Jornal Estado de Minas

SAÚDE

O que a deficiência de vitamina B12 pode significar para sua saúde


Minha cachorra Scout vomitou às 3h da manhã quase todos os dias deste verão de 2022. Para piorar, ela sempre comia a bagunça que fazia antes de eu chegar - o que me impedia de analisar o estrago e tentar traçar um diagnóstico.





A certa altura, o veterinário e eu chegamos à conclusão de que minhas hortênsias eram a fonte do problema. Mas manter Scout longe das plantas não funcionou. Com frequência ela parecia cansada, o que é muito preocupante em um labrador tipicamente hiperativo.

Um dia, Scout vomitou uma bola de pelos — mas não qualquer uma.

Nos cães, o pelo costuma passar facilmente pelo sistema digestivo, mas essa bola estava enrolada em um pano de limpeza grande demais para ser movido intestino abaixo.

Depois que esse objeto estranho foi finalmente removido do corpo dela, o vômito durante a noite parou. No entanto, Scout ainda precisava de tratamento por um motivo diferente e surpreendente: o objeto havia inibido uma etapa da absorção de vitamina B12 por seu corpo.





A B12 é uma molécula essencial envolvida no bom funcionamento das células sanguíneas, do sistema nervoso e de muitos outros processos críticos do corpo.

Como nutricionista e professora de ciência alimentar para estudantes universitários, ainda sentia falta de informações sobre a deficiência de B12, que estava causando a fadiga no meu animal de estimação.

A falta dessa substância pode facilmente passar despercebida nas pessoas, embora a deficiência de B12 seja um problema de saúde comum, e afeta algo entre 6% e 20% da população dos Estados Unidos.

A vitamina B12 é escassa na dieta, encontrada apenas em alimentos de origem animal.





Felizmente, os humanos precisam apenas de 2,4 microgramas de B12 por dia, uma quantidade muito pequena. Sem uma porção adequada dessa molécula no corpo, contudo, a saúde geral e a qualidade de vida são afetadas negativamente.


(foto: Getty Images)

Sinais e sintomas

Um dos principais sintomas da deficiência de vitamina B12 é a fadiga, um nível de cansaço ou exaustão tão profundo que afeta as atividades da vida diária.

Outros sintomas envolvem o sistema neurológico, e podem incluir formigamento nas extremidades, confusão, perda de memória, depressão e dificuldade em manter o equilíbrio. Alguns deles podem ser permanentes se a deficiência de vitaminas não for tratada adequadamente.





No entanto, como podem existir muitas causas para esses sintomas, os médicos muitas vezes acabam perdendo a oportunidade de avaliar uma deficiência de vitamina B12 — e o problema acaba não detectado.

Além disso, ter uma dieta saudável geralmente descarta quaisquer deficiências vitamínicas. Esse, aliás, foi o caso de minha cachorra: como eu sei que a alimentação de Scout é boa, não considerei a falta de vitamina B12 como uma possível fonte de problemas.


Um dos sintomas da falta de vitamina B12 é a fadiga (foto: Getty Images)

Como a B12 é absorvida

As evidências nos mostram que pessoas que comem dietas exclusivamente à base de plantas devem tomar suplementos de B12.

No entanto, centenas de milhões de americanos que consomem B12 por meio desses comprimidos também podem estar em risco. Isso acontece por causa da forma como essa molécula é absorvida no corpo.

A absorção de B12 é um processo complexo, com várias etapas, que começa na boca e termina no intestino delgado.





Quando mastigamos, a comida é misturada com saliva. Quando esse bolo alimentar é engolido e passa para o estômago, uma substância na saliva chamada proteína R protege a B12 de ser destruída pelo ácido presente neste órgão.

Células específicas no revestimento do estômago, conhecidas como parietais, por sua vez, secretam duas substâncias que são importantes para a absorção da B12.

A primeira é o próprio ácido estomacal: ele separa a vitamina dos alimentos, permitindo que ela finalmente se ligue à proteína R da saliva.

A segunda, denominada fator intrínseco, mistura-se com o conteúdo que está no estômago e "viaja" até a primeira parte do intestino delgado: o duodeno.

