O chef Rodrigo Oliveira, que comanda o restaurante Mocotó, em São Paulo, deu a largada para uma ação que pode virar tendência no circuito gastronômico da cidade: um menu completo especial (petisco, entrada, prato principal, sobremesa e drink não alcoólico) com baixíssimo teor de gordura e açúcar, a fim de adequar a gastronomia sertaneja à restrita dieta alimentar de pessoas com síndrome da quilomicronemia familiar (SQF), uma doença rara.

"Esse menu é prova de que nossa culinária também pode ser leve, saudável, inclusiva e agradar paladares exigentes", diz o chef Rodrigo Oliveira
(foto: Arquivo Pessoal)A iniciativa tem por objetivo gerar conhecimento sobre a doença, bem como a necessidade do diagnóstico precoce e os cuidados adequados. A síndrome de quilomicronemia familiar é uma doença hereditária que eleva muito os níveis de triglicerídeos no sangue, causando, entre outras complicações, crises de pancreatite e, dependendo da gravidade, pode ser letal.
"Comer é um ato social e deveria ser prazeroso. Para quem tem SQF, isso pode se tornar desafiador e até angustiante. Queremos garantir que essas pessoas tenham longevidade e mais qualidade de vida", explica Rogério Silva, vice-presidente e gerente geral da PTC Therapeutics no Brasil, biofarmacêutica global, parceira do Mocotó na campanha.
A SQF
A SQF é uma doença rara e hereditária de modo recessivo, ou seja, a pessoa afetada precisa herdar de ambos os pais os genes alterados para desenvolvê-la. Sendo assim, se pai e mãe carregam o gene alterado, cada filho do casal tem 25% de chance de ser afetado pela doença.
Estima-se que a doença afeta entre uma e duas a cada 1 milhão de pessoas no mundo e ainda não há dados oficiais de prevalência no Brasil, informa a cardiologista pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP) e professora do setor de Lípides, Aterosclerose e Biologia Vascular, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Maria Cristina Izar.
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A cardiologista Maria Cristina Izar explica que a doença pode ser mais frequente quando acontece o casamento entre consanguíneos
(foto: Arquivo Pessoal)"É um erro inato do metabolismo, mas pode ser também relacionada a defeitos em outros cofatores que participam da ativação da lipase. A doença pode ser mais frequente quando acontece o casamento entre consanguíneos, como entre primos", explica a especialista. Esse excesso de gordura eleva muito as taxas de triglicérides, desencadeando dores abdominais, pancreatites, alterações nos vasos da retina e hepáticas, diarreia, diminuição das plaquetas e lesões cutâneas, chamadas xantomas eruptivos.
"O paciente em geral tem baixa estatura, mas isso não é obrigatório, e tem um índice de massa normal. Pode ter deposição de gorduras nos tecidos, embaixo da pele, no dorso, no abdômen, na região glútea, em membros superiores e inferiores. Também pode ter alterações comportamentais e neurológicas não muito bem explicadas. Aumentos do fígado e do baço podem ocorrer, e a complicação mais grave é a pancreatite", ressalta Maria Cristina.
Além dos exames de sangue, explica a cardiologista, para se confirmar o diagnóstico é fundamental o teste genético. Existem medicamentos indicados para a doença, mas a principal estratégia de tratamento é manter uma alimentação equilibrada. O paciente deve se submeter a uma dieta muito restrita por toda a vida, normalmente de até 20 gramas de gordura por dia.
"A dieta é baseada em restrição de gorduras e carboidratos de rápida absorção, ingestão de grãos integrais, alimentos lácteos desnatados, carnes magras. Muitas vezes, é necessária a suplementação de vitaminas e ácidos graxos essenciais e, como a dieta pode levar a perda de peso, também a suplementação de triglicérides de cadeia média. Importante ainda evitar álcool e o tabagismo", acrescenta a médica.
Maria Cristina cita nova terapia para combate à SQF, que reduz em mais de 77% os níveis de triglicérides circulantes. "Mas deve estar associada à dieta balanceada, com acompanhamento de nutricionista", recomenda.