordo e é meu primeiro compromisso. Sempre fui sedentário, nunca tinha feito nenhuma atividade física antes. Nada.”
Erivelton já perdeu 30 quilos e atualmente está com 86 quilos. Ele diz que percebe melhora em tudo. “Durmo melhor, estou menos ansioso, esteticamente gosto mais do meu corpo. Foi uma transformação. Não foi rápido ou tranquilo. A primeira mudança chegou com três meses e acredito que tudo na vida exige esforço, força de vontade. Não há dieta milagrosa. É disciplina e comprometimento”. 




 
Erivelton destaca que seu erro nem era uma alimentação ruim, mas exagerada. “Era o excesso, já que nunca fui de comer errado. Descobri que é possível ter prazer me alimentando de forma controlada. Percebi que posso aproveitar com responsabilidade e consciência. E ainda tive a companhia da minha mulher nessa jornada”, conta. 
 
Renata, aliás, revela que emagreceu 21 quilos, também por meio de dieta, reeducação alimentar e academia três vezes por semana. “Sinto que minha vida mudou para melhor com esse acompanhamento profissional e mudança de propósito. Saí dos 104 quilos, sofria com dores e mobilidade reduzida. Agora, estou com 83 quilos, mantendo os exercícios físicos e sem dores. Estou bem mais feliz.”

INFLEXÍVEIS Para os inflexíveis com as metas do “Projeto Verão, a nutricionista Ruth Egg explica que o principal é compreender que o ganho de peso não ocorre de um dia para o outro. Da mesma forma, a perda para ser saudável, também não. “A mudança de hábitos acontece de médio para longo prazo.




 
Ela é possível quando colocamos metas atingíveis. Algo fora da realidade o fará desanimar ou desistir. Por exemplo: reduzir a ingestão de doces: não adianta se propor a nunca mais comer doces. O ideal é reduzir a frequência de três vezes na semana para duas, até que um dia, o hábito de consumir doces todos os dias não exista mais. Essa mudança não é linear. Pode ser que em uma semana você consiga atingir a meta, mas na semana seguinte não. E está tudo bem, não são esses pequenos deslizes que irão te prejudicar. O importante é manter a constância da boa alimentação e deixar o que não é tão saudável como pequenas exceções”.   

Tenha uma bússola própria

A psiquiatra Maria Francisca Mauro, especializada em transtornos alimentares e obesidade, membro do Grupo de Obesidade e Transtornos Alimentares (GOTA/IPUB/UFRJ) e doutoranda do PROPSAM/UFRJ, afirma que não é o manequim que dá liberdade às pessoas, referindo-se àquelas que ainda se sentem “obrigadas” a se encaixar em um padrão que ganha força especialmente no período que antecede o verão. 
 
Com mulheres bombardeadas com imagens de corpos magros usando biquínis, é cada vez mais frequente a venda de dietas milagrosas e exercícios que prometem mudar a aparência física. “É fácil ser seduzida por dietas em que o foco não é a saúde, mas o resultado. Pessoas vulneráveis são mais suscetíveis a acreditar nessas promessas, já que buscam uma resposta rápida.” 
 
“Questione, pense se quer um verão ou vários verões. A vontade de ir a determinados lugares que expõem o físico precisa ser naturalizada, não porque fará uma mudança em seu corpo, mas porque você pode circular em qualquer lugar que deseja. Tenha uma bússola própria que dê a direção das qualidades que você tem, quais são as características que fazem todos te reconhecerem. Suas medidas não serão a partir da balança ou de determinada roupa que não coube”, diz Maria Francisca.
 
A verdade é que para muitos é tentador se comparar e achar que um determinado corpo pode ser o ideal. De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), estima-se que mais de 70 milhões de pessoas no mundo sejam afetadas por algum transtorno alimentar, incluindo anorexia, bulimia e compulsão por comida, por exemplo. E eles estão diretamente relacionados com a distorção da imagem. “Para além daquilo que considera perfeito, é importante se atentar ao que você tem e à sua saúde. O físico não pode ser atravessado pelo ódio, mas pelo amor próprio”, recomenda a psiquiatra. 




 
Maria Francisca Mauro enfatiza que quando se tem vergonha da própria condição física, não adianta perder peso por meio de dieta ou participar da próxima chamada da internet para um programa milagroso. “A pessoa precisa se localizar dentro dela e de suas necessidades, pois pode ser que aquilo encubra outras fragilidades emocionais”, destaca. 
 
Vale lembrar que o problema não está somente no corpo gordo, o magro também sofre. “Sempre que falamos das dificuldades, o foco acaba sendo as pessoas que têm tamanhos maiores, como obesidade, como se elas necessariamente tivessem que sofrer por não se encaixarem em um padrão. 
 
É importante compreender que aquelas que são extremamente magras podem estar adoecidas, terem complicações clínicas graves, podendo fazer uso de diversos medicamentos sem indicação, com uma alimentação restritiva que provoque alterações hormonais gravíssimas e isto não é discutido. Precisamos conversar sobre as pessoas terem os seus corpos livres, independentemente de seu tamanho ser 34 ou 50, ou qualquer que seja”, expõe a psiquiatra.