Uma vez no duodeno, os sucos fabricados pelo pâncreas liberam a B12 da proteína R e a entregam ao fator intrínseco. Isso permite que a B12 seja absorvida pelas células do intestino e sirva para a manutenção do sistema nervoso e para a formação de glóbulos vermelhos saudáveis.





A deficiência de vitamina B12 geralmente envolve algum problema em um ou mais dessas etapas no caminho até a absorção dela pelo corpo.

Fatores de risco para deficiência de B12

Sem saliva, por exemplo, a vitamina B12 não se liga à proteína R — e a capacidade do corpo de absorvê-la é inibida.

Existem centenas de medicamentos que podem causar boca seca, resultando em uma produção de saliva muito baixa. Eles incluem opioides, descongestionantes, antidepressivos, remédios para pressão alta e benzodiazepínicos, usados %u200B%u200Bpara tratar a ansiedade.

Outro contribuinte potencial para a deficiência de vitamina B12 são os baixos níveis de ácido estomacal.

Centenas de milhões de americanos tomam medicamentos que reduzem os ácidos estomacais para evitar quadros de gastrites e úlceras.





Pesquisas relacionam fortemente o uso desses fármacos com a deficiência de vitamina B12, embora essa possibilidade não supere a necessidade de fazer esse tratamento.


A falta de ácido estomacal dificulta a absorção de B12 (foto: Getty Images)

A produção de ácido estomacal também pode diminuir com o envelhecimento. Cerca de 60 milhões de pessoas nos Estados Unidos têm mais de 60 anos e 54 milhões superaram os 65 anos.

Essa população enfrenta um risco maior de deficiência de vitamina B12, que pode ser ampliada pelo uso de medicamentos redutores de ácido estomacal.

A produção de ácido gástrico e do fator intrínseco por células parietais especializadas no estômago é crítica para que ocorra a absorção de B12. Mas os danos ao revestimento do estômago podem impedir a produção de ambos.

Em humanos, a deterioração do revestimento do estômago é causada por cirurgia gástrica, inflamação crônica ou anemia perniciosa, uma condição médica caracterizada por fadiga e uma longa lista de outros sintomas.





Outro culpado comum pela deficiência de B12 é o funcionamento inadequado do pâncreas. Cerca de um terço dos pacientes com problemas nessa glândula apresenta falta da vitamina.

E, finalmente, a metformina, uma droga usada por cerca de 92 milhões de americanos para tratar o diabetes tipo 2, tem sido associada à deficiência de vitamina B12 há décadas.


(foto: Getty Images)

Como tratar essa falta?

Enquanto alguns médicos medem rotineiramente os níveis de B12 e de outras vitaminas, um exame de rotina costuma incluir apenas um hemograma completo e um painel metabólico, nenhum dos quais avalia o status dessa molécula.

Se você estiver enfrentando sintomas potenciais de deficiência de vitamina B12 e também apresentar qualquer um dos fatores de risco listados acima, consulte um médico para fazer o exame laboratorial. Uma análise adequada e a discussão com um profissional da saúde são necessárias para descobrir ou descartar possíveis faltas e como corrigi-las.





No caso de Scout, os sintomas levaram o veterinário a fazer dois exames de sangue: um hemograma completo e um teste para medir a B12. Esses também podem ser bons pontos de partida para os seres humanos. Os sintomas de minha cachorra desapareceram após alguns meses de ingestão de suplementos orais.

Em humanos, o tipo de tratamento e a duração da recuperação dependem da causa e gravidade da deficiência. A recuperação total pode levar até um ano, mas é bem possível regularizar os níveis dessa molécula com uma abordagem adequada.

O tratamento para a deficiência de vitamina B12 pode ser feito por via oral, ou exigir vários tipos de injeções. Em alguns casos, um suplemento de vitamina B12 ou multivitamínico balanceado disponível em farmácias já é suficiente para corrigir a deficiência, como foi para Scout — mas é sempre melhor consultar um médico para garantir o diagnóstico e o tratamento adequados.





*Diane Cress é Professora Associada de Nutrição e Ciências Alimentares da Wayne State University, EUA.

*Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original em inglês.